A Polícia Federal apontou que a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) utilizou, “sob as ordens de Alexandre Ramagem”, a ferramenta FirstMile para monitorar ilegalmente o então presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia. Essa informação consta na decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que autorizou nesta quinta-feira uma uma operação para apurar o uso do sistema espião durante a gestão de Jair Bolsonaro.
“Encontro (jantar) em que estavam presentes o presidente da Câmara dos Deputados, deputado federal Rodrigo Maia, deputada federal Joice Hasselmann e advogado Antônio Rueda, tendo comparecido ao evento o delegado Anderson Torres mas tendo sido propositalmente omitida a sua presença”, diz o relatório da PF.
Ao GLOBO, Joice afirmou que já sabia que era alvo de monitoramento desde meados de 2019, quando ela tinha passado de apoiadora à opositora ao governo de Jair Bolsonaro.
—Para mim, surpresa zero. Eu sabia que estava sendo monitorada. Sabia que o esquema dentro do Palácio começou a circular a partir do meio do ano. A coisa era muito, muito cara de pau, não era só grampo telefônico, eu fui grampeada, meus assessores todos foram grampeados— afirmou a ex-deputada ao GLOBO.
Segundo ela, o jantar foi na residência oficial da Câmara, onde morava Maia na época e o evento aconteceu no final de 2019.
De acordo com a PF, o monitoramento foi feito pelo agente Felipe Arlotta a pedido de Ramagem. Arlotta foi levado para a Abin por Ramagem e coordenava a suposta estrutura paralela montada durante sua gestão. Alexandre Ramagem negou a existência da estrutura de uma “Abin paralela” sob a sua gestão, usada com “viés político” para investigar autoridades, como apontou a Polícia Federal na investigação.
A investigação da PF constatou que a Abin chegou a monitorar um jantar em que o então presidente da Câmara estava presente. Segundo a PF, um alvo foi monitorado “tão somente” por participar do encontro com Rodrigo Maia.
A PF aponta que a Abin também foi utilizada para monitorar ilegalmente a promotora de Justiça do Rio de Janeiro Simone Sibilio, responsável por investigar o assassinato da vereadora Marielle Franco ocorrido em 2018. A promotora deixou o caso em 2021.
"Ficou patente a instrumentalização da Abin, para monitoramento da Promotora de Justiça do Rio de Janeiro e coordenadora da força-tarefa sobre os homicídios qualificados perpetrados em desfavor da vereadora Marielle Franco e o motorista que lhe acompanhava Anderson Gomes", diz trecho da decisão do ministro do Alexandre de Moraes.
O Polícia Federal também investiga se a Abin produziu dossiês envolvendo os ministros Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e se vigiou o ministro da Educação, Camilo Santana, quando era governador do Ceará.
FirstMile
Como revelou O GLOBO, a Abin utilizou um programa secreto chamado FirstMile para monitorar a localização de pessoas pré-determinados por meio dos aparelhos celulares durante a gestão de Jair Bolsonaro (PL). Após a reportagem, publicada em março, a PF abriu um inquérito e identificou que a ferramenta foi utilizada para monitorar políticos, jornalistas, advogados e adversários do governo.
A ferramenta foi produzida pela empresa israelense Cognyte (ex-Verint) e era operada, sem qualquer controle formal de acesso, pela equipe de operações da agência de inteligência.
Nesta manhã, são alvos dos mandados de busca e apreensão o deputado Alexandre Ramagem (PL), diretor da Abin à época, policiais federais cedidos e servidores do órgão. O parlamentar foi procurado, mas não se manifestou sobre a operação
Ramagem nega
Alexandre Ramagem negou a existência da estrutura de uma “Abin paralela” sob a sua gestão, usada com “viés político” para investigar autoridades, como apontou a Polícia Federal na investigação. Segundo ele, o sistema FirstMile foi adquirido pela Abin no governo do ex-presidente Michel Temer e era usado por servidores da agência.
— Isso não é Abin paralela, é Abin real — disse em entrevista à GloboNews.
O deputado sinalizou que mesmo como diretor da agência, não tinha controle completo sobre o órgão. — A Abin é enorme e seus departamentos são independentes para fazer seus trabalhos de inteligência. A gente queria organizar como a ferramenta (FirstMile) trabalhava e fizemos auditoria específica para isso. Quando fomos ouvir o diretor responsável pelas senhas e pela gestão para demonstrar como funcionava, quando se negaram a me informar como estavam trabalhando com a ferramenta, eu exonerei esse diretor que era o chefe e encaminhei o procedimento para a corregedoria — disse.
O ex-diretor do órgão de inteligência ressaltou que nunca pediu formalmente ou informalmente para que departamentos utilizassem o programa FirstMile.
— A direção-geral tem mecanismos para fazer plano de operação e dizer qual tecnologia se trabalha. Nenhum plano de operação meu colocava o FirstMile — disse.
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