Mundo América Latina

Relator especial da ONU critica falta de independência do sistema Judiciário na Bolívia

Especialista das Nações visitou país por uma semana a convite do governo de Luis Arce, após descoberta de rede de juízes corruptos, e em meio a julgamento de ex-presidente interina
O advogado e relator da ONU Diego García-Sayán, ex-político peruano e ex-presidente da Corte Interamericana de Direitos Humanos, fala a jornalistas em La Paz Foto: MANUEL CLAURE / REUTERS
O advogado e relator da ONU Diego García-Sayán, ex-político peruano e ex-presidente da Corte Interamericana de Direitos Humanos, fala a jornalistas em La Paz Foto: MANUEL CLAURE / REUTERS

LA PAZ — Um especialista das Nações Unidas criticou, na terça-feira, o sistema Judiciário da Bolívia depois de visitar o país por uma semana a convite do governo de Luis Arce. Para o advogado Diego García-Sayán, ex-político peruano e ex-presidente da Corte Interamericana de Direitos Humanos, “há uma urgência na sociedade boliviana de que a justiça responda aos dramas cotidianos”.

A visita ocorreu em meio a críticas à Justiça boliviana após a descoberta de uma rede de juízes que libertou assassinos e estupradores por dinheiro. García-Sayán manteve reuniões com autoridades judiciais, políticos e organizações da sociedade civil.

Contexto : Única opositora a Morales presa, Áñez se torna bode expiatório na Bolívia

— Na Bolívia, a justiça está longe do povo — disse o relator especial sobre a independência de juízes e advogados. — Se não houvesse questionamento da independência judicial, eu não estaria aqui.

O perito chegou dias após o início do julgamento da ex-presidente interina Jeanine Áñez (2019-2020), em prisão preventiva desde março de 2021, que se define como “prisioneira política” e iniciou uma greve de fome em 9 de fevereiro.

E mais : TPI rejeita pedido para investigar ex-presidente boliviano Evo Morales por crimes contra a humanidade

Áñez é acusada de ter participado de um suposto golpe de Estado contra seu antecessor , o esquerdista Evo Morales (2006-2019), que renunciou em meio a protestos maciços por suposta fraude eleitoral denunciada pela Organização dos Estados Americanos (OEA). Semanas depois, vários organismos independentes confirmaram a lisura do processo eleitoral, que deu vitória a Morales.

García-Sayán criticou as “dificuldades” para a hospitalização da ex-presidente, que na sexta-feira não pôde ser transferida, apesar de uma ordem judicial, devido a uma manifestação nos portões da prisão.

— O Estado é responsável pela integridade física e pela saúde de qualquer pessoa privada de liberdade — disse.

Pandemia : Covid-19 agrava problemas provocados por superlotação das prisões na América Latina

Ánez foi proclamada presidente interina em 12 de novembro de 2019, com o apoio das forças de oposição a Morales. Ela deixou o poder em novembro de 2020, após a eleição de Luis Arce, aliado de Morales,  e foi presa em março. Como agora, durante seu governo foram abertos vários processos contra dirigentes do MAS, agora arquivados.

Durante a visita, o relator também se reuniu com familiares de vítimas da repressão durante as primeiras semanas do governo interino de Áñez, em novembro de 2019, e afirmou que “depois de mais de dois anos, os resultados” da investigação são escassos. O relatório detalhado da missão será apresentado em junho, próximo ao Conselho de Direitos Humanos da ONU em Genebra, Suíça.

Leia também : Ex-ministro do governo interino da Bolívia é preso nos EUA acusado de suborno e lavagem de dinheiro

Em agosto, um grupo de especialistas contratados pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), em acordo com a Bolívia, concluiu que “os tipos penais ambíguos”deveriam ser revistos para evitar seu uso “arbitrariamente”. O estudo apontou que “magistrados, advogados e procuradores estão expostos a pressões externas e interferências no exercício de suas funções, principalmente de setores políticos”.