Rio Bairros

'Ouvi que tinha que ter pele branca para ser nobre', diz Junio Dantas, há um ano em cartaz com ‘O Pequeno Príncipe preto’

Ator já foi visto por mais de 50 mil pessoas, encenou em escolas públicas e rodou todo o Brasil com o espetáculo
O ator Junior Dantas na Praça Paris, na Glória, que fica em frente ao apartamento onde mora Foto: Gabriela Fittipaldi / Agência O Globo
O ator Junior Dantas na Praça Paris, na Glória, que fica em frente ao apartamento onde mora Foto: Gabriela Fittipaldi / Agência O Globo

RIO — Quando era criança, lá pelos 7, 8 anos, o potiguar Junior Dantas , da cidadezinha de Ipueira , ofereceu-se para interpretar o personagem principal de “O Pequeno Príncipe” , de Saint-Exupéry , numa montagem da escola. A resposta da professora não foi só um sonoro “não”. Ela fez questão de dizer ao menino que não existe príncipe negro , o que foi um duro golpe na inocência de quem ainda não tinha idade para entender o preconceito. Nada como o tempo e as voltas que o mundo dá. Hoje, o ator é a estrela do espetáculo “O Pequeno Príncipe preto” , que acaba de completar um ano em cartaz e que já foi assistido por mais de 50 mil pessoas, em diversos estados, tanto em teatros com entrada paga quanto em escolas públicas, gratuitamente.

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— Na infância, quando me candidatei, ouvi que tinha que ter olhos claros, pele branca e cabelos louros para ser nobre. Hoje, acho que tenho conseguido contribuir com o empoderamento, com a autoestima e com o imaginário de crianças e adolescentes negros por meio da peça que idealizei — diz, orgulhoso.

Dantas, que mora em frente à Praça Paris, na Glória, explica que o espetáculo, com texto e direção do diretor e ator Rodrigo França, emociona todos que se sentem excluídos por suas aparências.

— Baixo, magro, gordo, quem usa aparelho. Falamos muito sobre bullying e sobre a necessidade de respeitar a diversidade — diz o ator.

 A apresentação no Teatro Municipal de São Paulo, no Dia da Consciência Negra, marcou a memória do ator potiguar Foto: Rodrigo Menezes / Divulgação/Rodrigo Menezes
A apresentação no Teatro Municipal de São Paulo, no Dia da Consciência Negra, marcou a memória do ator potiguar Foto: Rodrigo Menezes / Divulgação/Rodrigo Menezes

A atriz Taís Araujo levou os filhos e saiu encantada.

— Acho a peça uma pérola. Como mãe, quero que meus filhos sejam público de teatro e acredito que para essa construção é importante que vejam um espetáculo bem produzido e bem interpretado e com o qual eles se identifiquem. “O Pequeno Príncipe preto” é exatamente tudo isso — elogia Taís.

Dantas diz que a conexão com as crianças é imediata. Ele vem sendo reconhecido pelos pequenos espectadores nas ruas e tem colecionado jovens fãs a cada apresentação:

— Os meus dreads no alto da cabeça já foram até copiados por um pequeno fã, Theo, que pediu à mãe um penteado igual ao meu.

Para o ator, que é formado em Jornalismo, representatividade importa — e muito. Ele se orgulha de já ter levado o espetáculo Brasil afora, principalmente para alunos de escolas públicas, que têm menos acesso à cultura.

—É muito importante dar a eles a oportunidade de ver personagens de destaque com os quais se identificam. Isso faz com que se sintam representados nas histórias —diz Dantas.

A atriz Ruth de Souza, que faleceu no mês passado, aos 98 anos, gravou uma participação no clipe de uma das músicas do espetáculo estrelado por Dantas Foto: AFA Video - Andre Alves - www.af / Divulgação/André Alves
A atriz Ruth de Souza, que faleceu no mês passado, aos 98 anos, gravou uma participação no clipe de uma das músicas do espetáculo estrelado por Dantas Foto: AFA Video - Andre Alves - www.af / Divulgação/André Alves

Ontem, os admiradores da montagem ganharam uma espécie de presente valioso. Foi lançado, em todas as plataformas digitais, um clipe com uma das músicas do espetáculo, chamada “A baobá”. O vídeo contou com a luxuosa participação da atriz Ruth de Souza, que faleceu mês passado, aos 98 anos. A canção é de autoria de João Vinícius Pereira, um jovem diretor musical, de 20 anos, filho de Vantoen Pereira.

—Nós gravamos no Parque do Flamengo, onde encontramos cinco baobás. Além da brilhante dona Ruth, contamos com a presença de mais de 30 crianças, com idades entre 2 e 10 anos —lembra Dantas, que também integra há nove anos a companhia teatral OmondÉ, comandada pela diretora Inez Viana.

A agenda da peça está fechada até janeiro de 2020. Este mês, “O Pequeno Príncipe preto” fará um roteiro itinerante, com espetáculos marcados na rede de teatros Firjan ( www.firjan.com.br/guidecultura ).

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