O primeiro dia de desfiles do Grupo Especial na Marquês de Sapucaí marcou a performance de seis escolas de samba fluminenses na Avenida. Entre elas, apenas duas apostaram suas fichas em um enredo com tom mais político: o Salgueiro e a Grande Rio, que escolheram temas que tratam sobre a questão ambiental e indígena.
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Coincidentemente, as duas agremiações foram sorteadas pela Liga Independente das Escolas de Samba do Rio de Janeiro (Liesa) para desfilarem na terceira e quarta posição do dia, fazendo com que a Sapucaí fosse tomada pela discussão por mais de duas horas.
Terceira da noite, o Salgueiro se inspirou no povo Yanomami ao trazer o samba "Hutukara", que significa "a parte do céu do qual nasceu a terra". Em versos como, "falar de amor enquanto a mata chora" e "você quer me ouvir falar Yanomami para postar no seu perfil" levantaram o público.
As comissões traziam carros elétricos ácidos, a exemplo de um troco ensanguentado e uma retroescavadeira dourada. Neste contexto, foram discutidos temas como o aquecimento global, o desmatamento e a defesa da Amazônia.
Ao Globo, o sambista Dudu Nobre, um dos compositores de "Hutukara" exalta a importância do enredo: "Estou emocionado de ver na avenida. É uma temática essencial."
Em uma pegada menos crítica, a Grande Rio trouxe o samba "Nosso Destino é ser onça", inspirado em um mito indígena da tribo Tubinambá. Neste enredo, a onça representa um ser divino e poderoso, um símbolo da preservação ambiental e da resistência.
Na plateia, dezenas de foliões incorporaram a onça e vieram, inclusive, com referências ao animal que compõe a fauna brasileira.
Duas horas de sinergia
Enquanto Salgueiro e Grande Rio desfilavam, a pauta ambiental foi endossada pelas comunidades do Andaraí e de Duque de Caxias, que engrossaram o coro e cantaram cada palavra dos sambas. A escolha dos enredos é um reflexo do primeiro ano de governo do presidente Lula (PT), que foi criticado por suas políticas junto aos indígenas.
Após um logo período sem demarcações durante o mandato de Jair Bolsonaro (PL), o petista assumiu o governo em janeiro de 2023 com a promessa de voltar a acelerar o processo. Para isso, montou um ministério específico para o tema, o de Povos Indígenas, mas a avaliação de especialistas tem sido de que o processo decorre de maneira lenta.
Até dezembro, oito terras haviam sido demarcadas e, logo no início do ano, em fevereiro, uma crise com o povo Yanomami foi enfrentada. Em fevereiro passado, imagens de desnutrição grave, infecções respiratórias e doenças diarreicas chocaram o mundo, expondo a crise humanitária enfrentada por esta população.
Ao longo do ano, contudo, mortes decorrentes de malária e os índices de garimpo ilegal não diminuíram. Como mostrou o Globo em agosto, um balanço dos primeiros meses da emergência Yanomami, produzido pela Hutukara Associação Yanomami (HAY) em parceria com a Associação Wanasseduume Ye’kwana (SEDUUME) e Urihi Associação Yanomami indica que Lula não conseguiu frear significativamente o avanço da malária.