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Homenagem a Arlindo Rodrigues rende celebração ao carnaval na correta Imperatriz

Na volta de Rosa Magalhães, escola resgatou tempos de luxo e glória com homenagem ao carnavalesco Arlindo Rodrigues
A verde e branco leva para a avenida o enredo "Meninos, eu vivi... Onde canta o sabiá. Onde cantam Dalva & Lamartine" Foto: Brenno Carvalho / Agência O Globo
A verde e branco leva para a avenida o enredo "Meninos, eu vivi... Onde canta o sabiá. Onde cantam Dalva & Lamartine" Foto: Brenno Carvalho / Agência O Globo

RIO — O retorno das escolas de samba a seu altar, após o cruel intervalo da pandemia, começou com uma homenagem à própria festa. Em sua volta ao Grupo Especial, a Imperatriz celebrou Arlindo Rodrigues, grande carnavalesco formulador do visual contemporâneo da festa (ao lado de Fernando Pamplona), relembrando desfiles históricos do artista.

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Pupila de Arlindo e Pamplona, a carnavalesca Rosa Magalhães permitiu-se desfilar no último carro, assinando trabalho de qualidade, que garantirá a escola na elite do samba.

Um pequeno acidente com a saia de uma das dançarinas da comissão de frente — que foi apenas regular — deverá custar décimos no julgamento. Thiaguinho e Rafaella Theodoro, casal de mestre-sala e porta-bandeira, apresentaram-se corretamente. O samba, no andamento correto, foi bem cantado pelos componentes, mas não empolgou o público.

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O ponto alto da verde, branco e dourado de Ramos foi o trabalho de sua carnavalesca. As alegorias perfeitas, bonitas e de leitura clara se destacaram. As fantasias bem concebidas, em materiais utilizados por Arlindo (acetato, por exemplo), compuseram o conjunto  —   mas algumas alas deixaram pedaços pelo caminho.

No último carro, a homenagem ao bicheiro Luizinho Drummond, patrono morto ano passado, se deu num telão, com imagens dele e de Arlindo. Nos fundos da alegoria, menção a um herdeiro genial do carnavalesco-enredo: Joãosinho Trinta. O Cristo Mendigo da Beija-Flor fechou a apresentação  —   e a volta definitiva  —   da Imperatriz.

O celebrado Arlindo Rodrigues

O carnavalesco homenageado Arlindo Rodrigues foi um dos mais celebrados do carnaval, responsável por assinar desfiles da escola nos anos 1980, garantindo à verde e branco dois títulos: em 1980 e 1981. Quem desenvolveu essa celebração foi a carnavalesca Rosa Magalhães, que retornou à agremiação após 11 anos.

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Carnavalesca mais velha de toda a Série Especial, a multicampeã Rosa Magalhães admitiu na avenida que estava à base de calmantes.

— É uma emoção e uma celebração muito grandes. Uma homenagem a pessoas tão importantes para a história da escola — afirmou Rosa, de 75 anos, que desfilou no último carro, com imagens do ex-carnavalesco Arlindo Rodrigues e do ex-presidente Luizinho Drummond, homenageados no enredo "Meninos eu vivi... Onde canta o sabiá, Onde cantam Dalva & Lamartine”, além de fotos do ex-carnavalesco Joãosinho Trinta.

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Rosa quebrou uma tradição pela qual era publicamente conhecida: o hábito de desfilar escondida. Discreta, ela havia se transformado numa aguardada surpresa dos próprios desfiles, já que há sete anos, pelo menos, vinha cruzando a Avenida sempre a bordo de seu carro alegórico preferido nas agremiações em que estava trabalhando. Optava, no entanto, pelas chamadas fantasias "de composição", escaladas para as laterais e andares mais baixos das estruturas, sem qualquer tipo de destaque.

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— Eu ainda prefiro vir escondidinha, mas me disseram que era melhor vir aqui e eu vim — brincou a "professora", que pode acompanhar a entrada de todas as suas criações na pista enquanto a alegoria estava estacionada na concentração.

Na brincadeira de se transformar em personagens de sua própria criação, Rosa esteve, em 2015, num carro da São Clemente que retratava um grande baile com motivos africanos no Theatro Municipal do Rio. O destaque era Zeni Pamplona, viúva do carnavalesco Fernando Pamplona, morto em 2013 e homenageado pela carnavalesca (e discípula) dois anos depois. Pamplona foi com quem Rosa começou a carreira no Carnaval, a exemplo do que também aconteceu com Rodrigues, agora homenageado pela antes colega de profissão e trabalho.

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A expectiva da agremiação da rainha de bateria Iza, que fez sua estreia no posto de majestade no Grupo Especial, se justifica: Rosa esteve em cinco dos oito títulos da escola.

— O enredo foi um antigo pedido do Luizinho Drumond (ex-presidente e patrono da escola). Eles eram muito amigos e seu Luizinho fez questão de trazer a Rosa de volta para desenvolver esse trabalho. Então, a presidente Cátia Drumond decidiu realizar o último desejo do pai — diz Bruno de Oliveira, assistente da carnavalesca.

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Confira o samba-enredo

"Meninos eu vivi... Onde canta o sabiá, Onde cantam Dalva & Lamartine"

Autor: Gabriel Melo

Intérpretes: Arthur Franco e Bruno Ribas

Eu ainda era menino
À luz de um nobre destino
O dom de tocar corações
E você era menina, suspirando poesias
Entre versos e estações
Quando a mão do grande professor
Nosso caminho em ouro enfeitou
Fui da ribalta à Avenida
Você tão linda foi cenário de amor (lá, lá, lá, lá, lá, lauê)
Fiz da orquestra da folia
O manequim das fantasias
Que João noutro tempo rasgou

Pega na saia rendada… pra ver o que eu vi!
Espelho da raça encarnada… Xica e Zumbi!
E descobrir novos Brasis na identidade
Canta, Salgueiro, ô, salve a Mocidade!

Lembro que o Imperador
Me levou pra ser rei em sua Assíria
Amanheceu e nós dois
Fomos uma só voz no altar da Bahia
Brilhei… neste palco iluminado
Dancei… Sabiá cantou meu apogeu
Numa derradeira serenata

Sonhei com Dalva e fui morar com Deus

Seu samba nascendo no morro
Ecoa do povo e ressoa no céu
Desperto em seus braços de novo
No mais belo traço da flor no papel
Se a saudade é certeza
Um dia a tristeza será cicatriz
Eterna seja! Amada Imperatriz!

Vem me encantar!
Volta pro seu lugar!
Seu manto é meu bem-querer
E lá do alto o Pai Maior mandou dizer
Quem viveu pra te amar, seguirá com você