Mundo Guerra na Ucrânia

Rússia impõe sanções ligadas a abastecimento de gás para a Europa e crise energética no continente se aprofunda

Embora ainda simbólicas, retaliações mostram que Moscou está disposta a travar fluxos de energia para a Alemanha, seu maior cliente; preço do combustível subiu 20%
O logo da gigante estatal russa Gazprom em um posto de combustível em Moscou: subsidiárias europeias da empresa sofreram sanções de Moscou nesta quinta-feira Foto: NATALIA KOLESNIKOVA / AFP
O logo da gigante estatal russa Gazprom em um posto de combustível em Moscou: subsidiárias europeias da empresa sofreram sanções de Moscou nesta quinta-feira Foto: NATALIA KOLESNIKOVA / AFP

BERLIM — A pressão na Europa em busca de fontes alternativas de fornecimento de gás aumentou nesta quinta-feira, após Moscou impor sanções contra subsidiárias europeias da estatal energética russa Gazprom e a Ucrânia interromper os fluxos em uma rota de trânsito de gás, elevando os preços do combustível.

A Rússia impôs sanções na quarta-feira à noite principalmente às subsidiárias europeias da Gazprom, incluindo a Gazprom Germania, uma empresa de comércio, armazenamento e transmissão de energia que no mês passado a Alemanha pôs sob tutela estatal para garantir seu abastecimento.

Embora o movimento pareça ser em grande parte simbólico — equivalente a cerca de 3% das importações de gás russas da Alemanha, de acordo com autoridades alemãs —, o Kremlin está mostrando que não terá receio de pressionar o seu maior cliente. Os preços de referência do gás na Europa subiram mais de 20%.

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A Rússia também impôs sanções à proprietária da parte polonesa do gasoduto Yamal-Europa, que transporta gás russo para a Europa, removendo uma potencial rota alternativa para clientes europeus receberem gás.

Um site do governo russo publicou uma lista de empresas afetadas. O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, disse que as empresas não mais podem participar do fornecimento de gás russo, nem mesmo em associação com outras entidades.

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Grande parte delas está baseada em países que impuseram sanções à Rússia em resposta à invasão da Ucrânia, a maioria de membros da União Europeia (UE).

A Alemanha disse que algumas subsidiárias da Gazprom Germania não estão recebendo gás por causa das sanções. Berlim afirmou buscar alternativas.

— A situação está se agravando a ponto de o uso de energia como arma estar se tornando uma realidade— disse o ministro da Economia alemão, Robert Habeck, a repórteres. — A Gazprom e suas subsidiárias são afetadas. Isso significa que algumas das subsidiárias não estão recebendo mais gás da Rússia. Mas o mercado está oferecendo alternativas.

Principais redes de distribuição do gás russo na Europa





Habeck disse que as medidas da Rússia parecem destinadas a elevar os preços, mas a queda esperada de 3% nas entregas de gás russo pode ser compensada no mercado, embora a um custo mais alto.

Os preços do gás no atacado na Europa dispararam no ano passado, aumentando os encargos para famílias e empresas.

Embora o armazenamento de gás alemão esteja cerca de 40% cheio, ainda é baixo para a época do ano, e os estoques precisam ser acumulados durante o verão em preparação para o inverno.

Além dos cortes que já ocorreram, a Finlândia pode ter seu abastecimento afetado na sexta-feira, segundo publicou o jornal local Iltalehti nesta quinta-feira, citando fontes não identificadas.

A maior parte do gás utilizado na Finlândia vem da Rússia, mas o gás representa apenas cerca de 5% do consumo anual de energia do país. No entanto, perder a maior parte do suprimento do combustível implicaria que gigantes da indústria como Neste e Metsa e outras empresas das indústrias florestal, química e alimentícia precisariam encontrar fontes alternativas de energia ou adaptar sua produção.

Com conexões diretas de gasodutos com a Rússia, a Finlândia e os Bálticos dependem mais do gás russo do que outros países europeus. Se o fornecimento de gás russo for reduzido ou cortado, Finlândia, Estônia, Letônia e Lituânia podem ter que reduzir a demanda, disse a rede europeia de operadoras de gás ENTSOG em suas perspectivas de verão em abril.

O presidente da Finlândia, Sauli Niinisto, e a primeira-ministra Sanna Marin disseram nesta quinta-feira que a Finlândia se inscreverá para se juntar à aliança de defesa ocidental Otan "sem demora", l evando a Rússia a prometer uma resposta.

Moscou anunciou as sanções contra Polônia e Alemanha um dia depois que a Ucrânia interrompeu o abastecimento pela importante rota de trânsito de gás para a Europa de Sokhranovka , culpando a interferência das forças russas de ocupação, na primeira vez que as exportações via território ucraniano foram afetadas desde a invasão.

O ponto de trânsito fechado pela Ucrânia geralmente lida com cerca de um terço do total das remessas de gás russo para a Europa, e a Ucrânia propôs que os fluxos pudessem ser redirecionados para um ponto de trânsito alternativo, Sudzha.

Nesta quinta-feira, o chefe da operadora de gasodutos ucraniana GTSOU informou que não reabrirá a rota de trânsito de gás da Rússia para a Europa até que Kiev obtenha controle total sobre seu sistema de gasodutos

A empresa declarou na terça-feira que suspenderia os fluxos por motivo de força maior, alegando roubo de gás por separatistas apoiados pela Rússia. O gasoduto atravessa a região de Luhansk, na Ucrânia, parte da qual está sob o controle de separatistas apoiados pela Rússia desde 2014.

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“Não abriremos [o fornecimento] até ter o controle total sobre o ativo”, disse Sergiy Makogon, o chefe da GTSOU, em comentários por escrito. Ele disse que a produtora estatal russa de gás Gazprom não sabia que os separatistas começaram a roubar gás que transita pela Ucrânia.

"Eu não acho que a Gazprom estava ciente de que os (separatistas) começaram a roubar nosso gás em trânsito."

O ministro das Relações Exteriores da Ucrânia, Dmytro Kuleba, em visita a Berlim, instou a União Europeia a reduzir sua dependência energética da Rússia.

— O oxigênio energético da Rússia deve ser desconectado, é particularmente importante para a Europa — disse Kuleba em entrevista coletiva. — A Rússia mostrou que não é um parceiro confiável.