Durante a cerimônia de posse do ministro Luís Roberto Barroso como presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), nesta quinta-feira, coube a Gilmar Mendes uma declaração em nome dos integrantes da Corte. Os dois magistrados têm um histórico de conflitos públicos no Supremo, com direito a um bate-boca em 2018 no qual Barroso chamou o colega de "pessoa horrível" — o substituto da ministra Rosa Weber no comando do tribunal, no entanto, vinha tentando se reaproximar de Gilmar nas semanas que antecederam a posse, como mostrou O GLOBO.
Por tradição, a fala que representa o conjunto da Corte na chegada de um novo presidente cabe ao membro mais antigo, o chamado "decano". Em junho, Gilmar completou 21 anos como integrante do STF. Ele foi nomeado em 2002, pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso. Apesar dos atritos no passado, Gilmar foi generoso nos elogios a Barroso nesta quinta-feira.
— O destino não poderia ter sido mais generoso com a nossa República. A posse de vossa excelência na presidência desta Suprema Corte representa galardão que coroa uma carreira jurídica de excelência — afirmou o decano, antes de continuar e encerrar com um singelo "seja feliz": — Somos abençoados com a posse do Barroso — disse.
Em seu próprio discurso, o novo presidente do STF agradeceu:
— Ministro Gilmar Mendes, agradeço honrado sua bela oração em nome da Corte e as palavras generosas a mim dirigidas que guardarei no coração.
A troca de gentilezas segue roteiro bem diferente ao de março de 2018, quando o plenário julgava uma ação sobre doações eleitorais. Em uma indireta ao colega, o hoje decano criticou o que chamou de “manobras” dos ministros para conseguirem resultados de seu interesse na Corte, “dando uma de espertos”. O comentário fazia referência a um voto de Barroso na Primeira Turma que revogava a prisão preventiva de médicos e funcionários de uma clínica de aborto.
— Me deixa de fora do seu mau sentimento. Você é uma pessoa horrível. Uma mistura do mal com atraso e pitadas de psicopatia. É muito penoso para todos nós ter que conviver com vossa excelência — reagiu Barroso na ocasião.
— Vou recomendar ao ministro Barroso que feche o seu escritório de advocacia — retrucou Gilmar.
Um ano antes, Barroso já havia acusado o colega de ter “parceria com a leniência”. O decano retrucou dizendo que não é “advogado de bandidos internacionais”, em referência à atuação de Barroso como defensor do terrorista italiano Cesare Battisti, quando ainda exercia a advocacia.
Já em abril de 2021, época em que os julgamentos ocorriam de maneira virtual em razão da pandemia, os dois ministros divergiram na sessão em que a Corte analisava a suspeição do ex-juiz Sergio Moro no processo do triplex do Guarujá, que tinha o então ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como réu. Barroso afirmou que Gilmar Mendes havia "sentado em cima de um pedido de vista por dois anos", e o decano rebateu afirmando que o "moralismo é a pátria da imoralidade".
Como parte dos preparativos para assumir a presidência do STF, contudo, Barroso buscou conselhos dos colegas mais próximos a ele, como a antecessora Rosa Weber, além de ter se aproximado do decano da Corte, Gilmar Mendes, a despeito do largo histórico de atritos. Exemplo dessa nova parceria foi o inédito voto dado em conjunto sobre o piso nacional da enfermagem, em junho. Os dois ministros mantiveram a lei que estabeleceu a regra e fixaram diretrizes para a aplicação.