Pedro Doria
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Pedro Doria

Jornalista

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Pedro Doria

Elon Musk não é chefe de Estado, não preside nenhum país. Nenhuma de suas empresas tem embaixada no Distrito Federal com diplomata instalado e credenciais oficialmente reconhecidas. Ele é, além de muito rico, um sujeito que passa parte de seus dias no Twitter (ou X) procurando briga. Qualquer um que o acompanhe sabe disso. Não há dia em que não dispare desaforos na direção de alguém. Uns dão trela, outros não. Ele não é a única figura ligada à extrema direita que faz isso. Esse comportamento, já devíamos saber a esta altura, é padrão. É um jeito de militar politicamente na internet. Nesta semana, primeiro o STF, depois o Palácio do Planalto escolheram transformar as bravatas de um bilionário mimado em crise ligada à soberania nacional. Ao fazê-lo, caíram numa armadilha.

Cortes constitucionais são o principal obstáculo aos movimentos antidemocráticos contemporâneos. Seja Hugo Chávez, à esquerda, seja Viktor Órban, à direita, todos os líderes que conseguiram desmontar as democracias de seus países tiveram nos tribunais que interpretam a Constituição o problema mais delicado. O caso brasileiro não é excepcional. E o truque para enfrentar as Cortes não tem nada de misterioso. Basta contar uma história bem contada.

A história que o bolsonarismo quer contar sobre o STF é simples: é uma Corte censora. Autoritária. Que impõe uma ditadura velada ao Brasil, ao perseguir cidadãos que não têm como se defender. O bolsonarismo ganha quando brasileiros o suficiente fazem essa leitura.

O truque para fazer a história colar é torná-la simples. Mensagens, pelas redes sociais, precisam ser diretas e verossímeis. Quando Musk mordeu a isca dos bolsonaristas e lançou um ataque às decisões do STF de cassar contas nas redes sociais, foi o primeiro passo. Mas foram STF e Planalto que transformaram o rompante infantil de um bilionário em crise política. Tivessem ignorado, o assunto já teria desaparecido.

É importante chamar o que Musk fez pelo nome. É um rompante, só isso. Ele ameaçou, mas até agora não desobedeceu às ordens da Corte. Ou quase — deixou um blogueiro banido fazer uma live de uma hora, e só. Gesto para animar as torcidas pró e contra. Para agitar a rede, esquentar as coisas. Musk vive disso. O Brasil, não. E, ainda assim, o país é o segundo em presença de usuários na sua rede. Ser suspensa por ordem judicial faria a empresa sangrar.

Os deputados bolsonaristas souberam aproveitar a crise artificial. Fizeram pressão no presidente da Câmara, Arthur Lira, para que ele arquivasse o Projeto de Lei de Regulação das Redes Sociais — aquele que poderia ter regulado as redes. Isso quer dizer que o Congresso não as regulará neste ano. Quer dizer, também, que o STF assumirá para si o trabalho, criando regras que ampliem a responsabilidade das grandes plataformas digitais ao julgar ações relativas ao Marco Civil da Internet.

Pode parecer paradoxal, mas é tudo o que os autoritários querem. Essa é a convicção do deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), relator do projeto enterrado. E não apenas dele — é a convicção, até, de gente dentro das plataformas. Os bolsonaristas querem que o STF imponha regulação porque a história de que o Supremo quer controlar o que se fala nas redes vai ficando mais forte, mais plausível.

Fariam bem, tanto STF quanto Planalto, se agissem menos com o fígado, se resistissem mais à tentação de se misturar com a briga de lama das redes. Fariam ainda melhor, os ministros do Supremo, se começassem a agir com transparência. Explicando com clareza quem censuram e por quê. A democracia respira melhor à luz do sol.

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