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Política

Empresa de ex-mulher do advogado Frederick Wassef obteve aditivos do governo Bolsonaro

Consórcio Protec, do qual a Globalweb Outsourcing faz parte, ganhou duas extensões contratuais com a Ebserh, vinculada ao MEC, já no governo Bolsonaro mesmo após auditoria da CGU apontar sobrepreço
Prédio em que funciona a sede da Ebserh em Brasília Foto: Reprodução
Prédio em que funciona a sede da Ebserh em Brasília Foto: Reprodução

RIO — A Globalweb Outsourcing, empresa ligada a Maria Cristina Boner Léo, ex-mulher do advogado Frederick Wassef, obteve dois aditivos durante a gestão do presidente Jair Bolsonaro em um contrato firmado com a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) e questionado pela Controladoria-Geral da União (CGU). A Ebserh, vinculada ao Ministério da Educação (MEC), é responsável pela gestão de hospitais universitários federais. Um auditoria da CGU apontou prejuízo na ata de preços em que se baseou o contrato. Após os aditivos, o valor final chegou a R$ 37,4 milhões, segundo o Portal da Transparência. As empresas negam irregularidades.

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Cristina é uma das fundadoras da empresa, hoje administrada por uma de suas filhas, Bruna Boner. A ex-mulher de Wassef, ex-advogado da família Bolsonaro, ficou impedida de participar de contratações do governo após ser condenada na Operação Caixa de Pandora, em 2019. Há duas semanas, porém, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF) anulou a condenação de Cristina por improbidade administrativa. O subprocurador-geral do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (MP/TCU), Lucas Rocha Furtado, pediu que a corregedoria do TJ-DF investigue “se foi mera coincidência ou casuísmo” a definição da data de julgamento do recurso de Cristina. A absolvição ocorreu um dia após o MP pedir investigação sobre contratos firmados pela Globalweb com o governo federal e sobre a suspensão de uma multa de R$ 27 milhões com a Dataprev.

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O consórcio Protec firmou contrato com a Ebserh em março de 2017 para desenvolvimento de softwares, no valor de R$ 9,9 milhões, e obteve um primeiro aditivo pelo mesmo valor no início de 2018, ainda no governo de Michel Temer. O aditivo coincidiu com a entrada da Globalweb no consórcio, ao lado da Liberty Comércio e Serviços, e com a saída da Infosolo Informática e da Basis Tecnologia da Informação. À época, a Protec era alvo de apuração da CGU por um contrato firmado em novembro de 2016 com o Ministério das Cidades. Uma auditoria publicada em julho de 2018 constatou que a ata de registro de preços elaborada pela Protec, e utilizada nos contratos com o Ministério das Cidades e também com a Ebserh, se encontrava “em patamar muito superior quando comparado com licitações semelhantes”, o que levou a um prejuízo estimado na casa de R$ 4 milhões à União. O contrato com o Ministério das Cidades seria destinado ao desenvolvimento da plataforma do Cartão Reforma, programa social lançado por Temer através de medida provisória e que foi cancelado após denúncias de irregularidades.

O contrato da Protec com a Ebserh foi firmado com base na mesma ata de registro de preços. Com a empresa de Cristina Boner no consórcio, a Protec conseguiu mais dois aditivos, já no governo Bolsonaro e após o alerta da CGU em relação aos valores praticados. O primeiro desses aditivos, em 19 de março de 2019, foi publicado no Diário Oficial quatro dias após o governo federal suspender a cobrança de uma multa de R$ 27 milhões devida por outro consórcio, o MG2I, do qual a Globalweb também é integrante. O caso, revelado pelo GLOBO, diz respeito a um contrato com a Dataprev, vinculada ao Ministério da Economia. Após a reportagem, o MP/TCU pediu que o caso fosse comunicado ao Ministério Público Federal (MPF) para investigação de eventual tráfico de influência e advocacia administrativa.

Em março deste ano, o consórcio Protec conseguiu novo aditivo de seu contrato com a Ebserh, agora com validade de três meses, até 18 de junho de 2020. Embora com duração menor, o aditivo foi estimado em R$ 8,9 milhões, pouco abaixo dos R$ 9,5 milhões que haviam sido orçados pela extensão anterior, que durou um ano. As publicações no Diário Oficial dos dois aditivos mostram que a ata de preços criticada pela CGU continuou sendo utilizada como parâmetro.

Há duas semanas, o portal Uol revelou que a empresa de Cristina Boner obteve individualmente — isto é, sem somar os consórcios que integra — R$ 239 milhões em contratos novos e aditivos no atual governo. Na representação em que pede a investigação sobre os contratos, o subprocurador-geral Lucas Rocha Furtado argumentou que o “aumento considerável” no volume de pagamentos recebidos pela Globalweb “levanta suspeitas quanto à eventual prática de tráfico de influência” pelo fato de a empresa estar vinculada, "ainda que de forma indireta", à ex-mulher de Wassef.

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Outro lado

Procurado, o consórcio Protec classificou como “esdrúxulo”o relatório da CGU e alegou que o órgão adotou “critérios pessoais e sem qualquer justificativa metodológica”. A Protec argumenta que o TCU reconheceu em outro procedimento que “existe uma variação enorme no valor do ponto de função”, unidade de medida adotada para avaliar desenvolvimento de softwares. A Globalweb Outsourcing — representando Cristina Boner — disse que não se manifestaria, uma vez que não é a empresa titular do consórcio. O advogado Frederick Wassef também não se posicionou após ser questionado pelo GLOBO.

A Ebserh informou que sabia da avaliação da CGU, mas que os aditivos foram feitos “em caráter excepcional”, enquanto uma nova licitação não é concluída. A empresa alegou ainda que os aditivos representam apenas um “valor máximo” para um contrato cuja execução é sob demanda. E que novo aditivo, assinado no último dia 18, permite o encerramento do contrato com o consórcio assim que a nova licitação for finalizada.