Rio Carnaval

Viradouro é campeã do carnaval 2020 do Rio de Janeiro

Com virada nos últimos quesitos, resultado premiou o luxo e a modernidade da escola de Niterói, campeã pela última vez em 1997
Viradouro contou na Avenida a história das Ganhadeiras de Itapuã Foto: Alexandre Cassiano / Agência O Globo
Viradouro contou na Avenida a história das Ganhadeiras de Itapuã Foto: Alexandre Cassiano / Agência O Globo

RIO - Depois de 23 anos, a Unidos do Viradouro voltou a ser campeã do carnaval carioca. Com o enredo "Viradouro de alma lavada", sobre As Ganhadeiras de Itapuã, vencedor do Estandarte de Ouro da categoria, a escola arrebatou a Sapucaí com um desfile luxuoso, a bateria do Mestre Ciça inspirada e um samba que pegou na Avenida. "Oh mãe, ensaboa, mãe", dizia o trecho que toda o público do Sambódromo cantou. Confira todas as notas da apuração do carnaval .

A Grande Rio, vice-campeã, liderou a maior parte da apuração, mas perdeu três décimos preciosos em evolução, penúltimo quesito . As notas abriram espaço para a virada da agremiação de Niterói, que terminou com os mesmos 269,6 pontos da tricolor de Duque de Caxias, mas venceu nos critérios de desempate. Em terceiro lugar ficou a Mocidade Independente (269,4 pontos), que homenageou Elza Soares . Completam o desfile das campeãs, no próximo sábado, Beija-Flor , Salgueiro e Mangueira . Estácio de Sá e União da Ilha foram rebaixadas para a Série A.

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Ainda no Sambódromo, após o fim da apuração, o carnavalesco Marcus Ferreira que, ao lado de Tarcísio Zanon, assinou o desfile vencedor da Viradouro, dedicou o título a sua mãe, que morreu há quatro meses, e disse que a vitória prova o valor da juventude. Marcus e Tarcísio foram contratados há apenas nove meses depois da conturbada saída de Paulo Barros, que havia sido vice-campeão com a escola em 2019.

— Minha mãe faleceu era incansável ao nosso lado. Esse título é principalmente para ela, onde ela estiver. Ela sempre me disse que ia me ver no Grupo Especial. Agora ela está me vendo campeão lá de cima — afirmou, emocionado.

Depois de 23 anos, a Unidos do Viradouro voltou a ser campeã do carnaval carioca. Com o enredo
Depois de 23 anos, a Unidos do Viradouro voltou a ser campeã do carnaval carioca. Com o enredo "Viradouro de alma lavada", sobre As Ganhadeiras de Itapuã, vencedor do Estandarte de Ouro da categoria, a escola arrebatou a Sapucaí com um desfile luxuoso, a bateria do Mestre Ciça inspirada e um samba que pegou na Avenida. "Oh mãe, ensaboa, mãe", dizia o trecho que todo o público do Sambódromo cantou.

Para Marcus, de 35 anos, o título prova o valor dos jovens carnavalescos. Ele chegou a fazer referência ao momento de sua saída da Império Serrano há três anos, mesmo após conseguir o retorno ao grupo Especial.

— Há três anos, coloquei a Império Serrano no (grupo) Especial, mas não acreditaram no meu talento e eu não continuei porque acharam que eu era jovem. Agora, quero dizer que a juventude faz pelo mundo. É muita emoção. Esse trabalho é reflexo do carinho da diretoria, da presidência, de como eles tratam os profissionais. Abriram a oportunidade para dois jovens carnavalescos que tem muito a fazer pelo carnaval — concluiu.

Presidente convoca torcida para o sábado das campeãs

Em um discurso emocionado na quadra da Viradouro, o presidente da agremiação, Marcelinho Calil, exaltou a força da comunidade e convocou os torcedores para o desfile das campeãs. Após acompanharem a apuração na Sapucaí, Marcelinho e seu pai, Marcelo Calil, ergueram a taça do carnaval 2020 no palco da sede da escola, em Niterói.

— No ano passado, pedi desculpas a todos porque a gente não tinha conseguido. Este ano, sem demérito com as outras escolas, a gente venceu porque estava preparado para isso.  A gente dá nosso suor e nosso sangue, a gente entrega tudo. Com a força e a emoção da comunidade a escola está pronta. Para ganhar carnaval hoje, tem que ganhar da Viradouro — discursou.

Presidente de honra da agremiação, Marcelo Calil também falou no palco. Em sua fala, destacou a velocidade da trajetória ascendente da Viradouro, que voltou a desfilar no Grupo Especial no ano passado.

