Em sabatina dos jornais O GLOBO e Valor e da rádio CBN, nesta segunda-feira, Ricardo Nunes (MDB), atual prefeito e candidato à reeleição em São Paulo, reforçou o apelo ao "voto útil" para enfrentar Guilherme Boulos (PSOL) no segundo turno, repudiou a agressão de Datena (PSDB) contra Pablo Marçal (PRTB) no debate da TV Cultura, mas destacou as provocações do ex-coach, e afirmou que a cidade "não precisa" de um órgão específico para tratar de políticas sobre a qualidade do ar. O prefeito ainda se esquivou da responsabilidade sobre os contratos com concessionárias de ônibus que são suspeitas de lavar dinheiro para o crime organizado.
Veja como foi a entrevista:
— Ele chegou e já anunciou, já foi de má-fé, e a forma, eu estava ali do lado do Pablo Marçal, e a forma como ele coloca as palavras... Usou essa palavra e perguntou se ele tinha feito um gesto muito difícil. (Marçal perguntou se Datena havia tocado na vagina da mulher que o acusou de assédio). Por que eu estou comentando isso? Nada justifica o que o Datena fez, mas o nível que ele fez aquela preocupação, conseguir tirar uma pessoa que é um âncora de tantos anos daquela forma, é algo pra reflexão. Uma pessoa como essa que leva as pessoas ao desequilíbrio emocional dessa forma não tem a mínima condição de estar na política — falou Nunes.
O emedebista desconversou, no entanto, sobre episódios em que ele mesmo desferiu ataques a adversários. Nunes foi questionado se também não usou de provocações e fake news ao perguntar para Boulos, durante o debate, se ele estava “cheirado”. O prefeito afirmou que “é preciso separar o que é ação e reação” e justificou que tem sido vítima de “fake news de Boulos”, que estaria “criando matérias e mandando para o Ministério Público”.
— Você nunca vai ver na minha ação que eu agredi alguém, mas na reação. Quando a pessoa vem com uma pergunta, ‘eu tô subindo, eu tô não sei o que’, que o Ministério Público investigou e arquivou. A minha história de vida é absolutamente limpa, eu nunca tive um indiciamento, uma condenação. O que o seu Guilherme Boulos foi falar? Ele foi falar negócio de isca para dengue, ele fica falando isso, de que a gente teria adquirido isca para dengue mais cara e que o Ministério da Saúde estaria vendendo por dez reais. Eu mandei um ofício para o Ministério da Saúde e a resposta foi que eles não vendem, não existe isso. Eu estou sendo vítima de fake news por Guilherme Boulos — destacou Nunes, que ainda afirmou que não tem “sangue de barata”.
Associação a Bolsonaro
Nunes negou que tenha evitado se associar a Jair Bolsonaro (PL) antes da chegada de Marçal na disputa, que ganhou apelo entre os eleitores do ex-presidente. O prefeito só aceitou a indicação do coronel da reserva da polícia militar Ricardo Mello Araújo (PL) como candidato a vice na chapa depois que o apoio de Bolsonaro ficou ameaçado. O emedebista também passou recentemente a adotar uma retórica mais agressiva nas redes sociais, o que foi lido como uma reação ao crescimento do ex-coach nas pesquisas.
— A minha ação sempre foi a mesma desde o início, de poder unir o centro e a direita contra a extrema-esquerda e de trazer os partidos para uma grande frente ampla — declarou o candidato.
Nunes reforçou na sabatina a tese do “voto útil” contra o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL), que tem sido a principal aposta da sua campanha para garantir lugar no segundo turno. Um de seus principais aliados, o governador paulista, Tarcísio de Freitas (Republicanos), apareceu na propaganda eleitoral de TV dizendo que Marçal seria a “porta de entrada” para o psolista chegar à prefeitura. Para Nunes, está “claro, óbvio e nítido” que Boulos prefere chegar ao segundo turno contra Marçal.
Qualidade do ar
Na semana passada, São Paulo ficou por três dias consecutivos com o pior ar do mundo. Nunes disse que não é necessário um novo órgão e citou a Secretaria Municipal de Mudanças Climáticas.
— Não precisa. Eu tenho a Secretaria Municipal de Mudanças Climáticas, que faz a articulação de todas as políticas de meio ambiente, do ar, da água, todas. Só existem três secretarias municipais de Mudanças Climáticas no mundo, e São Paulo é uma delas. Eu saí de 48% para 54% de cobertura vegetal, estou ampliando a área de mata, é uma área do tamanho de Paris — afirmou.
Empresas de ônibus investigadas
O prefeito discutiu com a colunista Maria Cristina Fernandes, do Valor e da CBN, quando ela lhe questionou se ele não deveria feito uma fiscalização maior sobre as empresas que operam ônibus na capital e que são investigadas pelo Ministério Público de São Paulo (MPSP) por suspeitas de envolvimento com o crime organizado. O prefeito disse que os contratos com as empresas foram feitos “na gestão do PT, da Marta (Suplicy)”, e chamou o questionamento da jornalista de “irresponsável”.
Em abril, uma operação do MPSP apontou elo entre empresas que operam ônibus na capital com a facção Primeiro Comando da Capital (PCC). O esquema de lavagem de dinheiro do crime organizado envolve duas empresas de ônibus, a UPBus e a Transwolff (TW), que transportam quase 700 mil pessoas por dia e receberam quase R$ 800 milhões em remuneração da prefeitura. No dia seguinte à operação do MP, em abril, Ricardo Nunes parabenizou a UPBus pelo serviço prestado. As duas empresas estão sob intervenção municipal, e os sócios foram afastados até o fim das investigações. A UPBus e a Transwolff passaram a operar ônibus na capital por meio de contrato firmado em 2019, na gestão Bruno Covas, de quem Nunes herdou o mandato. O contrato de concessão é de 30 anos.
— Eu assinei algum contrato? Aqui não é um debate que tá Pablo Marçal falando essas loucuras — falou o prefeito. — Quem fez esses contratos emergenciais com essas empresas foram as gestões do PT, quando chega na gestão do Bruno Covas, foi feita uma licitação, as empresas participam e apresentam as documentações que estão previstas em lei.
O prefeito disse que, há dois anos, pediu para que a a procuradora-geral do município, Marina Magro, fosse ao MPSP e pedisse “celeridade nas investigações” sobre essas duas empresas. Entretanto, o promotor do Gaeco do MPSP, Licoln Gakiya, afirmou ao Fantástico em abril que houve “negligência” da prefeitura no controle dos contratos com as empresas investigadas e sugeriu que “uma pesquisa rápida no Google” poderia ter indicado ao poder público a relação de sócios dessas empresas com o PCC.
— Não tem nada disso que você está falando. Quem fez a intervenção fui eu, fui eu que abri o procedimento, eu que afastei essas pessoas das empresas, essa conversa de que ‘ah, a pessoa dava um Google’, isso é conversa de pessoa irresponsável. Porque foi feita uma licitação. Eu estou a 20 dias da eleição, eu quero deixar registrado que é irresponsável uma afirmação dessa, e eu repudio — falou Nunes.
Eletrificação de ônibus
Nunes alegou que a indústria não tem disponibilidade de ônibus elétricos para fazer uma substituição mais rápida da frota em São Paulo. Em maio, dos 12.019 veículos em operação, 380 eram elétricos. O número está distante da meta da prefeitura, que era de fazer a troca de 20% dos modelos até o final de 2024, o equivalente a 2.403.
— Está andando. Se você me falar onde tem dois ônibus elétricos para vender, só me dar o endereço — declarou ele.
Segundo o prefeito, seria mais vantajoso fazer a compra diretamente pela gestão municipal do que obrigar as empresas a fazerem a troca, o que demandaria uma taxa de retorno de investimento de 9%. Para tanto, a prefeitura obteve empréstimos de R$ 2 bilhões com o BNDES e o Banco Mundial, o que custearia cerca de 1,3 mil unidades, pouco mais de 10% da frota.
— Não adianta ter R$ 5 bilhões se a indústria não tem para fornecer. As coisas precisam andar paralelamente. Tudo o que a indústria produzir, vamos adquirir.
A estimativa oficial é que os 7 milhões de carros em circulação na capital paulista respondem por 64% da emissão de dióxido de carbono, e a metade disso se refere aos ônibus e caminhões a diesel.
Sobre os carros particulares, Nunes indicou que não há uma proposta nesse sentido, apenas “exemplos de dentro para fora”, como a aquisição de 50 caminhões semi elétricos para coleta de lixo. Ele descartou, por exemplo, ações como pedágio urbano, ampliação do rodízio e reforço na inspeção veicular.
Resultado do Ideb
O prefeito admitiu na sabatina de O GLOBO, Valor e CBN que as notas do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) em São Paulo, cidade mais rica do país, estão abaixo do esperado.
Os alunos dos anos iniciais, em prova aplicada no quinto ano do ensino fundamental, tiveram uma queda para 5,6, ficando em 14º lugar entre as capitais e abaixo da média de 5,7. Já nos anos finais, em prova aplicada no nono ano, o resultado ficou estagnado em 4,8, o que equivale ao 11º lugar entre as capitais, mas acima da média de 4,6.
— Eu estou sempre insatisfeito. Tenho uma visão de que a gente sempre tem que estar melhorando — disse Nunes, para logo introduzir números positivos para a gestão, como a fila zerada de creches. — Isso faz uma diferença enorme. A criança quando está na barriga da mamãe até os sete anos é quando a criança desenvolve o cérebro.
Nunes prometeu universalizar a taxa de alfabetização na cidade, que hoje está em 89%, pelos números oficiais, e chegar ao final de um eventual segundo mandato com a melhor média do Ideb. Ele também justificou o desempenho abaixo da meta como um reflexo da pandemia de covid-19, quando as escolas ficaram fechadas por meses para conter a transmissão do coronavírus.
