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Queiroz usou apartamento de ex-mulher de Wassef em SP, apontam mensagens obtidas pelo MP

Investigadores reúnem dados de localização do envio de imagens feitas pelo filho do ex-assessor de Flávio Bolsonaro em endereço de Maria Cristina Boner Leo
O ex-assessor Fabrício Queiroz, na varanda do apartamento onde cumpre prisão domiciliar 13/07/2020 Foto: Reprodução

RIO — Mensagens encontradas nos celulares apreendidos da família de Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro, revelam que ele e seu filho também usaram um apartamento em São Paulo da empresária Maria Cristina Boner Leo, ex-mulher do advogado Frederick Wassef . Até agora, os investigadores só haviam descoberto dois endereços de Wassef utilizados como refúgio do ex-assessor de Flávio durante o ano passado: o sítio, em Atibaia, onde Queiroz foi preso , e apartamentos no Guarujá.

Operação : Mensagens inéditas de mulher de Queiroz vinculam Wassef ao apelido 'Anjo'

Conversa entre Queiroz e Márcia Foto: Editoria de Arte

Obtidas pelo GLOBO, as mensagens que comprovam a localização começaram a ser trocadas na madrugada de 24 de novembro do ano passado. No dia, às 00h15, Queiroz escreveu para Márcia Oliveira de Aguiar, sua esposa, via Whatsapp, que estava indo "para a casa do Anjo (codinome que as investigações apontam como sendo de Wassef). A mulher respondeu: “Felipe também? Tomara que tenha boas notícias”, questionou em referência ao filho do casal. Em seguida, Queiroz enviou para Márcia uma foto do filho sentado em um sofá branco com uma ampla sala ao fundo.

Naquele mesmo dia, horas depois, o filho de Queiroz tirou uma série de cinco fotos de si próprio na mesma sala da foto enviada por Queiroz para Márcia. Depois, a enviou para um amigo elogiando o apartamento. Foi justamente esse movimento que indicou o endereço das fotos.

Ao enviar suas imagens no Whatsapp, o celular registrou que os dados foram enviados da Rua Jerônimo da Veiga esquina com a Rua Emanuel Kant, no bairro Chácara Itaim, exato endereço do prédio onde Maria Cristina Boner possui um apartamento na capital paulista.

Nessa época, o casal estava apreensivo com o julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o compartilhamento de dados pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) e o MP , o que gerou a abertura da investigação sobre Queiroz e Flávio. Dias depois, o STF decidiu que era constitucional o compartilhamento e a investigação sobre o senador foi liberada depois de quatro meses paralisada por decisão judicial. 

