Política
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Por — Rio de Janeiro

Escolhido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e aprovado pelo Senado, o novo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino concluiu nesta quarta-feira um movimento raro desde a redemocratização brasileira: o retorno de um ex-magistrado ao Poder Judiciário, depois de ter trocado a toga pela política.

Dino foi juiz federal por cerca de uma década, entre 1994 e 2006. À época, aos 38 anos, se desligou da carreira para concorrer a deputado federal pelo PCdoB no Maranhão – e se elegeu. Depois de 17 anos na política, período no qual foi ainda governador, senador e, mais recentemente, ministro da Justiça no governo Lula, Dino tomou o caminho inverso e reassumiu um posto no Judiciário. Hoje aos 55, ele poderá ficar até 20 anos como ministro do Supremo, conforme as regras atuais de aposentadoria compulsória.

Antes de Dino, apenas o ex-ministro do STF Francisco Rezek fez um retorno semelhante da política ao Judiciário. Procurador da República, Rezek foi indicado ao Supremo em 1983, na ditadura militar, pelo então presidente, general João Batista Figueiredo. Decidiu deixar o cargo na Corte sete anos depois, para virar ministro de Relações Exteriores no governo de Fernando Collor.

Em 1992, Collor indicou Rezek novamente para o posto de ministro do STF. Ele ocupou a cadeira por mais cinco anos, e se desligou em 1997 para assumir uma vaga no Tribunal Internacional de Justiça da ONU.

Outros indicados ao STF na redemocratização tinham passagens relevantes pelos poderes Executivo e Legislativo, mas sem a experiência pregressa no Judiciário, como Dino. O ex-ministro Paulo Brossard, por exemplo, indicado no governo José Sarney ao Supremo, em 1992, havia sido deputado federal e senador pelo MDB no Rio Grande do Sul, além de ministro da Justiça do próprio Sarney.

Também indicado por Sarney, o ex-ministro Célio Borja chegou a ser presidente da Câmara dos Deputados, entre 1975 e 1977. Ele fez um retorno à política ao deixar o Supremo em 1992 e se tornar, no mesmo ano, ministro da Justiça do governo Collor. No entanto, não voltou a ocupar cargos no Judiciário depois disso.

O ex-ministro Maurício Corrêa, indicado no governo Itamar Franco ao Supremo, havia sido senador e ministro da Justiça. Ficou no STF até 2004. Currículo semelhante ao de Nelson Jobim, indicado à Corte no governo Fernando Henrique Cardoso. Jobim, após se aposentar do STF em 2006, ainda voltaria ao Executivo federal, assumindo a pasta da Defesa no segundo governo Lula. Nem Corrêa, nem Jobim tinham carreira pregressa como juízes.

Da atual composição do STF, dois ministros passaram antes pelo governo federal, assim como Dino: Gilmar Mendes e Dias Toffoli, titulares da Advocacia-Geral da União (AGU) nos governos Fernando Henrique e Lula, respectivamente.

Para juristas e parlamentares que defendem a indicação de Dino, a trajetória e o perfil do novo ministro sugerem que ele levará ao STF uma visão “jurídico-política”, que casa com desafios atuais da Corte. Nas duas últimas décadas, após julgamentos marcantes como o do mensalão e os casos da Lava-Jato, e com ainda mais ênfase ao longo do governo Bolsonaro, o Supremo passou a ser alvo de maior escrutínio público e a ser mais instado a se manifestar sobre atos de outros Poderes.

A Corte também tomou a dianteira desde 2019 de inquéritos que apuram fake news, atos antidemocráticos e ataques à democracia, o que ampliou a zona de atritos entre o Supremo e integrantes do Legislativo e do Executivo.

Adversários de Dino, por sua vez, consideram que justamente a bagagem política acumulada em quase duas décadas colocaria em xeque sua atuação e imparcialidade de volta ao Judiciário. Na sabatina desta quarta-feira, Dino procurou frisar que as duas funções são “diferentes” e que, “por já ter exercido todas”, é capaz de fazer a distinção:

– É claro que o político tem que ter nitidez e exposição nas suas posições. O juiz, não. Portanto, não se pode imaginar o que um juiz foi ou o que um juiz será a partir da leitura da sua atitude como político. Seria como examinar um goleiro à luz do comportamento como centroavante. É claro que são papéis diferentes – afirmou.

De rival a aliado

Dez anos antes de Lula indicar Dino ao Supremo, o atual presidente e o futuro ministro do STF estavam em lados opostos na política. Em 2014, ano em que Dino se elegeu governador do Maranhão pelo PCdoB, o PT apoiava o então candidato do PMDB ao governo, Lobão Filho.

A aliança entre PT e PMDB no Maranhão seguia o alinhamento nacional entre os partidos desde 2010, quando a então candidata a presidente Dilma Rousseff, lançada por Lula, teve como vice em sua chapa o emedebista Michel Temer. Naquele ano, Dino também havia concorrido ao governo, mas foi derrotado em primeiro turno por Roseana Sarney (PMDB), filha do ex-presidente José Sarney.

O apoio petista à família Sarney era seguidamente contestado pelo PT no Maranhão, que tentou formar alianças com Dino nas duas eleições; em ambas, foi desautorizado pelo diretório nacional do PT, sob orientação de Lula. Em reação, Dino chegou a aparecer com o presidenciável do PSDB, Aécio Neves, durante a campanha eleitoral de 2014. No segundo turno, porém, e já eleito governador, Dino declarou apoio a Dilma, iniciando uma aproximação formal com o PT.

Além de ter aparado arestas do passado com a sigla petista, Dino também abriu relações com a família Sarney, sua antiga adversária no Maranhão. Na campanha para angariar votos de senadores ao Supremo, Dino teve o apoio do próprio Sarney, que segue também aliado de Lula. A aliança com antigos rivais foi sublinhada pelo próprio Dino em sua sabatina:

-- No meu estado, tinha um grupo liderado pelo ex-presidente José Sarney como adversário político, e, passados os anos, ele, assim como a deputada Roseana, assim como todos os lados da política maranhense, acompanham e apoiam a minha indicação ao Supremo -- afirmou.

A ascensão de Dino ao Supremo deve abrir uma disputa por seu espólio no Maranhão, estado em que o hoje ministro da Justiça havia se consolidado como principal ator político na última década. Após se eleger governador em 2014, Dino foi reeleito em 2018 no primeiro turno, contra Roseana. Em 2022, chegou ao Senado com 62% dos votos válidos, uma das maiores votações proporcionais do país.

A família Sarney, que aspira à retomada do protagonismo no estado, atualmente costura uma aliança com o governador Carlos Brandão (PSB), que foi vice de Dino. Em campo distinto, o senador Weverton Rocha (PDT-MA), relator da indicação de Dino ao STF, também pleiteia o papel de herdeiro político.

A corrida pelo espólio segue as sinalizações do próprio Dino de que não cogita retornar à política. Na sabatina desta quarta-feira, o futuro ministro do Supremo afirmou ter ficado "com lágrimas no rosto" ao aposentar a toga em 2006 -- um indício, segundo ele, de que "talvez imaginava que um dia fosse precisar dela de novo".

-- Mas isso não se refere ao chapéu da política. Eu já tenho 55 anos e por isso mesmo imagino que essa é uma decisão em que esse chapéu ficará na parede como uma boa memória, mas que jamais voltarei a envergá-lo. É no que creio.

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