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Crise na Saúde do Rio: delação premiada, corrupção e processo de impeachment; confira a linha do tempo

Novo capítulo é o possível acordo de delação que teria sido firmado pelo ex-secretário de Saúde do Rio, Edmar Santos
O ex-secretário de Saúde Edmar Santos prometeu entregar provas contra Witzel em uma delação premiada à PGR Foto: Vera Araújo/Agência O Globo
O ex-secretário de Saúde Edmar Santos prometeu entregar provas contra Witzel em uma delação premiada à PGR Foto: Vera Araújo/Agência O Globo

RIO — A crise na Saúde do estado do Rio de Janeiro ganhou um novo capítulo nesta terça-feira, dia 14. Ex-secretário de Saúde do Rio, Edmar Santos acertou com a Procuradoria-Geral da República (PGR) um acordo de delação em que entrega informações sobre corrupção na saúde do Estado envolvendo o governador Wilson Witzel. Ainda não há confirmação, no entanto, de que o acordo já tenha sido assinado. Segundo os envolvidos na negociação, a expectativa é que a homologação aconteça no retorno do recesso do judiciário, em agosto, pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).

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O governador Wilson Witzel foi a público, através de uma rede social e reafirmou o compromisso com a população do Rio de governar com ética e transparência.

"Jamais me desviei do caminho da lei e, desde janeiro de 2019, do objetivo de reerguer o nosso Estado. Nem eu e nem ninguém pode ser acusado de qualquer irregularidade sem prova", escreveu Witzel em seu Twitter .

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Em entrevista ao GLOBO, o governador disse estar "tranquilo" em relação à possível delação de Edmar.

— Se ele falou no meu nome, está mentindo. Não há a menor possibilidade de ele ter prova contra mim de ato ilícito. