Com um pedido de prisão decretado pela Justiça de Joinville (SC) na sexta-feira passada por não pagamento de pensão alimentícia, o deputado bolsonarista Zé Trovão (PL-SC) ainda tenta, segundo sua defesa, reverter a decisão do magistrado catarinense. De acordo com o advogado do parlamentar, houve um erro por parte da Câmara ao descontar da folha de pagamento parte do salário do político. Mas o deputado pode, de fato, ser preso caso uma mudança de cenário não ocorra?
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— Não corre risco algum de ser preso — garante o advogado Fábio Daüm, que representa o parlamentar.
Esse entendimento, entretanto, não é unânime. Na sexta-feira passada, o juiz responsável pelo caso deu um prazo de cinco dias para que a ex-mulher do deputado atualize a quantia devida por ele. Segundo a defesa de Zé Trovão, isso já aconteceu, e foi aberto o prazo para que o próprio parlamentar se manifeste nos autos, que tramitam em segredo de Justiça. Um eventual mandado de prisão só será expedido pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC) após a conclusão destes trâmites. Na avaliação do advogado criminalista Rafael Paiva, caso isso chegue a ocorrer, não seria necessário que a Câmara referendasse a decisão, por exemplo.
Paiva explica que a Constituição estabelece que um parlamentar só pode ser preso, em regra, em casos de prisão de natureza penal, se houver flagrante de crime inafiançável. Nessas situações, os autos de prisão devem ser encaminhados para a Câmara dos Deputados, que pode decidir pela revogação da prisão pelo voto da maioria absoluta de seus membros.
— Mas a prisão do devedor de alimentos tem natureza civil, não penal. Esta é a razão pela qual eu entendo que a prisão civil de um deputado federal seria plenamente possível, independentemente de qualquer autorização da Câmara — avalia.
O advogado acrescenta que o acesso aos alimentos é um direito fundamental do menor. Por esse motivo, ele deveria prevalecer sobre a imunidade parlamentar, "criada apenas para proteger os parlamentares de uma eventual perseguição política".
— Não é o caso da prisão civil do devedor de alimentos. Não há perseguição aqui. Há a proteção a um direito fundamental de uma criança — frisa.
Além disso, Paiva opina que o Supremo Tribunal Federal (STF) "vem relativizando a imunidade formal de parlamentares", possibilitando a prisão em caso de condenação criminal transitada em julgado.
— Mas devo reconhecer que o tema é espinhoso, e existem grandes doutrinadores que entendem ser impossível a prisão civil de deputado federal — complementa o advogado.
O também criminalista Acácio Miranda, porém, tem entendimento semelhante ao do colega:
— A imunidade parlamentar não engloba a prisão do devedor de pensão, por ser esta uma modalidade de prisão civil e por razões que não guardam afinidade com o exercício do mandato.
Defesa
Ao GLOBO, a defesa do deputado alegou que realizou o pagamento da dívida de cerca de R$ 5 mil ainda na última sexta-feira. Daüm sustenta que foi o parlamentar quem entrou com um processo pedindo que a Justiça determinasse um valor justo para a pensão. Segundo o advogado, ficou estabelecido que a quantia deveria equivaler a 17,5% do salário de Zé Trovão ou 4,5 salários mínimos, o que tivesse maior valor.
Entretanto, Daüm ressalta que o desconto automático da Câmara estaria com déficit e o deputado não sabia dessa questão, o que provocou o acúmulo da dívida. O advogado afirmou que Zé Trovão fazia pagamentos de aproximadamente R$ 5 mil mensais, mas que o valor pago deveria ser de quase R$ 6 mil.
— Fomos pegos de surpresa. Não sabíamos do erro de cálculo. Quando tomamos consciência, entramos na Justiça com um pedido de compensação por conta de uma ajuda mensal de R$ 4 mil paga pelo deputado, além da pensão. O juiz não autorizou a compensação e realizamos o pagamento hoje (sexta-feira). Essa questão será discutida posteriormente em outras esferas — disse Daüm na ocasião.