SIGILO RECUPERADO - Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) votaram, no dia 23 de fevereiro de 2021, a favor de um pedido da defesa do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) para anular a quebra de sigilo fiscal e bancário no caso das rachadinhas Foto: Pablo Jacob / Agência O Globo
MOVIMENTAÇÃO ATÍPICA - No fim de 2018, o Coaf apontou “movimentação atípica” de R$ 1,2 milhão, em 2016 e 2017, nas contas de Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio. Oito assessores do ex-deputado estadual transferiram recursos a Queiroz em datas próximas ao pagamento de servidores da Alerj. Segundo o Coaf, Flávio recebeu 48 depósitos no valor de R$ 2 mil Foto: Arquivo pessoal
DENUNCIADO - O procurador-geral de Justiça do Rio, Eduardo Gussem, denunciou ao Tribunal de Justiça do Rio o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), seu ex-assessor Fabrício Queiroz e mais 15 pessoas pelos crimes de organização ciminosa, peculato, lavagem de dinheiro e apropriação indébita no escândalo da rachadinha no antigo gabinete de Flávio na Alerj. A denúncia foi oferecida no dia 19 de outubro Foto: ADRIANO MACHADO / REUTERS
PRISÃO PREVENTIVA - Ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro, Fabrício Queiroz foi preso na manhã de 18 de junho de 2020, em operação conjunta do Ministério Público do Rio de Janeiro e da Polícia Civil de São Paulo denominada Anjo – apelido de Frederick Wassef, advogado de Flávio e proprietário do imóvel onde Queiroz foi encontrado, em Atibaia, interior de São Paulo Foto: Nelson Almeida / AFP
PRISÃO DOMICILIAR - Com prisão temporária decretada em junho e dada como foragida, antes mesmo de ser encontrada, Márcia Aguiar, a mulher de Fabricio Queiroz foi beneficiada por decisão do pelo presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), João Otávio de Noronha, no dia 9 de julho, que determinou prisão domiciliar para o casal Foto: Betinho Casas Novas
ANJO - Queiroz foi localizado em imóvel de propriedade de Frederick Wassef (à esquerda), que esteve na posse de Fábio Farias como ministro das Comunicações na véspera da prisã preventiva de Queiroz. A operação do Ministério Público do Rio de Janeiro e Polícia Civil de São Paulo foi batizada de Anjo, apelido do advogado do senador Foto: Jorge William / Agência O Globo
A FILHA - Equipe do MP esteve, em 18 de dezembro de 2019, no condomínio onde morava Evelyn Queiroz, filha do ex-assessor de Flávio Bolsonaro, em Jacarepaguá, Zona Oeste do Rio Foto: Pablo Jacob / Agência O Globo
MUDANÇA NO COAF - No dia 8 de janeiro de 2020, presidente Bolsonaro transfere o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) do Ministério da Economia para o Banco Central Foto: Jorge William / Agência O Globo
FALTA EM DEPOIMENTO - Após faltar a quatro depoimentos ao MP, alegando problemas de saúde, Queiroz afirmou, em dezembro, que a “movimentação atípica” revelada pelo Coaf teve origem na compra e venda de veículos. Em janeiro, Flávio Bolsonaro também não prestou depoimento, argumentando que iria marcar uma nova data após ter acesso ao caso Foto: Reprodução / SBT
PEDIDO NEGADO - Em janeiro, no recesso do STF, o ministro Luiz Fux suspendeu as investigações temporariamente, a pedido de Flávio. Em fevereiro, Marco Aurélio revogou a decisão e autorizou o MPRJ a continuar com a apuração. Flávio havia pedido a transferência do caso para o STF e a anulação de provas Foto: Jorge William / Agência O Globo
FLÁVIO E 26 - Em entrevista coletiva, o procurador-geral de Justiça do Rio, Eduardo Gussem, afirmou que Flávio Bolsonaro e os outros 26 deputados estaduais com assessores citados em relatório do Coaf são alvo de investigações na área cível Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil / Fernando Frazão / Agência Brasil
DEVOLVOLUÇÃO DE SALÁRIOS - Em março, Queiroz admitiu, em depoimento, que os valores recebidos por servidores do gabinete eram usados para “multiplicar a base eleitoral” de Flávio. Um ex-funcionário afirmou que repassava quase 60% do salário. O MP não encontrou evidências de que o fluxo bancário de Queiroz teve origem no comércio de carros Foto: Divulgação
