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Seis cocaleiros pró-Morales são mortos em repressão policial em Cochabamba

Ex-presidente pede 'fim do massacre' e comissão da OEA condena uso desproporcional da força
A polícia de choque reprime manifestantes pró-Morales em Cochabamba, onde cinco cocaleiros foram mortos Foto: STR / AFP
A polícia de choque reprime manifestantes pró-Morales em Cochabamba, onde cinco cocaleiros foram mortos Foto: STR / AFP

COCHABAMBA, BOLÍVIA - Seis plantadores de folha de coca leais ao ex-presidente boliviano Evo Morales morreram, nesta sexta-feira, em violentos confrontos com policiais e militares, nas cidades de Sacaba e Cochabamba, na Bolívia. As autoridades não mencionaram nenhuma morte, mas uma centena de detidos. A imprensa relatou, por sua vez, pelo menos 20 feridos.

Cinco mortes foram registradas em Sacaba e uma na cidade de Cochabamba, onde a vítima chegou sem vida, e outras duas estão em estado crítico porque têm "lesão cerebral gravel", de acordo com um relatório médico.

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) condenou em comunicado o "uso desproporcional da força policial e militar", confirmando cinco mortes e apontando que havia um número indeterminado de feridos. A CIDH acrescentou que "as armas de fogo devem ser excluídas dos dispositivos utilizados para controlar os protestos sociais".

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No Twitter, o ex-presidente Evo Morales, que está asilado no México, pediu "às Forças Armadas e à polícia que pare o massacre". "O uniforme das instituições da pátria não podem ser manchadas com o sangue do nosso povo", escreveu o ex-presidente na rede social. O plantio de folha de coca, usada para combater os efeitos da altitude, é legal na Bolívia, em áreas e quantidades determinadas pelo Estado. Cochabamba é  o berço político de Morales, que liderava o sindicato dos cocaleiros da região.

Milhares de plantadores de coca haviam assediado as forças policiais que impediam sua passagem pela ponte Huayllani, por onde passariam para ir a La Paz para se opor ao governo interino da senadora Jeanine Áñez, que se declarou presidente na terça-feira, alegando que havia um vazio de poder com a renúncia dos sucessores constitucionais de Morales — o vice-presidente e a presidente do Senado.

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Os manifestantes "carregavam armas, carregavam espingardas, bombas molotov, bazucas caseiras e artefatos explosivos", razão pela qual mais de cem pessoas foram presas, acusou o comandante da polícia de Cochabamba, coronel Jaime Zurita.

— Eles estão usando dinamite e armamento letal como [rifles] Máuser 765. Nem as forças armadas nem a polícia têm esse calibre — acrescentou Zurita.

A polícia de choque, apoiada por militares e um helicóptero, dispersou manifestantes à noite.

Apoiadores do ex-presidente boliviano Evo Morales, ao lado de membros das forças da segurança, durante manifestação em La Paz Foto: HENRY ROMERO / REUTERS
Apoiadores do ex-presidente boliviano Evo Morales, ao lado de membros das forças da segurança, durante manifestação em La Paz Foto: HENRY ROMERO / REUTERS

Com as mortes, sobe para ao menos 15 o número de mortos nos protestos que começaram após a vitória de Morales nas eleições de 20 de outubro — liderados primeiro pelas opositores, que denunciavam fraude no pleito, e depois por grupos pró-Morales, que renunciou no último domingo depois de enfrentar um motim na polícia e receber um ultimato dos militares.

Nas três primeiras semanas de protestos, as manifestações eram organizadas por opositores de Morales. Desde domingo, porém, após a renúncia, são os simpatizantes do ex-presidente que saem às ruas e enfrentam a polícia, reforçada pelos militares.

Nesta sexta, um grupo de simpatizantes de Morales veio de El Alto (cidade próxima) para La Paz para uma manifestação perto da sede do governo), como nos dois dias anteriores.

Embora o dia tenha começado calmo, a tensão aumentou. Com gritos e fogos de artifício, os manifestantes denunciaram um "golpe de estado" contra Morales e declaravam como ilegítimo o governo de Áñez, perto Palácio Quemado, sede do Executivo, protegido por barricadas e militares.

Pedido de paz

A União Europeia (UE) pediu nesta sexta às "autoridades de transição" na Bolívia para "garantir paz e segurança" no país e realizar uma "eleição rápida" após a renúncia de Morales.

- O objetivo imediato das autoridades de transição deve ser garantir a paz e a segurança no país e levá-lo a eleições rápidas - disse a chefe da diplomacia europeia, Federica Mogherini.

Presidente interina autoproclamada da Bolívia, Jeanine Áñez, durante entrevista coletiva em La Paz Foto: RONALDO SCHEMIDT / AFP
Presidente interina autoproclamada da Bolívia, Jeanine Áñez, durante entrevista coletiva em La Paz Foto: RONALDO SCHEMIDT / AFP

Em sua declaração, em nome dos 28 países da UE, Mogherini afirma que esse novo pleito deve permitir que o povo "se expresse livremente" e convida a todos os partidos a trabalhar "pela reconciliação".

Um enviado pessoal do secretário-geral da ONU, António Guterres, se somará á negociação entre o governo provisório bolivariano e apoiadores do ex-presidente Evo Morales para a pacificação do país.

Jean Arnault, que tinha previsto desembarcar nesta sexta em La Paz, "vai se incorporar" às gestões "nas próximas horas", disse a jornalistas o representante local da UE, o espanhol León de la Torre.