Artigos
PUBLICIDADE
Artigos

Colunistas convidados escrevem para a editoria de Opinião do GLOBO.

Informações da coluna

Artigos

Artigos escritos por colunistas convidados especialmente para O GLOBO.

Por e

O Parlamento Europeu editou um regulamento que trará impactos significativos às exportações brasileiras a partir deste ano. Conhecido como Lei Antidesmatamento ou EUDR, o texto busca restringir a entrada, no bloco europeu, de produtos associados ao desmatamento e à degradação florestal que tenham ocorrido a partir de 2020.

Nos termos do EUDR, o fornecedor de commodities como madeira, cacau, soja, óleo de palma, borracha, café e gado deve garantir que seus produtos não sejam originários de áreas desmatadas ou degradadas, devendo regularizar-se até dezembro de 2024. Para isso, os fornecedores devem implementar um sistema de rastreabilidade em suas cadeias e monitorar as coordenadas geográficas do cultivo, entre outras medidas.

Um dos principais desafios do agronegócio brasileiro do momento, o regulamento europeu se baseia no desmatamento zero. Proíbe todo e qualquer tipo de desmatamento, ainda que permitido por lei no país de origem do produto. A justificativa é a questão climática, ao considerar que a degradação ambiental é a mesma, independentemente de ser aceita em contextos nacionais.

No Brasil, ainda há extensas áreas que podem ser desmatadas respeitando a legislação vigente, principalmente nas regiões Centro-Oeste e Norte, onde predominam os biomas Cerrado e Amazônia. Com base no atual texto do EUDR, os produtores dessas áreas legalmente desmatadas depois de 2020 não conseguiriam exportar para a União Europeia.

Governos e iniciativa privada buscaram definir datas de corte para restringir a compra em áreas desmatadas. O Código Florestal brasileiro (Lei nº 12.651/2012) usa a data de 22 de julho de 2008, enquanto a Rainforest Alliance, certificação quanto à gestão de florestas e rastreabilidade da madeira, usa 2014. Para o EUDR, ficou definido o ano de 2020, em sintonia com a data estipulada no Objetivo de Desenvolvimento Sustentável nº 15, da Organização das Nações Unidas, e com a assinatura da Declaração de Florestas de Nova York.

O Brasil dispõe de amplo conjunto de dados georreferenciados e tecnologias que podem apoiar a regularização, além de selos, como a Moratória da Soja.

De acordo com o EUDR, as coordenadas solicitadas de identificação e rastreabilidade devem corresponder às parcelas de terreno em que os produtos de base e produtos derivados foram produzidos. Isso poderia significar, em tese, que a diligência exigida não estaria ligada à fazenda como um todo, mas apenas à parcela onde houve a produção. Todavia há diferentes interpretações sobre esse ponto. Também se exige o apontamento da quantidade dos produtos, as coordenadas georreferenciadas da produção e a avaliação de riscos considerando o país de origem. Como se vê, a norma traz pontos abrangentes e subjetivos, demandando uma necessidade de melhor alinhamento e regulamentação.

Tradicionalmente, as áreas conservadas no Brasil e noutras regiões do planeta são mais pobres, pois o desenvolvimento econômico costuma estar atrelado ao desmatamento, além de a atividade de conservação não ser remunerada. Ao impedir a conversão de áreas conservadas em agronegócio, a EUDR pode reforçar a manutenção da pobreza em diversos países, e isso precisa ser analisado e diagnosticado.

O Brasil tem interesse em reduzir seu desmatamento, tal como apontam as autoridades públicas, mas os países compradores de produtos do agronegócio também podem fazer parte desse esforço. O primeiro passo é reconhecer a produção sustentável do Brasil, em que a produtividade é muito superior à média global, e a conservação, mais presente.

É preciso conciliar os objetivos e processos da EUDR com a conservação e o combate à pobreza. É nesse sentido que o diálogo entre União Europeia e Brasil deve evoluir.

*Yuri Rugai Marinho é sócio-diretor da ECCON Soluções Ambientais; Julia Maillet Rocha Lenzi é gerente de ESG da ECCON Soluções Ambientais

Mais recente Próxima Abastecimento de água na Região Metropolitana do Rio: sistema sem redundância