O presidente Jair Bolsonaro (PSL) Foto: MAURO PIMENTEL / AFP

Da política ao social: os desafios do governo de Jair Bolsonaro

O GLOBO ouviu especialistas e integrantes da campanha do presidente para construir um panorama dos próximos quatro anos em dez áreas

por O Globo

RIO — Ao ser empossado nesta terça-feira como Presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL) precisará enfrentar desafios em diversas áreas estratégicas para o país. O GLOBO ouviu especialistas e integrantes da equipe do novo Chefe do Executivo para construir um panorama de expectativas em dez delas. O discurso forte sobre a questão da segurança que permeou a campanha deve nortear muitas ações do presidente nos próximos quatro anos. Na semana passada, Bolsonaro já declarou que pretende ampliar o posse de armas por meio de um decreto. A presença maior de representantes das Forças Armadas no poder — 6 dos 22 ministros — também é novidade em comparação com governos anteriores. Há também a urgência de encontrar soluções para a crise econômica, discutindo, por exemplo, a Reforma da Previdência, que depende de negociações com um Congresso repaginado. Já no campo social, especialistas temem que o novo governo possa representar retrocessos em questões como meio ambiente e direitos humanos.

Política
por Paulo Celso Pereira e Eduardo Bresciani

BRASÍLIA — Eleito na esteira da insatisfação com as velhas práticas políticas que converteram o Congresso em reduto de investigados por corrupção, Jair Bolsonaro chegou ao Planalto demonizando a política, os partidos e regras consagradas do jogo parlamentar. Agora, terá de governar com as forças que atacou. Experientes congressistas ouvidos pelo GLOBO, ao longo da última semana, projetam dois momentos na relação do futuro presidente com o Parlamento. Desprezando as cúpulas partidárias, ele tentará implementar sua agenda legislativa com novatos e setores periféricos da Câmara e do Senado. Poderá até dar certo no início, enquanto durar a lua de mel com o eleitor. No longo prazo, porém, as dificuldades para implementar reformas impopulares submeterão o presidente ao poder inexorável da realidade.

A sensação no mundo político é que pautas caras ao presidente eleito e que têm popularidade atestada em pesquisas, como a flexibilização do Estatuto do Desarmamento e a redução da maioridade penal, devem ser tocadas adiante de forma mais ágil. As dificuldades estarão nas pautas econômicas. Apontada por especialistas como urgente, a reforma da Previdência é tida como o grande desafio para o governo.

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Educação
por Antônio Gois

RIO — Pressionado durante o segundo turno, Jair Bolsonaro deu algumas declarações amenizando o tom de falas suas ou de aliados em temas econômicos, políticos e ambientais. Isso, porém, não aconteceu na educação. As propostas mais repetidas pelo presidente durante a campanha foram “expurgar a ideologia de Paulo Freire ” das escolas e cursos de formação de professores, priorizando o ensino de “matemática, ciências e português, sem doutrinação e sexualização precoce”. Pautas polêmicas que certamente vão gerar debates ainda mais intensos à medida que o governo tente colocá-las em prática.

O caminho para promover mudanças profundas na educação brasileira não é tão simples. Presidentes no auge de sua popularidade, em momentos de expansão econômica e com sólida base no Congresso Nacional (casos de Fernando Henrique em seu primeiro mandato e de Lula em seu segundo), tiveram dificuldade para aprovar políticas estruturantes no setor.

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Forças Armadas
por Vinicius Sassine

Os militares passaram a reviver um protagonismo no Executivo antes mesmo de chegarem ao Palácio do Planalto pelas urnas. Fraco e impopular, o ex-presidente Michel Temer abriu espaços para os generais, dentro do Planalto e à frente do Ministério da Defesa, que saiu das mãos de um civil de maneira inédita. Com o capitão Jair Bolsonaro (PSL) e o general Antônio Hamilton Mourão (PRTB) no poder, o protagonismo dos militares deve crescer.

Segundo o grupo que planeja as ações do governo Bolsonaro, as Forças Armadas devem intensificar sua atuação em operações de garantia da lei e da ordem (GLOs); aumentar a presença em áreas distintas da defesa, como saúde, educação e infraestrutura; e tentar dar mais efetividade a projetos tidos como prioritários, mas que esbarram em falta de dinheiro.

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Política Externa
por Claudia Antunes / Henrique Gomes Batista, correspondente

A julgar por declarações da campanha, a política externa sob a liderança de Jair Bolsonaro poderá ser a mais alinhada aos EUA desde o governo do marechal Humberto Castelo Branco , o primeiro depois do golpe de 1964 , avaliaram analistas e diplomatas. Essa orientação decorreria menos de cálculos estratégicos do que da associação que Bolsonaro e sua equipe buscaram com o ideário de Donald Trump , em especial no que diz respeito à desconfiança das instituições multilaterais.

O general Augusto Heleno Pereira que assume o Gabinete de Segurança Institucional já declarou ao GLOBO que as relações com os EUA “podem melhorar”, e criticou a “prevenção enorme” da esquerda com a superpotência. Em outubro, o presidente do PSL, Gustavo Bebbiano, disse que a OEA tem “zero credibilidade”, e que a ONU tem “viés esquerdista, globalista”.O embaixador Ernesto Araújo, diretor do Departamento de EUA, Canadá e Assuntos Interamericanos do Itamaraty, foi escolhido para o cargo de ministro das Relações Exteriores.

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Saúde
por Ana Lucia Azevedo e Renata Mariz

A saúde, maior preocupação declarada dos brasileiros em pesquisas e o segundo maior orçamento da União (R$ 130,8 bilhões este ano), permanece uma incógnita. Em seu plano de governo e em entrevistas e posts nas redes sociais, o presidente eleito Jair Bolsonaro propôs medidas genéricas.

