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Muito tem sido dito sobre a recém-lançada política industrial desenhada pelo governo, o programa Nova Indústria Brasil (NIB). Os críticos, nós inclusive, advertem que serão R$ 300 bilhões malgastos até 2026. Os defensores advogam que será um instrumento para o desenvolvimento brasileiro. Na defesa do NIB, contudo, curioso foi ler a interpretação dada pelo governo ao documento elaborado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) para justificar e validar alguns pontos, como as regras sobre as compras públicas e as obrigações de conteúdo nacional, mesmo que o preço seja maior. Esses argumentos, de que discordamos, podem ser encontrados no texto “O que é fato e o que é fake sobre a NIB”, no site do governo.

Antes, porém, vale dizer que, na nossa visão, o NIB volta ao passado, usando instrumentos e políticas funestas, que levaram o país a uma grave recessão do segundo trimestre de 2014 ao terceiro trimestre de 2016. E não se concentra nos reais problemas que comprometem o aumento da produtividade brasileira, como ter uma educação norteada por resultados — o Brasil segue como um dos últimos nas provas do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa, na sigla em inglês). Aliás, entendemos que a política econômica atual, em geral com baixo apreço à disciplina fiscal, tem probabilidade elevada de dar errado, assim como a atual governança das empresas públicas. Oxalá estejamos equivocados e tenhamos em 2026 uma relação dívida/PIB decrescente, juros baixos, inflação na meta, além de crescimento sustentável.

Diferentemente do alegado pelo governo, o FMI não afirmou que “políticas industriais são importantes indutores do desenvolvimento industrial” (item 7 do documento do governo). O FMI diz, em vez disso, que “os governos deveriam ter cuidado no uso de políticas industriais” e que “trabalhos adicionais são necessários para avaliar o sucesso ou fracasso das políticas industriais” (página 25). O FMI se preocupa com “os efeitos internacionais e setoriais adversos à competição e ao equilíbrio geral de bem-estar social”, além de enfatizar os “potenciais efeitos perversos da proteção nacional para a ordem comercial mundial” (página 25), calcada nas regras da Organização Mundial do Comércio.

Dito isso, depreendemos do documento do FMI que seus autores tiveram o objetivo de criar um observatório das políticas industriais adotadas no mundo desde 2023, agregando dados, fatos e padrões. Eles, assim, não tinham como meta fazer juízo de valor sobre cada ponto, como o texto do governo sugere. Concluem que há mais subsídios nos países desenvolvidos, enquanto restrições comerciais incidem mais nos países em desenvolvimento. A ideia deles é obter insumos para futuras avaliações dessas políticas públicas.

Em suma, conquanto haja diferentes opiniões a respeito do NIB, não nos parece correto usar o documento do FMI para legitimá-lo. Aliás, dado o amplo apoio do FMI ao governo argentino (libertário), entendemos ser improvável que apoie políticas já experimentadas numa determinada jurisdição, cujos resultados levaram tal país a uma brutal recessão.

*Cristiane Schmidt, doutora em economia pela EPGE/FGV, foi integrante do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), Cesar Mattos, doutor em economia pela PUC-Rio, foi integrante do Cade

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