'Rachadinha': Filha de Queiroz transferiu para o pai quase 80% de seus salários no gabinete de Bolsonaro na Câmara

Dados obtidos pelo jornal "Folha de S. Paulo" a partir da quebra de sigilo de Nathália confirmam relatório do Coaf revelado pelo GLOBO no ano passado
Nathália Melo de Queiroz é filha de Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio Bolsonaro, e ex-secretária parlamentar de Jair Bolsonaro Foto: Reprodução

RIO -  Filha do ex-assessor de Flávio Bolsonaro, a personal trainer Nathália Queiroz repassou a maior parte de seu salário para o pai, Fabrício Queiroz, quando ainda trabalhava no gabinete do presidente Jair Bolsonaro na Câmara dos Deputados. Dados da quebra do sigilo de Nathália obtidos pelo jornal "Folha de S. Paulo" corroboram a revelação feita pelo GLOBO, em março do ano passado , de um relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) que apontou transferências bancárias de 80% de seus vencimentos para Queiroz entre junho e novembro de 2018, quando trabalhava para Bolsonaro.

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De acordo com a reportagem da "Folha de S. Paulo", Nathália transferiu R$ 150,5 mil para a conta do pai de janeiro de 2017 a setembro de 2018, quando estava lotada no gabinete de Bolsonaro. O valor equivale a 77% do que ela recebeu na Câmara dos Deputados no período.

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O nome de Nathália veio à tona pela primeira vez quando um relatório do Coaf apontou que seu pai movimentou R$ 1,2 milhão entre 2016 e 2017. O documento identificou que ela fez repasses a Queiroz em um total de R$ 97,6 mil ao longo do ano de 2016, quando ainda era assessora de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj).

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Com a quebra de sigilo, os promotores, diz a "Folha",  identificaram repasses de Nathália de ao menos 82% de seus vencimentos para Queiroz quando ela trabalhava no gabinete de Flávio,  na Alerj, de dezembro de 2007 a dezembro de 2016. Nesse período, foi da liderança do PP, do setor de notas taquigráficas e, a partir de 2011, passou a trabalhar com Flávio.

Relatório do MP sobre o Coaf de Nathália Queiroz Foto: Juliana Dal Piva / jornal O Globo

O relatório do Coaf obtido pelo GLOBO no ano passado classificou a movimentação financeira de Nathália no período  como  “aparentemente incompatível com a capacidade financeira da cliente”. Além disso, o órgão apontou como ocorrência ainda o “uso do dinheiro em espécie” para “inviabilizar a identificação da origem e real destino dos recursos”. Nesse período, ela efetuou 23 saques em dinheiro no total de R$ 11.950.

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Por meio de nota enviada à "Folha", a defesa de Queiroz afirmo que os repasses seguiam a lógica de “centralização das despesas familiares na figura do pai”.  A Presidência da República não quis comentar o caso.

Queiroz é investigado pelo Ministério Público do Rio (MP-RJ) sobre a prática de “rachadinhas” na Alerj — quando servidores devolvem parte dos salários aos deputados que os nomearam. Ele foi preso em junho deste ano , mas teve prisão domiciliar concedida  pelo presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro João Otávio de Noronha.

Na segunda-feira, a defesa de Queiroz protocolou seu primeiro habeas corpus no Supremo Tribunal Federal (STF), distribuído ao ministro Gilmar Mendes , pedindo a revogação da prisão domiciliar dele — ou seja, que ele fique sem nenhuma restrição em sua liberdade.

