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Política Governo Federal

Centrão teme custo eleitoral da postura antivacina de Bolsonaro em 2022

Avaliação de alguns líderes é que as falas de tom negacionista têm afetado popularidade do presidente
Jair Bolsonaro abraça o presidente do PL, o ex-deputado Valdemar Costa Neto Foto: Reprodução/ Youtube
Jair Bolsonaro abraça o presidente do PL, o ex-deputado Valdemar Costa Neto Foto: Reprodução/ Youtube

BRASÍLIA —  O discurso antivacina de Jair Bolsonaro tem causado incômodo em caciques do Centrão, especialmente no PL, partido ao qual o presidente se filiou. A avaliação de alguns líderes é que as falas de tom negacionista do presidente têm afetado a sua popularidade e podem respingar em outros candidatos da sigla ou quem se disponha a enfrentar a disputa eleitoral do ano que vem a seu lado. Mesmo ontem, quando o Ministério da Saúde publicou uma nota que indicava a “recomendação” para a imunização contra a Covid-19 de crianças, Bolsonaro fez questão de afirmar que não vacinará sua filha Laura, de 11 anos. O presidente segue afirmando que ele próprio ainda não se vacinou.

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No início de dezembro, o mandachuva do PL, Valdemar Costa Neto, disse a um líder do PP que precisava “conversar com calma” com Bolsonaro, porque ele “precisa tomar vacina” contra a Covid-19. Apesar desse desconforto da cúpula da base aliada do governo, pessoas próximas do presidente reconhecem que ele provavelmente manterá o tom negacionista que agrada à parte mais radical do seu eleitorado.

Assim, nos últimos dias, Bolsonaro elevou os decibéis das críticas à vacinação contra a Covid-19 de crianças de 5 a 11 anos de idade. Segundo o presidente, “não está havendo morte de crianças que justifique algo emergencial”. Conforme O GLOBO mostrou, 301 crianças desta faixa etária para a vacinação morreram de Covid-19desde a chegada do coronavírus ao país, ou uma a cada dois dias.

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Aliados do presidente são céticos sobre as chances de mudar a postura de um político que costuma ignorar conselhos de moderação. Por isso, pessoas próximas a Bolsonaro apostam numa estratégia para minimizar os danos causados pelo discurso antivacina.

— A gente precisa vacinar o povo. Mesmo com toda essa situação pessoal do presidente, o Brasil é o país que mais vacinou no mundo. as famílias têm a tradição de vacinação — minimiza o senador Wellington Fagundes (PL-MT).

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O posicionamento do presidente em contradição com a visão da maioria da população sobre a vacinação, expressa tanto em pesquisas de opinião como na adesão dos brasileiros à imunização, levou aliados do próprio partido a divergir publicamente do presidente. O líder do PL no Senado, Carlos Portinho (RJ), foi explícito ao defender recentemente que a Câmara aprove o projeto de sua autoria que formaliza o passaporte da vacinação:

— É verdade que o Presidente havia anunciado o veto se esse projeto avançasse. Não tenho o menor desconforto se essa for a nossa única divergência, mas não vou deixar de insistir que esse projeto, agora, mais do que nunca, é vital — discursou Portinho no Senado, em fala compartilhada pelo PL em seu site.

PP ensaia discurso

Outro expoente do Centrão e da base de Bolsonaro, o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP-PI), também já dá o tom do que deve ser o discurso dos aliados de Bolsonaro no ano que vem. Em entrevista ao Jornal do Piauí, Ciro disse que o presidente foi, na prática, o responsável por disponibilizar vacinas contra a Covid-19:

— Não tem uma vacina do nosso país que não foi comprada pelo presidente Bolsonaro — disse, minimizando a oposição de Bolsonaro aos imunizantes, afirmando que ele apenas defende a “liberdade” de escolha da população.

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No Planalto, outros auxiliares avaliam que o discurso de Bolsonaro será encarado pela população como uma posição pessoal, sem interferir na política de vacinas. Eles reconhecem que poderia ser benéfico politicamente para o presidente abraçar a imunização, mas ele é irredutível. Antes, Bolsonaro dizia que se iria se vacinar após o último brasileiro receber sua dose. Agora, não admite mais essa hipótese.

Para reverter o desgaste da imagem do presidente, a estratégia adotada é citar que Bolsonaro jamais impediu alguém de se imunizar nem mesmo a primeira-dama Michelle Bolsonaro e os filhos.

Ao GLOBO, o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), defendeu que o discurso de Bolsonaro sobre vacinas não vai influenciar o pleito de 2022. Primeiro, segundo ele, “porque todas as vacinas foram pagas pelo governo federal”. E, segundo, por acreditar que “o assunto vacina estará superado na eleição".

Pressão sobre Anvisa

Além da questão política, a postura antivacina de Bolsonaro gera incômodos na Justiça. O ministro Ricardo Lewandowski, do STF encaminhou para a Procuradoria Geral da República (PGR) uma notícia-crime para que o presidente seja investigado por suposta intimidação de servidores da Anvisa. Bolsnaro disse que divulgaria os nomes dos diretores da agência que votaram a favor da vacinação infantil. (Colaborou Mariana Muniz)

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Na filiação, Flávio chama Lula de ex-presidiário

O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) causou um constrangimento entre os presentes ao evento de filiação dele e do pai , o presidente Jair Bolsonaro, ao PL no fim de novembro. Ao discursar, Flávio se referiu ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como “ex-presidiário”. A declaração do senador, que estava ao lado de Valdemar Costa Neto, preso por envolvimento no esquema do mensalão, causou mal-estar entre os membros do partido.

Carlos Bolsonaro apaga tuíte contra o partido

Em meio aos acertos finais da filiação de Jair Bolsonaro ao PL, o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho do presidente, apagou um tuíte antigo contra a legenda do ex-deputado federal Valdemar Costa Neto. A mensagem, publicada em 2016, foi deletada horas depois de Bolsonaro anunciar a intenção se filiar à legenda. No post, Carlos compartilhou uma reportagem sobre denúncia de propina a Valdemar e ao partido em um contrato de Furnas.

‘Se gritar pega Centrão, não fica um meu irmão’

Durante a campanha de 2018, o ministro Augusto Heleno (GSI) fez uma paródia de um samba do cantor Bezerra da Silva e insinuou que os integrantes do Centrão, do qual o PL faz parte, eram ladrões: “Se gritar pega Centrão, não fica um meu irmão”, afirmou, à época. Desde o ano passado, no entanto, Heleno mudou o discurso. Em meio ao risco de abertura de processo de impeachment, o general disse que a provocação se tratava de uma “brincadeira”.

Vice-presidente da Câmara se desfilia do PL

Com a filiação de Bolsonaro ao PL, o vice-presidente da Câmara, deputado federal Marcelo Ramos, anunciou que deixaria o partido diante das divergências políticas com o presidente. Ramos solicitou a sua desfiliação da sigla ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para não perder o mandato por infidelidade partidária. Na última semana, o ministro Luís Roberto Barroso concedeu uma liminar e assegurou o direito do parlamentar se desfiliar da legenda.

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