Artigos
PUBLICIDADE
Artigos

Colunistas convidados escrevem para a editoria de Opinião do GLOBO.

Informações da coluna

Artigos

Artigos escritos por colunistas convidados especialmente para O GLOBO.

Por

Quando eu era presidente da Agência Nacional de Águas e Saneamento (ANA), 20 anos atrás, fui integrante de três conselhos nacionais: meio ambiente (Conama), recursos hídricos (CNRH) e energia (CNPE). Minha lembrança é que o CNPE era o que menos frequentemente se reunia. Em contrapartida, quando o fazia, tomava decisões relevantes. Na outra ponta, o Conama se reunia muito para discutir temas em geral pouco importantes. O CNPE era formado por apenas nove pessoas, entre elas sete ministros de Estado. O Conama tinha mais de cem participantes. Apenas sete, porém, eram representantes do setor produtivo. O CNRH ficava no meio do caminho, com 37 membros.

A partir dessa experiência, desenvolvi a percepção de que a eficácia de um conselho se correlaciona positivamente com a hierarquia de seus membros e negativamente com o número de seus participantes. Parafraseando Sir Barnett Cocks (assessor do Parlamento do Reino Unido), os conselhos numerosos são em geral formados por pessoas que individualmente não podem fazer nada e que, como grupo, decidem que nada pode ser feito.

Lembrei essa experiência ao ler o Decreto 11.960 (21/3/2024), que contém diretrizes para funcionamento do CNRH e estabelece sua composição. Dos 50 componentes titulares, 25 serão representantes de 22 ministérios; dez, dos conselhos estaduais; sete, das organizações civis; e apenas oito, dos setores usuários. A esmagadora maioria não terá a menor familiaridade com o tema. Haverá um único representante dos irrigantes e um único representante das hidrelétricas. Chance de que esse arranjo dê certo? Baixíssima!

Se o governo estivesse interessado numa boa gestão dos recursos hídricos e na universalização do saneamento, teria criado um CNRH mais focado. Com capacidade técnica para assessorar o Senado na sabatina de indicados para a composição da diretoria da ANA.

Historicamente, o Senado tem examinado apenas formalmente, “para inglês ver”, os candidatos à direção de agências reguladoras. Uma manifestação formal de um CNRH notoriamente capacitado poderia inibir indicações exclusivamente políticas para a ANA. Mas o CNRH, com a composição definida no decreto, não se qualifica para a missão.

Alternativamente, a Associação Brasileira de Recursos Hídricos (ABRHidro) e a Associação Brasileira de Engenharia Sanitária (Abes) — duas respeitadas e longevas associações profissionais — deveriam se manifestar de ofício por meio de parecer sobre a qualificação legal e profissional de cada indicado pelo Executivo para a diretoria da ANA. Outras associações profissionais deveriam fazer o mesmo com relação às demais agências reguladoras de suas respectivas áreas de atuação. Seria um elemento a mais para ajudar os senadores a decidir com conhecimento de causa.

*Jerson Kelman, engenheiro, foi o principal dirigente da ANA, Aneel, Light, Sabesp e ABRHidro

Mais recente Próxima A inclusão digital e as big techs