RIO — Quatro funcionários do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos- RJ) já disseram à revista ÉPOCA e ao GLOBO que não trabalhavam no gabinete dele na Câmara do Rio, mesmo tendo sido nomeados e com os salários em dia. O Ministério Público do Rio investiga suspeita de funcionários fantasmas e esquema de rechadinha no gabinete do vereador, que teve os sigilos bancário e fiscal quebrados .
A investigação do MP começou a partir de reportagem da Época de junho de 2019, que revelou que o vereador empregou a madrasta Ana Cristina Valle, ex-mulher do presidente Jair Bolsonaro, e mais sete familiares dela. Dois admitiram à reportagem nunca ter trabalhado na Câmara.
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Um dos alvos da investigação do MP é a situação de Marta Valle — professora e cunhada de Ana Cristina. Moradora de Juiz de Fora (MG), ela passou sete anos e quatro meses lotada no gabinete de Carlos, entre novembro de 2001 e março de 2009. Segundo a Câmara de Vereadores, Marta nunca teve crachá para liberação da entrada na Casa. Além disso, abordada por Época, disse que não havia trabalhado no gabinete .
“Não trabalhei em nenhum gabinete, não. Minha família lá que trabalhou, mas eu não", disse ela em 2019 à reportagem da Época. "Não fui eu, não. A família de meu marido, que é Valle, que trabalhou”, acrescentou.
Diante da resposta, a reportagem insistiu, perguntando se ela mesma não havia trabalhado. Pela terceira vez, ela disse que não. Ao lhe ser perguntado se sabia, então, que havia sido nomeada, ela disparou: “Mas logo em seguida já me tiraram do cargo”.
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Outro caso descoberto foi o de Gilmar Marques, ex-cunhado de Ana Cristina e morador de Rio Pomba (MG), a 274 quilômetros do centro do Rio, onde ele deveria dar expediente. Marques é um pequeno empresário e representante comercial na área farmacêutica. Assim como Marta, ele demonstrou surpresa ao ser questionado sobre o tempo em que aparecia lotado na Câmara Municipal carioca.
Em conversa por telefone, a reportagem indagou a Marques se ele se recordava do gabinete em que havia trabalhado para Carlos Bolsonaro e o que fazia. Ele disse inicialmente que não se recordava. Depois, outra vez indagado sobre o assunto, perguntou à reportagem se não havia algum engano em relação ao nome dele. A conversa seguiu sem que Marques também se recordasse sobre o salário que recebia.
“Meu Deus do céu. Ah, moça, você está me deixando meio complicado aqui. Eu ganhava? Isso aí você deve estar enganada”, disse.
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Questionado sobre como é possível trabalhar no Rio, no gabinete de um vereador, e morar em Minas Gerais, ele disse: “Ah, moça, estou meio por fora disso”. Sobre a possibilidade de ter devolvido dinheiro do salário para o vereador, ele comentou simplesmente: “Estou por fora disso”. No momento em que foi questionado sobre se sabia que havia sido nomeado, Marques desligou o telefone.
Outro funcionário nomeado no gabinete de Carlos diisse que não trabalhou lá: Rafael é filho de outro funcionário do vereador, o sargento da reserva do Exército Edir Barbosa Góes, que também conseguiu cargos para a esposa Neula, a irmã Nadir e o outo filho, Rodrigo.
Em 2019, o GLOBO falou com Rafael, que é nutricionista, e questionou se ele havia trabalhado na Câmara Municipal. Rafael disse que “não” . Dias depois, confrontado outra vez com a informação, disse que “estava na correria” e mandou a reportagem falar com o atual chefe de gabinete. Em abril, o jornal “Folha de S. Paulo” já havia revelado que Nadir, mesmo nomeada no gabinete de Carlos entre 2008 e janeiro deste ano, disse que jamais trabalhara para o vereador.
Da mesma forma, Diva da Cruz Martins, lotada no gabinete entre fevereiro de 2003 e agosto de 2005 com salário bruto médio de R$ 9 mil , negou ter trabalhado na Câmara , ao ser questionada pelo GLOBO.
— Não. Nunca.
Ao ser informada que seu nome constava entre os assessores, reagiu com ironia:
— Que bom que aparece (o nome) — finalizou, entrando em casa.