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GERADO EM: 10/07/2024 - 00:05

Fraude bilionária na Americanas: importância de novos controles

A descoberta de fraudes na Americanas chocou o mundo corporativo, revelando uma operação sofisticada que inflou lucros em R$20 bilhões. A contratação do presidente Sergio Rial foi crucial para expor a megafraude, destacando a importância de novos controles e auditorias para prevenir crimes empresariais.

A surpresa da década no mundo corporativo brasileiro foi a descoberta de fraudes criminosas dentro das Lojas Americanas. Até dezembro de 2022 a Americanas ganhava boa parte dos prêmios destinados às empresas ESG, onde o G se refere justamente a uma boa governança.

Não apenas isso: ao longo de 2022, a Americanas passou a oferecer cursos a outras empresas sobre como toda empresa pode se transformar num “modelo de gestão” — em que uma das disciplinas era sobre “ética nos negócios”. Os cursos foram dados de forma gratuita aos 149 mil fornecedores e lojistas parceiros.

Falando da fraude em si, o que ocorria: nesse tipo de negócio, muitas vezes é o próprio varejista quem faz a publicidade dos produtos do fornecedor por meio do que é chamado de “verba de propaganda cooperada (VPC)”. No entanto a Americanas dizia que fazia, mas apenas lançava na contabilidade e, com isso, reduzia o que devia aos fornecedores. Estes nem sabiam o que acontecia. Com isso, a empresa inflava seus lucros e aumentava o valor das ações. Esse aumento fictício de lucros feito por período considerável superou R$ 20 bilhões. Não foi tão simples, pois, na verdade, montou-se uma operação sofisticada que ficou imperceptível por muitos anos.

Tudo foi descoberto quando a Americanas contratou Sergio Rial para ser seu presidente em janeiro de 2023. Rial, talvez por ter vindo de um dos bancos que mais operavam com a Americanas, descobriu que havia algo de muito errado com a varejista. Pediu demissão no mesmo mês em que começou a trabalhar, não sem antes denunciar a megafraude. Na verdade, o valor é muito maior se computarmos o prejuízo dos fornecedores, dos parceiros lojistas, dos funcionários que perderam o emprego e dos acionistas. Só não perderam os antigos executivos, que tinham ações da empresa e as venderam criminosamente no meio de 2022, quando souberam que um novo presidente era buscado no mercado.

Há que tomar cuidado com os que agora afirmam que crimes e fraudes nunca serão descobertos, por melhores que sejam as regras e os procedimentos adotados pelas empresas. Alegam que os criminosos descobrem formas de burlar e enganar auditorias, analistas bancários, conselhos fiscais e agências de rating. Estas, aliás, avaliavam a Americanas como AAA, o que significa empresa praticamente sem risco. Isso poucos meses antes da descoberta do megarrombo. Os maiores acionistas e o advogado do conselho de administração têm dito à imprensa que foram pegos de surpresa. Claro que não é uma boa explicação.

Não é incomum que não haja sintonia entre conselhos de administração e a diretoria executiva das empresas. Assim como também não é raro que haja fraudes ou atos criminosos por parte de alguém do quadro de funcionários, como ocorreu na Americanas. Mas bons sistemas de controle amparados por bons auditores podem prevenir fraudes. Nesse caso em particular, faltou a checagem/confirmação junto a fornecedores e lojistas do que a Americanas registrava com o que acontecia. Boa parte das vezes, isso pode ser feito de forma automatizada, desde que haja integração dos sistemas das várias partes envolvidas. Tanto não era difícil que Sergio Rial, no pequeno tempo em que permaneceu como presidente da Americanas, descobriu algumas irregularidades.

É provável que a Americanas seja um caso isolado, mas, mesmo assim, há muito para fazer em termos de novos controles e mecanismos de auditoria e fiscalização. O lado otimista é que esses aspectos agora podem contar com a inteligência artificial para descobrir manipulações criminosas que ocorram nas empresas.

*Paulo Feldmann, professor de administração da USP, é conselheiro de empresas e certificado pelo Instituto Brasileiro de Governança Corporativa

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