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Whipala, a bandeira que é símbolo de união e de divisão da sociedade boliviana

Onipresente no país, estandarte dos povos andinos protagonizou marchas, mas também foi alvo de vandalismo durante protestos
Foto: JORGE BERNAL / AFP
Foto: JORGE BERNAL / AFP

LA PAZ — Nas ruas, nas casas, nas repartições públicas, a whipala, bandeira que representa os povos originários andinos, está por toda parte em La Paz. O símbolo, no entanto, é também um dos mais claros da polarização que tomou conta da política boliviana, e está longe de ser um consenso. Durante os protestos que levaram à renúncia de Evo Morales , há um mês, ela protagonizou as marchas mas também foi alvo de vandalismo: chegou a ser queimada e arrancada de uniformes policiais.

Em formato de mosaico colorido, a whipala como conhecemos hoje foi criada nos anos 1970 pelo historiador Germán Choquehuanca, durante as mobilizações para recuperar a identidade política do povo aimará. Já com Morales no poder, foi reconhecida na Constituição de 2009 como símbolo do Estado Plurinacional.

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Ao longo última década, no entanto, acabou sendo fortemente associada ao Movimento ao Socialismo (MAS), legenda do ex-presidente. Por isso, explica o indigenista e historiador Pedro Portugal, embora seja um símbolo da união, tem também um forte caráter divisório na atual sociedade:

— A whipala nasceu em um momento em que os povos indígenas buscavam se inserir na política, e por isso se impôs como símbolo. Mas acabou sendo apropriada pelo MAS, o que trouxe consequências que foram subestimadas — diz. — Somos um nação que historicamente excluiu indígenas do poder, a descolonização ainda não aconteceu, mas ter duas bandeiras não resolve esse problema. Ainda não criamos uma nação, mas queremos falar em plurinacionalidade.

O teólogo Matthías Preiswerk afirma que a whipala, assim como a Bíblia, acabou sendo usada na atual “guerra de símbolos” entre as religiões de origem cristã e os povos ancestrais.

— Por muito tempo a Igreja Católica contou com privilégios políticos, sociais e econômicos na Bolívia — afirma. — Durante os últimos 14 anos, houve uma perda notória dessa influência. Evo tentou instaurar cerimônias interreligiosas em praças públicas, com representantes andinos, evangélicos, judeus e islâmicos. Houve a substituição da simbologia e discurso da visão cristã por uma visão político-religiosa andina. Por isso, quando (Luis Fernando) Camacho ou Jeanine Añez dizem que a 'Bíblia volta ao Palácio', falam sobre a volta desse privilégios.

A repórter viajou a convite da Fundação Konrad Adenauer (KAS)