QUEBRA DE SIGILO - A pedido do MP, o Tribunal de Justiça do Rio autorizou, em abril, a quebra de sigilo bancário de Flávio e de Queiroz para o período de janeiro de 2007 a dezembro de 2018. A medida se estende a seus respectivos familiares e a outros 88 ex-funcionários do gabinete do ex-deputado estadual, seus familiares e empresas relacionadas a eles Foto: Edilson Rodrigues / Agência Senado / 09-05-2019
DINHEIRO VIVO - Em fevereiro, Queiroz pagou em espécie R$ 64,58 mil por uma cirurgia ao hospital israelita Albert Einstein , em São Paulo. Ele foi internado na unidade em janeiro, quando retirou um câncer no cólon. Desde que recebeu alta, nunca se soube o valor das despesas pagas pelo procedimento Foto: Reprodução
DECISÃO LIMINAR - Em 20 de junho de 2019, a Justiça do Rio decidiu suspender a quebra de sigilo da empresa MCA Participação e Exportações e de um de seus sócios, Marcelo Cattaneo Adorno. Ambos integravam a lista dos 95 alvos da investigação do Caso Queiroz Foto: Marcos Ramos / Agência O Globo
LIMINAR NEGADA - Em 26 de junho de 2019, o desembargador Antônio Carlos Nascimento Amado, do Tribunal de Justiça do Rio, negou pedido de Flávio para suspender a quebra de sigilo feita a pedido do MP-RJ Foto: Márcio Alves / Agência O Globo
NOVOS ALVOS - Em 28 de junho de 2019, a 27ª Vara Criminal do Rio autorizou a quebra dos sigilos de mais oito pessoas ligadas ao antigo gabinete de Flávio. A decisão ocorreu dois meses após a quebra dos silgilos de outras 86 pessoas e nove empresas ligadas ao antigo gabinete do filho do presidente. Foto: Jorge William / Agência O Globo
INVESTIGAÇÃO SUSPENSA - Em 16 de julho de 2019, o ministro Dias Toffoli, do STF, suspendeu processos judiciais em que dados bancários de investigados tenham sido compartilhados por órgãos de controle sem autorização da Justiça. Trata-se de resposta a um pedido de Flávio que pode beneficiá-lo no Caso Queiroz Foto: Agência Senado
QUEBRA DE SIGILO - Em 30 de setembro, Gilmar Mendes decidiu suspender processos envolvendo a quebra do sigilo de Flávio no caso Queiroz. A decisão de Gilmar atende ao pedido do advogado Frederick Wassef, defensor do filho do presidente. Wassef se reuniu dois dias antes com o presidente Jair Bolsonaro no Palácio da Alvorada. A determinação do ministro beneficia apenas o senador do PSL. Foto: Fellipe Sampaio /SCO/STF
AVISO SOBRE OPERAÇÃO - Suplente de Flávio Bolsonaro no Senado, Paulo Marinho (PSDB-RJ) afirmou em entrevista à Folha de S.Paulo que, em 2018, o então deputado Flávio Bolsonaro foi informado de que havia uma operação policial em curso para desvendar o pagamento de propina a deputados na Assembleia Legislativa do Rio. E que num relatório do Coaf, o assessor de Flávio, Fabrício Queiroz, era citado. Foto: Guito Moreto / Agência O Globo
PRISÃO - Queiroz foi preso na manhã desta quinta, 18, em Atibaia, em São Paulo. De acordo com o Ministério Público de São Paulo, ele estava num imóvel do advogado Fred Wassef e deve ser levado para o Rio de Janeiro ainda nesta quinta. A TV Globo noticiou a prisão e a informação foi confirmada pelo Estadão. Foto: POLÍCIA CIVIL/REPRODUÇÃO VÍDEO/DIVULGAÇÃO
O ministro João Otávio Noronha, presidente do STJ, decidiu conceder prisão domiciliar a Fabrício Queiroz e à mulher dele, Márcia de Aguiar. O ministro considerou que a saída de Fabrício Queiroz da cadeia é justificada pelo estado de saúde dele, que o deixaria mais vulnerável à Covid-19. Segundo a defesa, Queiroz tem câncer e recentemente passou por uma cirurgia na próstata. Foto: Lucas Pricken / STJ
STJ SUSPENDE DENÚNCIA -O ministro João Otávio de Noronha, do STJ (Superior Tribunal de Justiça), suspendeu o trâmite da denúncia do MPRJ (Ministério Público do Rio) contra o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), o ex-assessor Fabrício Queiroz e outros 15 investigados no caso das rachadinhas, termo usado para apropriação de salário de servidores públicos. Foto: Jorge William / Agência O Globo
STF MANTÉM FORO - A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) negou pedido do Ministério Público (MP) para devolver para um juiz de primeira instância a investigação das "rachadinhas" envolvendo o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), filho do presidente Jair Bolsonaro. Com isso, fica mantida a decisão do Tribunal de Justiça (TJ) estadual que deu foro privilegiado a Flávio. Foto: Reprodução

