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O Senado aprovou, no dia 20, o Projeto de Lei 2.253/2022, que acabou com a saída temporária de presos em datas festivas, prevista na Lei de Execução Penal. Defendo a reformulação das “saidinhas” desde 2011, quando apresentei na Câmara dos Deputados o PL 583/2011, que originou a proposta hoje em discussão. Nesses 13 anos, o texto endureceu na Câmara, foi flexibilizado no Senado e, ainda que tenha evoluído, precisa ser aperfeiçoado.

Minha proposta original previa, entre outras medidas, o monitoramento eletrônico de presos com direito à saída temporária. Pela lei atual, ela vale para detentos em regime semiaberto, que podem sair para visitar a família, frequentar curso profissionalizante ou participar de atividades de retorno ao convívio social. O instituto foi criado pois no Brasil não há prisão perpétua. A reintrodução gradativa à sociedade é uma forma de evitar a reincidência e estimular o bom comportamento. Se prosperar o texto aprovado, esse benefício ficará restrito apenas a saídas para estudos.

Os presos que usam as “saidinhas” para fugir provocam justo temor e revolta. No entanto números fornecidos pelas secretarias penitenciárias estaduais mostram que, no Brasil, dos 57.235 detentos que tiveram direito à saída temporária de Natal em 2023, 2.779 não retornaram, o que corresponde a 4,86%. No Estado de São Paulo, dos 34.547 que saíram, 1.566 não voltaram, um índice semelhante, de 4,53%. E, o que chama mais a atenção: 81 cometeram crimes durante o período, 0,23% do total de beneficiados. Não é justo acabar com um direito da maioria porque uma parcela mínima se comporta mal. Uma quantidade significativa de apenadas mulheres, muitas delas mães, que retornam mais do que a média dos homens, também terá o direito à reintegração social e familiar suprimido.

É possível reduzir essas fugas e crimes a zero com o uso de tecnologia e a reformulação dos critérios de concessão do benefício. Olhemos para Minas Gerais: dos 160 presos que não retornaram à prisão após o Natal de 2023, 52,5% foram recapturados. Um rastreamento efetivo teria o potencial de elevar esse percentual. O custo disso seria viável? Dados de janeiro a junho de 2023 — do Sisdepen, ferramenta de coleta de dados do sistema penitenciário — mostram que o país tem contratadas 121.911 tornozeleiras eletrônicas, das quais 92.894 estão em uso. Como pouco mais de 57 mil presos têm direito à “saidinha”, precisaríamos comprar 28 mil tornozeleiras a mais para monitorar 100% dos contemplados com o benefício.

Também é urgente tornar mais rigorosos os critérios de avaliação para concessão das “saidinhas”. Mais dados: no Rio de Janeiro, de 1.785 detentos liberados no Natal, 255 não voltaram, entre eles chefes de facções. Ou seja, 14,29% de não retorno, o triplo da média nacional. Isso evidencia a falta de critério e controle na concessão do benefício. É inaceitável e precisa mudar.

É inegável que o texto no Senado evoluiu, aproximando-se da ideia original do meu PL, que jamais previu a extinção completa desse mecanismo, e sim seu aperfeiçoamento. Agora, de volta à Câmara, proporemos aprimoramentos dos critérios de concessão; o monitoramento eletrônico obrigatório desses presos; e a unificação, padronização e divulgação de dados do sistema penal do país inteiro.

Casos recentes envolvendo crimes de presos durante as “saidinhas” trazem indignação e, ao mesmo tempo, oferecem uma oportunidade de encontrar uma solução definitiva. Como dizia o conhecido estrategista chinês Sun Tzu, em “A arte da guerra”, a energia é que tensiona o arco; decisão é a que solta a flecha. Esse debate não pode ficar refém de convicções ideológicas. O desejo de vingança não pode prevalecer na discussão, tampouco a aversão ao endurecimento de instrumentos penais. Com evidências científicas, dados, rigor técnico e boa política, temos a chance de produzir uma legislação de qualidade e oferecer a resposta efetiva que a sociedade espera.

*Pedro Paulo é deputado federal (PSD-RJ)

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