SIGILO RECUPERADO - Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) votaram, no dia 23 de fevereiro de 2021, a favor de um pedido da defesa do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) para anular a quebra de sigilo fiscal e bancário no caso das rachadinhas Foto: Pablo Jacob / Agência O Globo
MOVIMENTAÇÃO ATÍPICA - No fim de 2018, o Coaf apontou “movimentação atípica” de R$ 1,2 milhão, em 2016 e 2017, nas contas de Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio. Oito assessores do ex-deputado estadual transferiram recursos a Queiroz em datas próximas ao pagamento de servidores da Alerj. Segundo o Coaf, Flávio recebeu 48 depósitos no valor de R$ 2 mil Foto: Arquivo pessoal
DENUNCIADO - O procurador-geral de Justiça do Rio, Eduardo Gussem, denunciou ao Tribunal de Justiça do Rio o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), seu ex-assessor Fabrício Queiroz e mais 15 pessoas pelos crimes de organização ciminosa, peculato, lavagem de dinheiro e apropriação indébita no escândalo da rachadinha no antigo gabinete de Flávio na Alerj. A denúncia foi oferecida no dia 19 de outubro Foto: ADRIANO MACHADO / REUTERS
PRISÃO PREVENTIVA - Ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro, Fabrício Queiroz foi preso na manhã de 18 de junho de 2020, em operação conjunta do Ministério Público do Rio de Janeiro e da Polícia Civil de São Paulo denominada Anjo – apelido de Frederick Wassef, advogado de Flávio e proprietário do imóvel onde Queiroz foi encontrado, em Atibaia, interior de São Paulo Foto: Nelson Almeida / AFP
PRISÃO DOMICILIAR - Com prisão temporária decretada em junho e dada como foragida, antes mesmo de ser encontrada, Márcia Aguiar, a mulher de Fabricio Queiroz foi beneficiada por decisão do pelo presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), João Otávio de Noronha, no dia 9 de julho, que determinou prisão domiciliar para o casal Foto: Betinho Casas Novas
ANJO - Queiroz foi localizado em imóvel de propriedade de Frederick Wassef (à esquerda), que esteve na posse de Fábio Farias como ministro das Comunicações na véspera da prisã preventiva de Queiroz. A operação do Ministério Público do Rio de Janeiro e Polícia Civil de São Paulo foi batizada de Anjo, apelido do advogado do senador Foto: Jorge William / Agência O Globo
A FILHA - Equipe do MP esteve, em 18 de dezembro de 2019, no condomínio onde morava Evelyn Queiroz, filha do ex-assessor de Flávio Bolsonaro, em Jacarepaguá, Zona Oeste do Rio Foto: Pablo Jacob / Agência O Globo
MUDANÇA NO COAF - No dia 8 de janeiro de 2020, presidente Bolsonaro transfere o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) do Ministério da Economia para o Banco Central Foto: Jorge William / Agência O Globo
FALTA EM DEPOIMENTO - Após faltar a quatro depoimentos ao MP, alegando problemas de saúde, Queiroz afirmou, em dezembro, que a “movimentação atípica” revelada pelo Coaf teve origem na compra e venda de veículos. Em janeiro, Flávio Bolsonaro também não prestou depoimento, argumentando que iria marcar uma nova data após ter acesso ao caso Foto: Reprodução / SBT
PEDIDO NEGADO - Em janeiro, no recesso do STF, o ministro Luiz Fux suspendeu as investigações temporariamente, a pedido de Flávio. Em fevereiro, Marco Aurélio revogou a decisão e autorizou o MPRJ a continuar com a apuração. Flávio havia pedido a transferência do caso para o STF e a anulação de provas Foto: Jorge William / Agência O Globo
FLÁVIO E 26 - Em entrevista coletiva, o procurador-geral de Justiça do Rio, Eduardo Gussem, afirmou que Flávio Bolsonaro e os outros 26 deputados estaduais com assessores citados em relatório do Coaf são alvo de investigações na área cível Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil / Fernando Frazão / Agência Brasil
DEVOLVOLUÇÃO DE SALÁRIOS - Em março, Queiroz admitiu, em depoimento, que os valores recebidos por servidores do gabinete eram usados para “multiplicar a base eleitoral” de Flávio. Um ex-funcionário afirmou que repassava quase 60% do salário. O MP não encontrou evidências de que o fluxo bancário de Queiroz teve origem no comércio de carros Foto: Divulgação
