O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) André Mendonça autorizou a renegociação de acordos de leniência fechados por empresas com a Operação Lava-Jato. As companhias terão 60 dias para chegar a um consenso com os órgãos de controle, com a participação também da Procuradora-Geral da República (PGR). Nesse período, as multas aplicadas serão suspensas.
A medida foi determinada após uma audiência de conciliação relativa a uma ação protocolada por partidos que questiona os termos dos acordos de leniência celebrados na Lava-Jato.
Como resultado da conciliação, além da suspensão das multas, também ficou estabelecido que nesse período ficará suspensa a aplicação de qualquer medida em razão de eventual descumprimento, por parte das empresas, no pagamento das obrigações financeiras até então pactuadas.
A questão é objeto de uma ação apresentada ao Supremo em março de 2023 pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), o Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e o Solidariedade. As legendas afirmam que os pactos foram celebrados antes do Acordo de Cooperação Técnica (ACT), que sistematiza regras para o procedimento, e que, portanto, haveria ilicitudes na realização dos acordos.
O ACT foi firmado em 2020 por Supremo, Controladoria-Geral da União (CGU), Advocacia-Geral da União (AGU) e Ministério da Justiça. Segundo os partidos, os acordos pactuados antes de 2020 foram feitos “em situação de extrema anormalidade político-jurídico-institucional, mediante situação de coação”. Por isso, pedem que o Supremo reconheça que as leniências foram fechadas “sob um estado de coisas inconstitucional”.
Durante a audiência, Mendonça, que é o relator dos casos, ressaltou a importância dos acordos de leniência como instrumento de combate à corrupção, frisando que a conciliação proposta não servirá para que seja feito um “revisionismo histórico”.
Segundo o ministro, o objetivo é assegurar que as empresas negociem com os entes públicos com base nos princípios da boa-fé, da mútua colaboração, da confidencialidade, da razoabilidade e da proporcionalidade.
O procurador-geral da República, Paulo Gonet, concordou com a importância de abertura de diálogo, assim como o presidente do TCU, ministro Bruno Dantas, que destacou a relevância da instituição para fiscalizar o andamento dos acordos.
Entre os acordos que serão afetados pela medida proposta pelo Supremo estão aqueles que foram fechados entre os órgãos de controle e empresas como Braskem, Samsung, Nova Enegevix, Camargo Corrêa, Novonor (antiga Odebrecht), J&F e Metha (antiga OAS).
A ação em que foi feita a conciliação no Supremo é a mesma mencionada pela Procuradoria-Geral da República no recurso contra a suspensão da multa da J&F, determinada em janeiro pelo ministro Dias Toffoli. No pedido apresentado à Corte, Gonet pediu para que este recurso contra a decisão de Toffoli fosse apreciado em conjunto com a ação sob a relatoria de Mendonça – entendendo que os "objetos" são os mesmos.
Participantes da reunião ouvidos pelo GLOBO relatam que todas as instituições de Estado demonstraram uma postura de alinhamento total, entendendo que a repactuação nos termos definidos em 2020 é necessária.
Ainda segundo relatos, tanto CGU quanto TCU levaram para a discussão a instrução normativa aprovada na semana passada que estabelece diretrizes para atuação nos acordos de leniência – ocorrendo a partir do recebimento de informações oriundas da CGU e da Advocacia-Geral da União no início e fim da fase de negociação, bem como após a assinatura do acordo de leniência.
Na decisão dada por Toffoli, foi suspenso o pagamento de R$ 3,8 bilhões em multas da antiga Odebrecht e atual Novonor. A decisão do ministro suspendendo o pagamento de multas da Odebrecht foi dada em uma ação na qual a empreiteira pegou carona — e beneficiou o grupo J&F com a suspensão de uma penalidade de R$ 10,3 bilhões no acordo de leniência firmado por conta de corrupção na Petrobras.
Para Sebastião Tojal, advogado especialista em acordos de leniência, advogado da Andrade Gutierrez na negociação dos acordos de leniência, foi "altamente louvável a iniciativa do ministro André Mendonça de fomentar condições para que todos os envolvidos nesse processo possam sentar-se em torno de uma mesa, dialogar e encontrar uma solução de consenso".
– A litigiosidade custa muito caro. Portanto, é preferível que se busque uma solução de consenso. Mas a par do custo inerente a todo processo que exige uma decisão de um terceiro, tem um outro dado que é a insegurança jurídica, que tem se perpetuado em torno desse tema. E o ministro André, muito sensivelmente, percebeu que o caminho adequado é que as partes, todas elas envolvidas no processo, tentem articular uma solução que, se não for a ideal, pelo menos significará a superação desse impasse que vivemos hoje. Porque os acordos se tornaram impagáveis e deixaram de cumprir o seu papel –aponta.
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