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Com a retomada dos trabalhos no Congresso, ganhou destaque no Senado a Proposta de Emenda à Constituição conhecida como PEC dos Militares. De autoria do senador Jaques Wagner (PT-BA), o texto altera as regras para integrantes da ativa das Forças Armadas concorrerem em eleições. Se aprovada, os militares que decidirem buscar uma vaga no Legislativo ou Executivo passarão para a reserva no momento da candidatura. Dado o histórico do governo Jair Bolsonaro, com militarização de cargos civis, politização dos quartéis e tentativa de golpe, a medida seria um avanço institucional. Mas, embora seja um passo necessário, o alcance precisaria ser ampliado para surtir o efeito pretendido.

A transformação de quartéis e delegacias em focos de campanha política é problema crescente. Hoje os candidatos se afastam quando se candidatam e, se perdem, podem voltar. Na última eleição, 1.207 candidatos registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) se declararam militares da ativa, policiais militares, policiais civis e bombeiros, 22% acima de 2018. O problema da PEC é se ater apenas aos integrantes das Forças Armadas, o menor contingente, com 63 candidaturas em 2022. Como está, ela é inócua contra a politização das polícias militar e civil.

Em requerimento apresentado no Senado, o senador Hamilton Mourão (Republicanos -RS) afirmou haver “vícios de inconstitucionalidade” na PEC dos Militares. Para ele, trata-se de “afronta direta” aos direitos políticos, “como se membros das Forças Armadas fossem cidadãos de segunda categoria”. O argumento é descabido. Militares da ativa dispostos a buscar uma carreira política continuarão completamente desimpedidos, desde que abram mão da carreira militar. A tentativa de buscar o mesmo tratamento que o dispensado aos demais servidores federais não leva em conta que funcionários civis não carregam armas nem batem ponto em quartéis.

As investigações da Polícia Federal sobre a tentativa de golpe com a participação de ministros militares e integrantes das Forças Armadas aumentaram o apoio à PEC dos Militares no Senado. O entusiasmo, porém, parece ter alvo equivocado. Se a lei impusesse as restrições da PEC desde o início da administração anterior, não teria evitado nenhuma trama golpista. Os principais suspeitos eram militares reformados com cargos no Executivo ou integrantes das Forças Armadas. O braço político tinha liderança civil.

A PEC tampouco teria evitado os escândalos envolvendo militares de diversas patentes, da ativa e da reserva – do desastroso combate à pandemia da Covid-19 às joias sauditas. O texto do senador Jaques Wagner não trata do exercício de cargos civis por militares. A presença dos oriundos da caserna em cargos comissionados triplicou entre 2013 e 2021. Até agora, nada impede que a situação se repita. Para resolver a questão, o ideal seria aprovar outra PEC, já em tramitação, restringindo o acesso de militares a ministérios e cargos civis no governo.

No momento em que a PF investiga a maior conspiração contra a democracia desde o fim da ditadura, os senadores têm dever redobrado de tomar medidas para evitar novos crimes semelhantes. A PEC dos Militares, apesar do efeito limitado, aponta na direção certa, ao combater a politização dos quartéis. Além dela, também é necessário disciplinar as polícias e a presença de militares da ativa em cargos civis.

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