Contratos no governo Bolsonaro

Em junho, o portal Uol mostrou que o governo de Jair Bolsonaro fechou, desde o ano passado, novos contratos em um total de R$ 53 milhões  com a Globalweb Outsourcing, fundada por Maria Cristina Boner Leo, ex-companheira de Wassef, e administrada por sua filha, Bruna Boner Leo. Reportagem do GLOBO mostrou que a empresa pública Dataprev suspendeu em 15 de março do ano passado uma multa de R$ 27 milhões aplicada a um consórcio de empresas , que contava com a Globalweb, pela não entrega de um serviço até 2015. A Dataprev diz que o caso ainda está em análise e nega interferência política na decisão.

Prisão domiciliar: Mulher de Queiroz aparece em varanda de apartamento no Rio

Sem contestar a titularidade da propriedade, a empresária Maria Cristina Boner disse que “mora em Brasília, não estava em São Paulo nesta data, desconhece estes fatos e só vai se manifestar após ter acesso aos autos do procedimento por meio de seu advogado”. A Globalweb informa, em relação aos contratos com o governo federal, que "os valores recebidos por serviços regularmente prestados a órgãos federais durante o governo Bolsonaro são 70% menores ao totalizado nas gestões Dilma e Temer. Maria Cristina Boner não é investigada no procedimento.

Procurado, o advogado Paulo Emílio Catta Preta, que defende Fabrício Queiroz e sua família, disse pensar que “tais questionamentos devem ser respondidos pelo Frederick”. Wassef disse que não mora no local: “Jamais abriguei Queiroz ou qualquer pessoa de sua família em qualquer propriedade minha ou de conhecidos meus na cidade de São Paulo”.

Como justificativa para ceder imóveis a Fabrício Queiroz, Frederick Wassef tem dito que havia um plano para assassinar o ex-assessor de Flávio Bolsonaro e que ele tentou proteger a sua vida. No entanto, nas conversas entre Queiroz e seus familiares apreendidas pelo MP e obtidas pelo GLOBO, o policial não mencionou ameaças em momento algum.

Leia a íntegra da nota enviada por Frederick Wassef ao GLOBO:

"Jamais abriguei Queiroz ou qualquer pessoa de sua família em qualquer propriedade minha ou de conhecidos meus na cidade de São Paulo. Não estive com Queiroz  ou seu filho no referido endereço e nem levei ninguém lá. Minha ex-companheira não tem e nunca teve qualquer relacionamento com Queiroz e sua família  assim como  também nunca teve relacionamento com a família  Bolsonaro. Ela não conhece Michele Bolsonaro e nunca estiveram juntas. Ela nao tem nada que ver com a minha profissão e meus clientes. Ela nada tem a ver com nenhum assunto ou tema relacionado a mim ou ao Presidente da República com quem nunca teve relação de amizade.

Ela é apenas, assim como eu, uma vítima desta campanha suja de mentiras e fake news. De forma criminosa e proposital alguma autoridade pública do Rio de Janeiro está vazando a conta gotas "supostas" informações de um procedimento que está em segredo de justiça. Se após uma perícia, ficar provado que, de fato, tais mensagens de celular não foram fraudadas ou manipuladas, elas devem ser analisadas dentro do contexto e na íntegra. Nunca tive acesso a este material, e não sei do que se trata. Sempre o Grupo Globo tem informações vazadas de autoridades que nem mesmo a defesa técnica teve acesso e isto deve ser investigado pelo Ministério Público do Rio e pelo CNMP. O filho de Queiroz nunca foi investigado e a apreensão de seu celular é ilegal e arbitrária, o que acarretará futuras nulidades.  

Conforme inúmeras reportagens mostraram, após a prisão de Queiroz, apareceram vários outros personagens que deram entrevistas e afirmaram que estavam com ele direto e o ajudavam e cuidavam dele. Estas pessoas se encaixam com perfeição no papel de anjo. Nunca tive apelido de anjo e nunca fui chamado assim por ninguém. Após 2 anos e meio de investigação sem obter nada, pescam supostas mensagens de celular fora de contexto e tentam criar fantasias sobre as mesmas".