Há 23 anos, em 20 de junho celebra-se o Dia Mundial do Refugiado. A data é marcada por eventos e propõe uma reflexão sobre a situação de pessoas que foram obrigadas a abandonar seus países de origem pelos mais variados motivos — sejam perseguições, conflitos armados ou crises humanitárias. Uma das comemorações será hoje no Memorial às Vítimas do Holocausto, em Botafogo, que recebe a Feira Refúgio em Foco, reunindo gastronomia e produtos de outros países confeccionados ou trazidos por refugiados.
A cubana Leonela Labrada, de 52 anos, chegou ao Brasil há três meses com seus filhos Eduardo, de 28, e Arianela, de 23 anos. Os três solicitaram refúgio porque os jovens protestavam contra o governo de seu país de origem e eram perseguidos.
— Estou muito mais feliz e tranquila aqui. Vou ao evento na expectativa de conhecer outras pessoas que saíram de seus países. Quero fazer amigos. Ainda tenho um filho que está em Cuba cumprindo o serviço militar obrigatório. Gostaria que ele viesse para o Rio ficar com a nossa família. Tenho esperanças — diz.
![Feira Refúgio em Foco: evento terá edição hoje no Memorial às Vítimas do Holocausto, com opções de gastronomia e venda de produtos — Foto: Divulgação/ Marcos de Paula](https://s2-oglobo.glbimg.com/1m4DOik7IslpLuSZyHfj6niNRRU=/0x0:1600x1066/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2024/G/X/7JXbYkSz2kDFqvZSSCVA/refugio-em-foco-2023-feira-fotosmarcso-de-paula.jpg)
A Feira Refúgio em Foco vai começar às 10h e seguirá até as 17h, no Mirante do Pasmado. O local foi sugerido pela coordenação do Memorial às Vítimas do Holocausto por se conectar às temáticas ligadas à migração e ao refúgio da população mundial. O evento terá oficinas de conscientização climática, narração de histórias e roda de conversa para debater os desafios enfrentados pelos imigrantes.
— Vou vender artesanato. Faço brincos, colares e pulseiras. É engraçado que o público geralmente não se interessa pela nossa história, a pergunta que mais fazem é de onde eu sou. E acho muito bom poder fazer amizades com pessoas de outras nacionalidades —diz Mili Yanes, que saiu da Venezuela em 2012, chegou ao Brasil por Roraima e há seis anos se mudou para o Rio.
![Peças usadas nos países de origem dos refugiados estarão à venda na feira em Botafogo — Foto: Divulgação/ Marcos de Paula](https://s2-oglobo.glbimg.com/EZ5uagCegYTNkAKHtCShbvU7WL8=/0x0:6720x4480/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2024/w/i/o31HNJSHaKRnBxZTEQfw/refugiados10.jpg)
Vão participar empreendedores que residem no Rio e que são de países como Angola, Argentina, Colômbia, Congo, Uruguai e Venezuela. Eles vão expor uma série de produtos, roupas, tecidos africanos, bandeiras de todas as nacionalidades, objetos de decoração e acessórios (como bolsas e carteiras) e peças de artesanato, como brinquedos educativos de madeira e bijuterias em trançados, aço, pedras naturais e macramê.
Entre as opções gastronômicas, comida congolesa, doces e salgados argentinos e uruguaios e bacalhau a nata e bolinhos de bacalhau feitos por uma angolana.
Nascido na República Democrática do Congo, Rikler Makabu Sekelembe aprendeu as receitas do país com a mãe e suas cinco irmãs quando ainda era criança. Fez faculdade de Jornalismo e quis sair do país em busca de mais oportunidades. Chegou ao Brasil em 2010 e procurou trabalhar com gastronomia. Ele conta que foi assim que resgatou suas raízes.
— Vou preparar dois pratos. Um é o Makabu, que mistura feijão-fradinho e folha de mandioca com um toque de dendê. O outro é o Sekelembe, uma receita de folha seca de fumbka (uma espécie de espinafre que só é encontrada no Congo) e pasta de amendoim. É a maneira que encontrei de trazer conhecimento sobre a gastronomia africana —relata o congolês conhecido como Chez Kimberly.