Na essência, a afirmação de não aumentar os recursos, porém fazer mais com a melhoria na gestão e o combate da corrupção. O governo eleito pretenderia investir, num primeiro momento, em auditorias e levantamento detalhado de dados para identificar onde há subfinanciamento, mas também onde há desperdícios, segundo colaboradores da campanha.

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Economia
por Luciana Rodrigues e Martha Beck

Nos dois discursos de ontem, o presidente Jair Bolsonaro evitou entrar em detalhes concretos sobre sua agenda econômica. Analistas são unânimes em afirmar que, para retomar o crescimento econômico mais vigoroso e permitir que o Brasil volte a gerar emprego — há 12,7 milhões de desempregados —, o primeiro passo é tirar o país da insolvência fiscal em que se encontra. Para isso, a reforma da Previdência é a agenda prioritária.

Por enquanto, ainda não se conhece detalhes da proposta de reforma que o time liderado pelo ministro da Economia Paulo Guedes enviará ao Congresso Nacional. O regime de aposentadorias fechou em 2017 com rombo de R$ 269 bilhões. O montante do ano passado deve apresentar um crescimento de mais de 6%.

Uma das ideias citadas na campanha é criação de um regime de capitalização para a Previdência. Hoje, o país adota o modelo de repartição — no qual trabalhadores da ativa custeiam a aposentadoria dos mais velhos. Na capitalização, cada trabalhador teria a sua própria poupança e esses recursos, no futuro, garantiriam sua aposentadoria.

O problema é como fazer a transição, ou seja, como migrar os novos trabalhadores para a capitalização e bancar a aposentadoria de quem hoje depende do regime de repartição — conta que pode chegar a R$ 100 bilhões.

A equipe de Bolsonaro endossa a ideia de que é preciso preservar o teto dos gastos públicos. Hoje, mais de 90% das despesas são obrigatórias. O teto de gastos, criado por Temer em 2016, prevê que, por 20 anos, as despesas do governo ficarão congeladas, ou seja, só poderão subir no mesmo ritmo da inflação.

Por enquanto, Jair Bolsonaro tem afirmado que as suas primeiras medidas terão como objetivo desburocratizar o Estado.

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Cultura
por Emiliano Urbim e Alessandro Giannini

Ao longo da campanha, Bolsonaro pouco falou em cultura, área ignorada em seu programa de governo. Quando o presidente tocou no tema, prometeu cortar recursos da área, revendo a Lei Rouanet , e sinalizou o fim do Ministério da Cultura, que deve virar uma secretaria do Ministério da Educação.

Diante desse cenário, nomes de destaque do setor especulam até que ponto as promessas de Bolsonaro serão postas em prática. Outros projetam como lidar com um governo cujos líderes já se posicionaram contra várias manifestações artísticas.

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Meio Ambiente
por Ana Lucia Azevedo

O Brasil amanhece com uma incógnita sobre a política do novo governo não apenas para a maior floresta tropical do planeta, mas sobre a condução dos processos de licenciamento e fiscalização de empreendimentos do porte de usinas nucleares, minas de ferro e plataformas de petróleo. O meio ambiente recebeu poucas linhas no plano de governo e muita polêmica durante a campanha.

Durante a campanha, houve incerteza sobre a fusão dos ministérios do Meio Ambiente (MMA) e Agricultura (Mapa), que terminou por não ser efetivada. Caso fosse, estariam no escopo deste último, por exemplo, exploração de urânio e lixo industrial. A decisão também criaria criaria uma bipolaridade na governança, já que o papel do Mapa é estimular e o do MMA fiscalizar e controlar. O novo governo já tem, na própria bancada ruralista, um leque de opções para comandar a agricultura. Resta a definição do perfil de quem estará à frente das ações ambientais.

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Segurança Pública
por Renata Mariz e Marco Grillo

Eixo principal do discurso que levou Jair Bolsonaro (PSL) à vitória de ontem, a Segurança Pública deve ser a agenda principal dos primeiros cem dias de sua gestão. O presidente eleito deve turbinar o controle de fronteiras, dando protagonismo às Forças Armadas, que já participam da atividade, ao mesmo tempo em que reforçará com a medida o discurso de combate ao crime organizado. Em outra frente, a tentativa de implementar uma agenda pró-armamentista e de endurecimento da legislação penal será um teste para o governo.

A chamada excludente de ilicitude para policiais em serviço, dando a garantia de que não serão investigados caso matem no curso de operações, é outra bandeira, mas conselheiros da campanha alertam para a dificuldade de aprovação rápida no Congresso.

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Sociedade
por Eduardo Graça

Numa eleição marcada por forte polarização , menos pânico e mais foco na busca de novas formas de atuação para enfrentar um embate inevitável. Lideranças de direitos humanos ponderam ser difícil estabelecer estratégias de ação específicas quando não foram apresentadas durante a campanha propostas concretas para o setor pelo novo presidente. Mas frases de efeito como a de que irá “botar um ponto final em todo ativismo no Brasil” confirmaram o que já era dado como certo: pela primeira vez desde os anos 1990, instituições de defesa dos direitos de mulheres, negros, LGBTs, indígenas, presos, entre outros, não encontrarão em Brasília interlocução interessada no avanço de pautas progressistas .

— Não comungo da ideia de que o discurso de palanque raivoso e bravatas de ocasião são um tique de Jair Bolsonaro. Seu discurso ferozmente discriminatório já empoderou e legitimou vozes misóginas, racistas, autoritárias, homofóbicas e extremamente violentas — diz a vice-presidente da ONG Grupo Arco-Íris, Marcelle Esteves, voltado para a cidadania LGBT. — Faremos denúncia sistemática de agressões e incrementaremos parcerias com grupos como de policiais antifascistas.

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