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Artigos escritos por colunistas convidados especialmente para O GLOBO.

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Pai argentino, mãe paraguaia. Em comum, a língua espanhola. E em desacordo, um litígio. Depois da separação, a mãe leva o filho — 2 anos incompletos — sem o consentimento do pai para o Paraguai. A Justiça daquele país dá uma sentença: a criança tem de ser devolvida. Quando a mãe recebe o comunicado para ir à delegacia, foge com o garoto. Passados nove anos, a família é localizada. Começa mais um drama. Enquanto o caso não se resolve, o menino vai morar com uma tia. A história não acaba bem. Ele não quer mais morar nem com o pai nem com a mãe.

O caso, contado por Ricardo Pérez Manrique — atualmente juiz da Corte Interamericana de Direitos Humanos e ex-ministro da Suprema Corte de Justiça do Uruguai — no encontro de juízes de enlace da América Latina e do Caribe, promovido pelo Tribunal Regional da 2ª Região (TRF2) no mês passado, ilustra bem a necessidade de pactos internacionais para proteger o elo mais frágil numa disputa familiar. Cabe ao juiz de enlace — ou de ligação — facilitar a tramitação entre países em casos de subtração de crianças. É para elas e pensando nelas que a Convenção de Haia foi constituída: os menores devem crescer no seio de uma família. Pais têm a obrigação de lutar para prevenir a subtração, venda ou tráfico de crianças para qualquer finalidade ou sob qualquer forma. O direito da criança de ser ouvida e ter sua opinião levada em conta deve também ser assegurado. Ela nunca deve ser separada dos pais, a não ser que esteja sendo maltratada.

No encontro, discutimos com colegas da América Latina e do Caribe medidas para combater a subtração e que garantam ainda mais a proteção de menores. Depois de três dias de palestras, debates e muitas discussões, construímos um consenso, que resultou na Carta do Rio de Janeiro. Criaremos um grupo de trabalho para discutir questões de gênero, especialmente a violência doméstica, seja ela física, psicológica, financeira e sexual. Decidimos realizar um fórum para debater o retorno de crianças a países que dificultam emissão de vistos de permanência ou a regularização migratória do genitor que subtrai a criança. Há que se ter um protocolo comum entre os países que trate de ações e cuidados desde a decisão do retorno até o primeiro ano após o retorno da criança ao seu país de origem.

Capa do audio - Bernardo Mello Franco - Conversa de Bastidor

Os juízes de enlace acreditam que a integração com autoridades de governo e diplomatas pode evitar a subtração de crianças. Realizaremos cursos de capacitação para atores do Judiciário lidarem com questões de subtração. Um grupo de trabalho será criado para identificar obstáculos que impedem a solução de litígios de subtração no prazo convencional. Por fim, sugerimos aos países a adesão à Convenção de Haia de 1996 sobre Responsabilidade Parental e medidas de proteção à criança.

Ações como essas podem nos ajudar a construir uma sociedade mais justa, mais igualitária e ética, em que o respeito ao ser humano não deve se limitar a um discurso. É um norte a ser perseguido todos os dias.

*Guilherme Calmon, desembargador federal, é presidente do Tribunal Regional Federal da 2ª Região

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