![Receita colombiana. O patacon, um prato à base de banana, será servido na feira — Foto: Divulgação/ Marcos de Paula](https://s2-oglobo.glbimg.com/tPDAqfR8Oiy4h9QhNIxpXfClDms=/0x0:1600x1066/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2024/4/k/JYBJHWSUqANuoUAYLGQw/refugio-em-foco-2023-5-patacon-fotosmarco-de-paula.jpg)
Leandro Pereira, secretário Especial de Cidadania, destaca a importância da celebração da data e afirma que é uma oportunidade para proporcionar visibilidade à população de refugiados que mora no Rio.
— Buscamos estabelecer uma política pioneira de apoio a migrantes e refugiados. Bons exemplos são a criação do Centro de Referência e Apoio ao Imigrante e a promoção de eventos culturais como este, que são voltados para o empreendedorismo e possibilitam mais integração e muitas oportunidades para todos —diz.
Outras atrações
Um dos destaques do evento será o Mural do Clima, um bate-papo com Bob Montinard, articulador do projeto “Haiti aqui”, que conta a realidade dos haitianos no Brasil, começa às 10h30. A roda de conversa “Em diáspora: fluxos migratórios no século XXI”, com Dianduala Nguidi, Fabiana Chicralla Siqueira e Otávio Ávila, será às 14h30 e terá mediação de Wesley Ribeiro, do Memorial às Vítimas do Holocausto. O encerramento será com contação de história com Ana Luísa Lacombe, que vai falar sobre os povos brasileiros.
O evento é promovido pela Secretaria Especial de Cidadania, que deu início às celebração na quarta-feira, com a abertura da exposição “O mundo é nossa casa? Refúgios no Rio de Janeiro”, em cartaz no Museu Histórico Nacional, e com uma roda de conversa promovida no Centro de Referência e Atendimento para Imigrantes, na Gamboa.
No Brasil, a data será celebrada com eventos em Acre, Belém, Brasília, Manaus, Natal, São Paulo e Roraima. No Rio será realizado o Festival LED, no Museu do Amanhã e no Museu de Arte de Rio; e o Festival Rio Refugia, organizado neste fim de semana no Sesc Tijuca.
Tradição de acolhimento
A Lei de Refúgio brasileira (nº 9.474, de 1997) é considerada uma das mais avançadas do mundo, além de ser reconhecida internacionalmente por suas ações de ajuda humanitária e integração socioeconômica de refugiados e imigrantes. Hoje, são cerca de 43 mil refugiados reconhecidos e 193 mil solicitantes de refúgio. O grupo tem pessoas de 94 nacionalidades, de países como Síria, República Democrática do Congo, Colômbia e Cuba.
— O Dia Mundial do Refugiado também é uma oportunidade para reconhecer a contribuição que os refugiados podem trazer às sociedades que os recebem — ressalta Alexandre Magno, titular da Secretaria Nacional de Proteção Global.
O país tem também uma força-tarefa humanitária, a Operação Acolhida, que atende cidadãos venezuelanos que ingressam no país pela fronteira de Roraima. Apesar de venezuelano e de ter entrado no país por Roraima, Zhue Otaiza se mudou para o país por escolha própria. Ele comemora que não tenha uma história triste para contar, mas diz que nem por isso deixou de passar por muitas superações.
—Acho importante e necessária essa data, é um reconhecimento por parte da sociedade. Acredito que a ação de imigrar tem sido parte fundamental na história da humanidade.
Em nível mundial, o relatório “Tendências globais — Deslocamento forçado em 2019”, do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur), mostra que quase 80 milhões de pessoas se deslocaram até o final de 2019 por causa de guerras, conflitos e perseguições. Ainda de acordo com o Acnur, o deslocamento forçado é feito por mais de 1% da população mundial — ou seja, uma em cada 97 pessoas.
A cada ano o Dia Mundial do Refugiado tem um tema. Em 2024 é “Esperança longe de casa: por um mundo inclusivo com as pessoas refugiadas”. De acordo com o Acnur, o mote reflete a importância de buscar medidas que viabilizem a integração das pessoas refugiadas nas sociedades de acolhida e aborda a resiliência dos refugiados frente às mudanças climáticas e a busca de soluções duradouras para pessoas deslocadas à força nesse contexto.
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