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Passados dez anos da Copa do Mundo no Brasil, 38% dos projetos de mobilidade urbana pensados para o torneio foram abandonados ou concluídos apenas parcialmente. Por ser um retrato do que costuma acontecer no país, o dado é uma oportunidade para uma reflexão que vá além do debate sobre o legado de eventos esportivos. Identificar as causas do baixo índice de execução de obras é primordial para que o Brasil deixe de ter uma infraestrutura sofrível, mesmo na comparação com países no mesmo estágio de desenvolvimento.

No período anterior à Copa, prefeitos e governadores puseram projetos de mobilidade urbana na lista de metas. Nem todos eram essenciais para receber os torcedores, mas a demanda tornou evidente a deficiência nas capitais que hospedariam os jogos. De acordo com estudo do economista Cláudio Frischtak, para equiparar o transporte público das 15 principais regiões metropolitanas brasileiras ao de Santiago, no Chile, ou da Cidade do México, seria necessário investir R$ 295,5 bilhões.

Não chega a ser novidade que o Brasil investe pouco em infraestrutura, 2% do PIB, levemente acima do necessário para cobrir a depreciação. As obras abandonadas da Copa revelam outro obstáculo. Falta de recursos não era empecilho, pois os projetos contavam com linha especial de financiamento do BNDES. Eram considerados prioritários já em 2014. Os prefeitos e governadores que se alternaram no poder de lá para cá tiveram dez anos para concluí-los. Por que falharam? Porque a governança do investimento público no Brasil é uma vergonha.

Nos países com as melhores práticas, governos promovem análises técnicas aprofundadas para determinar prioridades. Uma vez decididos os alvos, é feito um planejamento cuidadoso, elaborado um projeto detalhado e são estabelecidas programação e licitação. A execução é fiscalizada e, depois da entrega, é feita avaliação dos resultados.

No Brasil, tudo é decidido com base numa mistura de clientelismo e oportunismo político. Um estudo do Tribunal de Contas da União (TCU) de 2019 revelou que 37,5% de 38.412 obras financiadas pelo governo federal estavam paradas. A regra é a diferença descomunal entre o orçamento inicial e o preço final, com suspeitas frequentes de corrupção. As taxas de execução são baixas, como mostram as experiências das várias versões do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Por tudo isso, parte considerável do pouco que o Brasil investe em infraestrutura é desperdiçada. Dos projetos de mobilidade da Copa abandonados, o mais caro foi o VLT de Cuiabá, que consumiu R$ 1 bilhão em dinheiro financiado pela Caixa. Ao todo, 40 trens e 24 quilômetros de aço foram comprados. Depois o governo estadual decidiu trocar os trens por um projeto de BRT. Como revelou reportagem do GLOBO, os vagões até hoje se deterioram perto do aeroporto da capital.

As maiores vítimas do descalabro com os investimentos são os mais pobres, usuários de transporte público forçados a perder um tempo desnecessário no trajeto entre casa e trabalho ou moradores de regiões com serviços de água e esgoto deficitários. São os mais pobres também os mais prejudicados pelo baixo crescimento econômico. Vários trabalhos acadêmicos comprovam a relação entre melhoria de infraestrutura e crescimento. Em 2014, o Brasil levou 7x1 nos gramados. Na infraestrutura, é um 7 x 1 todo ano.

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