QUEBRA DE SIGILO - A pedido do MP, o Tribunal de Justiça do Rio autorizou, em abril, a quebra de sigilo bancário de Flávio e de Queiroz para o período de janeiro de 2007 a dezembro de 2018. A medida se estende a seus respectivos familiares e a outros 88 ex-funcionários do gabinete do ex-deputado estadual, seus familiares e empresas relacionadas a eles Foto: Edilson Rodrigues / Agência Senado / 09-05-2019
DINHEIRO VIVO - Em fevereiro, Queiroz pagou em espécie R$ 64,58 mil por uma cirurgia ao hospital israelita Albert Einstein , em São Paulo. Ele foi internado na unidade em janeiro, quando retirou um câncer no cólon. Desde que recebeu alta, nunca se soube o valor das despesas pagas pelo procedimento Foto: Reprodução
DECISÃO LIMINAR - Em 20 de junho de 2019, a Justiça do Rio decidiu suspender a quebra de sigilo da empresa MCA Participação e Exportações e de um de seus sócios, Marcelo Cattaneo Adorno. Ambos integravam a lista dos 95 alvos da investigação do Caso Queiroz Foto: Marcos Ramos / Agência O Globo
LIMINAR NEGADA - Em 26 de junho de 2019, o desembargador Antônio Carlos Nascimento Amado, do Tribunal de Justiça do Rio, negou pedido de Flávio para suspender a quebra de sigilo feita a pedido do MP-RJ Foto: Márcio Alves / Agência O Globo
NOVOS ALVOS - Em 28 de junho de 2019, a 27ª Vara Criminal do Rio autorizou a quebra dos sigilos de mais oito pessoas ligadas ao antigo gabinete de Flávio. A decisão ocorreu dois meses após a quebra dos silgilos de outras 86 pessoas e nove empresas ligadas ao antigo gabinete do filho do presidente. Foto: Jorge William / Agência O Globo
INVESTIGAÇÃO SUSPENSA - Em 16 de julho de 2019, o ministro Dias Toffoli, do STF, suspendeu processos judiciais em que dados bancários de investigados tenham sido compartilhados por órgãos de controle sem autorização da Justiça. Trata-se de resposta a um pedido de Flávio que pode beneficiá-lo no Caso Queiroz Foto: Agência Senado
QUEBRA DE SIGILO - Em 30 de setembro, Gilmar Mendes decidiu suspender processos envolvendo a quebra do sigilo de Flávio no caso Queiroz. A decisão de Gilmar atende ao pedido do advogado Frederick Wassef, defensor do filho do presidente. Wassef se reuniu dois dias antes com o presidente Jair Bolsonaro no Palácio da Alvorada. A determinação do ministro beneficia apenas o senador do PSL. Foto: Fellipe Sampaio /SCO/STF
AVISO SOBRE OPERAÇÃO - Suplente de Flávio Bolsonaro no Senado, Paulo Marinho (PSDB-RJ) afirmou em entrevista à Folha de S.Paulo que, em 2018, o então deputado Flávio Bolsonaro foi informado de que havia uma operação policial em curso para desvendar o pagamento de propina a deputados na Assembleia Legislativa do Rio. E que num relatório do Coaf, o assessor de Flávio, Fabrício Queiroz, era citado. Foto: Guito Moreto / Agência O Globo
PRISÃO - Queiroz foi preso na manhã desta quinta, 18, em Atibaia, em São Paulo. De acordo com o Ministério Público de São Paulo, ele estava num imóvel do advogado Fred Wassef e deve ser levado para o Rio de Janeiro ainda nesta quinta. A TV Globo noticiou a prisão e a informação foi confirmada pelo Estadão. Foto: POLÍCIA CIVIL/REPRODUÇÃO VÍDEO/DIVULGAÇÃO
O ministro João Otávio Noronha, presidente do STJ, decidiu conceder prisão domiciliar a Fabrício Queiroz e à mulher dele, Márcia de Aguiar. O ministro considerou que a saída de Fabrício Queiroz da cadeia é justificada pelo estado de saúde dele, que o deixaria mais vulnerável à Covid-19. Segundo a defesa, Queiroz tem câncer e recentemente passou por uma cirurgia na próstata. Foto: Lucas Pricken / STJ
STJ SUSPENDE DENÚNCIA -O ministro João Otávio de Noronha, do STJ (Superior Tribunal de Justiça), suspendeu o trâmite da denúncia do MPRJ (Ministério Público do Rio) contra o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), o ex-assessor Fabrício Queiroz e outros 15 investigados no caso das rachadinhas, termo usado para apropriação de salário de servidores públicos. Foto: Jorge William / Agência O Globo
STF MANTÉM FORO - A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) negou pedido do Ministério Público (MP) para devolver para um juiz de primeira instância a investigação das "rachadinhas" envolvendo o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), filho do presidente Jair Bolsonaro. Com isso, fica mantida a decisão do Tribunal de Justiça (TJ) estadual que deu foro privilegiado a Flávio. Foto: Reprodução