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Política

Sem poder sobre emendas, Alcolumbre se afasta do Planalto

Distribuição de recursos do ‘orçamento paralelo’, que era conduzida pelo ex-presidente do Senado, passou a ser executada pela ministra Flávia Arruda
Fora da presidência do Senado, Alcolumbre viu estremecimento da relação com o governo Bolsonaro Foto: Pablo Jacob / Agência O Globo/01-09-2020
Fora da presidência do Senado, Alcolumbre viu estremecimento da relação com o governo Bolsonaro Foto: Pablo Jacob / Agência O Globo/01-09-2020

BRASÍLIA - Egressos do baixo clero do Congresso, o presidente Jair Bolsonaro e o senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), ex-comandante do Senado, tornaram-se aliados quando ascenderam ao topo do poder. Essa relação ficou estremecida nos últimos meses , após o parlamentar perder influência sobre a destinação do chamado “orçamento paralelo”, verbas do governo transferidas aos redutos eleitorais de aliados.

Os recursos, oriundos das emendas de relator, foram usados pelo Palácio do Planalto para favorecer governistas. O repasse foi feito a partir do acordo entre a cúpula do Congresso e o governo federal, de forma desigual e sem transparência. Boa parte da distribuição dessa verba passava pelo crivo de Alcolumbre, que ganhou o apelido de “líder informal do governo”, e ajudou tanto na articulação de Bolsonaro no Congresso como na eleição de Rodrigo Pacheco (DEM-MG) para a presidência do Senado.

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Desde abril, porém, a administração desses recursos mudou de mãos e ficou sob a responsabilidade da ministra Flávia Arruda, da Secretaria de Governo, e de líderes de partidos. Naquela época, o Planalto alegou que é prerrogativa da pasta fazer a interlocução com parlamentares para a distribuição do montante. Essa mudança incomodou Alcolumbre, que se afastou do governo e até de Brasília, ficando longe das articulações na capital federal. Um dia antes da instalação da CPI da Covid no Senado, por exemplo, o parlamentar estava cumprindo agenda na inauguração do novo prédio da Polícia Científica do Amapá.

Ligações rejeitadas

Procurados, Davi Alcolumbre e Flávia Arruda preferiram não se manifestar. Integrantes do Palácio do Planalto argumentam que Bolsonaro já mostrou gratidão ao ex-presidente do Senado quando, a pedido dele, apoiou a candidatura de Rodrigo Pacheco para sucedê-lo.

Presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Alcolumbre terá o poder de conduzir o processo de indicação ao Supremo Tribunal Federal (STF) do escolhido de Bolsonaro para a vaga, o advogado-geral da União, André Mendonça.

Desde que o presidente oficializou o seu candidato à Corte, governistas tentaram, sem sucesso, entrar em contato com Alcolumbre, que ignorou as ligações — entre os rejeitados, estão os senadores Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho do presidente, e Marcos Rogério (DEM-RO), um dos vice-líderes do governo.

Na semana passada, Alcolumbre chegou a se reunir com senadores da CPI da Covid na casa do presidente da comissão, Omar Aziz (PSD-AM). No encontro, estavam presentes parlamentares de oposição como Renan Calheiros (MDB-AL) e Randolfe Rodrigues (Rede-AP). Indagado sobre o teor da conversa com Alcolumbre, Aziz afirmou que ambos trataram de questões envolvendo o Amazonas.

A divergência entre Bolsonaro e Alcolumbre acabou afetando também a relação do senador com colegas parlamentares, que passaram a cobrar acordos políticos descumpridos. Um áudio, obtido pelo GLOBO, enviado pelo senador Telmário Mota (PROS-RR), via WhatsApp, expõe a insatisfação com o ex-chefe do Senado.

— Há 20 dias estou tentando falar com você e você tem me evitado. Eu pensei até que você estava fazendo isso porque talvez você estivesse com dificuldade de honrar com seus compromissos comigo — disse Telmário na gravação.

Procurado, o parlamentar reforçou as reclamações contra o colega de Senado:

— Davi (Alcolumbre) promete as coisas e não honra. O áudio é sobre acordos políticos que ele tinha comigo em Roraima. Nada referente a emendas. Em relação à indicação do André Mendonça ao STF, Davi está criando dificuldade para vender facilidade.