— Eu prometi a vocês em 2016, está todo mundo lembrando? Disse: ‘Vamos fazer acontecer’. E foi mais rápido do que a gente pensava. Vencemos em 2017 o título para o acesso. Em 2018, tivemos um vice-campeonato com gosto de campeonato. E agora, finalmente, um campeonato. Em quatro anos de trabalho, conquistamos as melhores colocações. Vocês fazem parte disso. No sábado nós vamos, em peso, ensaboar a Sapucaí. Vamos mostrar que essa escola tem força para ser bicampeã.

'Dedico essa vitória a todas as mulheres'

Após sete anos à frente do posto de rainha de bateria da Viradouro, Raissa Machado se emocionou na quadra da escola com o título da vermelho e branco de Niterói. Ela dedicou a vitória às mulheres.

— Dedico essa vitória a todas as mulheres. Quero que elas saibam que podem ser o que quiserem — disse.

Quem também não parou de comemorar no palco da quadra da Viradouro foi o segundo casal de mestre-sala e porta-bandeira, Amanda Poblete e Jeferson Souza. A dupla estreou na agremiação no último desfile e teve o contrato renovado após um desempenho impecável em 2019. Este ano, o feito se repetiu: foram cinco notas dez.

— É a primeira vez que sou campeã na vida. Uma emoção que não sei explicar. Estou experimentando uma explosão de felicidade. A Viradouro é muito merecedora. Agora a gente vai curtir muito — disse Amanda.

Feminismo em foco

As Ganhadeiras de Itapuã eram escravas que, nos séculos XVIII e XIX, realizavam atividades remuneradas e, lavando roupa à beira da Lagoa do Abaeté ou vendendo quitutes, juntavam dinheiro para alforriar seus companheiros e outras mulheres.

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Foi um carnaval para tratar também de sororidade e empoderamento feminino, numa homenagem ainda ao grupo musical As Ganhadeiras de Itapuã, que participou em vários momentos da apresentação da vermelho e branco.

Bem diferente de outros desfiles com temática ligada à Bahia, o visual foi luxuoso e sofisticado, com toques de modernidade dos jovens carnavalescos Marcus Ferreira e Tarcísio Zanon. Os dois são casados e trabalhavam juntos pela primeira vez. Marcus estreou este ano no Grupo Especial, e Tarcísio só tinha uma passagem pela elite da folia.

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O dourado reduziu no abre-alas. E, na comissão de frente, uma "sereia" surgia num aquário com milhares de litros d'água . A grande preocupação da comunidade da Viradouro era com o quesito alegorias e adereços, depois de uma malha de LED do último carro ter apagado na Avenida. De fato, foi o quesito em que a escola perdeu mais pontos, três décimos no total.

A vitória dramática gerou uma grande comoção entre os torcedores que lotaram a quadra do Barreto, em Niterói. No início da leitura das notas do último quesito, ritmistas começaram a armar a bateria no palco, e integrantes se abraçaram em meio a lágrimas e sorrisos.

A última e única vez que a Viradouro tinha sido campeã foi em 1997, com Joãozinho Trinta. A escola passou anos na Série A e só voltou ao Grupo Especial em 2019, quando tinha sido vice-campeã. A vitoriosa de 2019 tinha sido a Mangueira.

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A apuração refletiu o equilíbrio deste carnaval. No primeiro quesito, fantasias, apenas o Salgueiro conseguiu as cinco notas 10. Com os descartes, Beija-Flor, Viradouro e Grande Rio também mantiveram a pontuação máxima. Em samba-enredo, a vermelho e branco da Tijuca caiu da liderança, deixando as outras três concorrentes na ponta. A leitura das avaliações das comissões de frente, a Viradouro perdeu um décimo, e Beija-Flor e Grande Rio arrancaram na frente.

O quarto quesito foi enredo, e a Grande Rio se isolou, com as agremiações de Nilópolis e Niterói um décimo atrás. Em alegorias e adereços, a tricolor de Duque de Caxias perdeu um décimo, mas manteve o primeiro lugar, com a Mocidade Independente na segunda colocação. Em bateria, a mudanças ocorreram apenas na vice-liderança, com a Beija-Flor à frente de Viradouro e Mocidade. Em mestre-sala e porta-bandeira, a Grande Rio ainda era a campeã, seguida por Beija-Flor, Viradouro, Salgueiro e Mocidade. No penúltimo quesito, harmonia, é que a Viradouro virou o jogo, assumindo a liderança após Grande Rio e Beija-Flor perderem décimos preciosos. A decisão final veio em evolução.