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O desastre climático no Rio Grande do Sul pede uma virada de chave na forma como tratamos o desenvolvimento do país. O Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC), em seu Sexto Relatório de Avaliação de 2023, fala de caminhos de desenvolvimento resiliente, e não mais apenas sustentável.

Mantido o planejamento de infraestrutura baseado nas séries históricas de dados hidrológicos e climatológicos, há grandes chances de criar riscos adicionais de perdas e danos, caso não sejam consideradas projeções e incertezas imputadas pelo aquecimento global.

Conquanto o aumento do “estoque” de infraestrutura no Brasil seja essencial para a prosperidade econômica do país no curto e no longo prazo, fazer com que os investimentos nessa direção aumentem a resiliência — não criem mais vulnerabilidade a choques climáticos no país — é de igual ou maior importância. Uma excelente oportunidade é incutir adaptação no pacote do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que buscará mobilizar R$ 1,7 trilhão até 2026. A expectativa é que a construção do Plano Clima, com estratégias transversais de adaptação e mitigação, além de 23 planos setoriais, possa ajudar a avançar.

Numa perspectiva global, quanto maior o estoque de infraestrutura e cidades resilientes aos riscos associados à mudança do clima, melhor para a economia. Bilhões de pessoas no mundo, além de empresas e governos, podem se beneficiar do consumo e das tecnologias de baixo carbono e resilientes, pois facilitam uma resposta mais rápida e eficiente aos impactos climáticos.

Dentro da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a adaptação muitas vezes ficou em segundo plano em relação aos esforços de mitigação. Apesar de sua igualdade de status no Acordo de Paris, a adaptação ainda não recebeu a atenção e os recursos que merece.

À medida que as negociações climáticas preparatórias para a COP29 começam na próxima semana, em Bonn, na Alemanha, os países precisam aproveitar a oportunidade para elevar o discurso político sobre adaptação, superar as lacunas na implementação dos planos nacionais e expandir o financiamento para isso.

O Quadro dos Emirados Árabes Unidos para a Resiliência Climática Global, adotado na COP28, representa um passo importante para aprimorar os esforços globais de adaptação. Central nele está o Programa de Trabalho UAE-Belém, uma iniciativa de dois anos destinada a desenvolver indicadores para adaptação. Os Planos Nacionais de Adaptação (PNAs) podem também orientar os esforços dos países nesse sentido. No entanto seu avanço tem sido dificultado por financiamento e apoio técnico insuficientes.

Afinal, quem pode se adaptar melhor? Aqueles que têm mais acesso a recursos financeiros e tecnológicos. Assim, neste ano em que o principal foco da diplomacia climática será o financiamento, está mais uma vez colocada a necessidade de atender às crescentes necessidades de adaptação, em especial das comunidades na linha de frente.

Adaptar-se ao novo clima nos dá a chance de aprender a lidar com riscos numa escala maior do que a individual. Podemos proteger nossa casa contra enchentes, mas sozinhos não podemos impedir que as enchentes atinjam nosso bairro ou nossa cidade.

No cerne de se adaptar, está a rápida transição para longe de combustíveis fósseis em todos os níveis e setores possíveis. Junto disso, é preciso construir capacidade para antecipar, enfrentar e adaptar-se aos extremos. Portanto descarbonização e adaptação são parte da mesma solução: quanto mais da primeira, mais possível a segunda. Somente por meio de ação concertada e coletiva podemos construir um futuro resiliente.

*Natalie Unterstell, mestre em política pública pela Universidade Harvard, é presidente do Instituto Talanoa

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