Remoção de favela
Nunes prometeu remover a favela do Moinho, que fica na região central, em parceria com o governo estadual. Reportagem do GLOBO mostrou que o local vai abrigar uma nova estação de trem. A comunidade foi alvo de investigação pelo Ministério Público, por abrigar traficantes como o Leo do Moinho. Segundo as apurações, o local serviria para estocar drogas que são distribuídas para a cracolândia.
— A favela do Moinho virou um bunker do tráfico, tem controle de acesso na entrada. Essa última operação do Ministério Público, em conjunto com a prefeitura e com o governo do estado, identificou o Leo do Moinho e a Janaína do Moinho. Existe a necessidade que você retire aquilo dali, porque a questão geográfica, os muros, propiciam que o tráfico ali seja feito, tanto é que tem um local ali que era feito o refino de drogas. O atendimento da prefeitura acontece para todos, mas é estratégico que a gente tire aquela favela dali — falou.
Segundo Nunes, a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), empresa estadual, já começou a fazer o cadastro de moradores da favela para entrarem na fila de habitação, mas disse que se houver resistência, haverá ação de reintegração de posse.
— As pessoas que de forma pacífica entenderem que precisam fazer o cadastro e que o estado e a prefeitura lhes darão provimento habitacional, ótimo. Aquelas que não aceitarem, nós vamos entrar com ação de reintegração de posse e vamos tirar, de qualquer jeito, o Tarcísio e eu vamos acabar com aquilo, mas não vamos deixar o local aberto porque se não depois eles acabam invadindo de novo — acrescentou.
As sabatinas
Esta é a primeira sabatina do GLOBO, CBN e Valor Econômico com candidatos à prefeitura de São Paulo. Na quarta-feira, será a vez de José Luiz Datena (PSDB) e, na quinta, a de Tabata Amaral (PSB). Já na próxima semana, no dia 23, é Pablo Marçal (PRTB) quem será entrevistado, seguido de Guilherme Boulos (PSOL) no dia 24.
As entrevistas com os candidatos em São Paulo terão transmissão ao vivo pela rádio e nos sites e redes sociais dos três veículos. Elas terão início sempre às 10h30 (horário de Brasília), com duração aproximada de uma hora. A cobertura, no site e na edição impressa do GLOBO, contará com reportagens e análises de cada entrevista.
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A ordem das sabatinas foi definida por sorteio, mas as datas precisaram sofrer ajustes por causa da agenda de debates. Foram chamados os cinco candidatos mais bem colocados na última pesquisa eleitoral de São Paulo divulgada pelo instituto Datafolha.
Segundo o Datafolha mais recente, divulgado no último dia 12, Nunes tem 27% das intenções de voto e agora está tecnicamente empatado apenas com o deputado federal Guilherme Boulos, que soma 25%. Marçal aparece destacado do atual prefeito, com 19% das menções, tecnicamente empatado no limite da margem de erro com o psolista. Tabata é a quarta colocada na disputa, com 8%, e Datena obteve 6%.
As sabatinas representam uma oportunidade para que os candidatos detalhem propostas para a cidade, e também para que sejam questionados sobre diferentes aspectos de suas atuações políticas. Os entrevistadores dos candidatos de São Paulo serão as colunistas Vera Magalhães e Malu Gaspar, do GLOBO e da CBN, os âncoras da rádio Débora Freitas e Fernando Andrade, e a colunista Maria Cristina Fernandes, do Valor e da CBN.
Na semana passada, foram entrevistados os três candidatos mais bem colocados nas pesquisas na eleição do Rio: Eduardo Paes (PSD), Tarcísio Motta (PSOL) e Alexandre Ramagem (PL). Antes, os candidatos à prefeitura de Belo Horizonte também passaram pela sabatina: Mauro Tramonte (Republicanos), Fuad Noman (PSD), Bruno Engler (PL), Duda Salabert (PDT) e Carlos Viana (Podemos).
Estratégias
Ao longo da campanha, Nunes tem apostado em destacar entregas que fez durante a gestão para mostrar ao eleitor a importância da continuidade, tanto é que tem como slogan “caminho seguro para São Paulo”. Por um lado, ele tenta antagonizar com Boulos, a quem chama de “extrema-esquerda”, e por outro briga com Marçal pelo eleitorado da direita. Ele tem o apoio formal de Jair Bolsonaro (PL), mas o ex-presidente ainda não fez eventos de campanha com Nunes.
Boulos, por sua vez, busca pela segunda vez se eleger prefeito da capital (em 2020, chegou ao segundo turno, mas saiu derrotado por Bruno Covas), e aposta no apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para conquistar o eleitor. Já Marçal avançou no eleitorado da direita, especialmente entre os apoiadores de Bolsonaro, e investe em um discurso conservador, na defesa da livre iniciativa e em sua força nas redes sociais para derrotar o que chama de “adversários comunistas”.
Tabata e Datena buscam se colocar como alternativa à polarização dos candidatos de Lula e de Bolsonaro, a primeira com pautas focadas especialmente na melhoria da educação e o segundo com enfoque na segurança pública.
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