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A equipe econômica deverá apresentar em breve ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva propostas do Ministério do Planejamento para rever as regras de concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC), voltado a idosos e deficientes de baixa renda. Não faltam argumentos em favor das mudanças para tornar o programa mais justo, mais eficiente e, de quebra, ajudar a equilibrar as contas públicas. Duas medidas estão em estudo: corrigir o benefício apenas pela inflação, deixando de levar em conta o salário mínimo (cuja regra prevê ganho real) e aumentar a idade mínima para concedê-lo, de 65 para 70 anos. Lula deveria acatar ambas as sugestões.

Publicado em dezembro, um estudo do Banco Mundial sobre o sistema previdenciário brasileiro chamou a atenção para várias incongruências. Uma delas está no BPC. Ao comparar programas do tipo ao rendimento per capita em mais de 30 países, os pesquisadores concluíram que o valor no Brasil é alto demais. “A generosidade da atual aposentadoria não contributiva do BPC só é similar à de Trinidad e Tobago”, afirmam. Além de o benefício em si já ser generoso, o índice de reajuste — o mesmo do mínimo — também é camarada. A correção pela inflação já garantiria a manutenção do poder de compra para quem recebe o auxílio.

Outra distorção: pelas regras atuais, necessidades distintas são tratadas da mesma forma. Quem recebe BPC em geral tem filhos crescidos, não precisa gastar em vestuário ou transporte para ir trabalhar. Apesar disso, recebe o mesmo valor de quem tem filhos pequenos e recebe salário mínimo, com sistema de correção idêntico. Ao desvincular o reajuste do BPC do mínimo, o governo atenuaria a discrepância.

A regra atual para o BPC — o valor é idêntico mesmo para quem nunca contribuiu — é contraproducente e sem lógica. Quem contribui durante toda a vida produtiva ganha, na aposentadoria, o mesmo que quem pouco ou nada pagou ao INSS. Na tentativa de incentivar o recolhimento, o Planejamento examina a possibilidade de pagar um adicional aos que contribuem por algum tempo, mas não atingem o limite mínimo para aposentadoria.

Por fim, está em análise o aumento na idade mínima para concessão do benefício. Dado o envelhecimento da população, é outra medida que não deveria ser adiada. Estimativas do próprio governo reconhecem que, se nada for feito, os gastos com BPC saltarão de R$ 106,6 bilhões neste ano para R$ 140,8 bilhões em 2028. Nesse cálculo, já estão contados os R$ 47,3 bilhões que o governo pretende economizar com cortes de benefícios irregulares. Como essa economia é incerta, a despesa poderá ser bem maior. Não será surpresa se, apesar do pente-fino, o BPC em breve custar mais de 1% do PIB.

Mais de uma vez, Lula já afirmou não aceitar que os mais pobres paguem pelo ajuste das contas públicas. Tal objetivo é nobre num país com tamanha desigualdade social. Mas não pode servir de biombo para encobrir programas mal concebidos e regras injustas. É perfeitamente possível proteger da pobreza idosos e deficientes de baixa renda indexando o benefício que recebem à inflação da cesta básica consumida por essa parcela da população. Lula deveria lembrar que é socialmente injusto manter regras que incentivem a informalidade, o aumento do rombo da Previdência e o desequilíbrio fiscal — que alimenta inflação e pune, sobretudo, os mais vulneráveis que ele quer proteger.

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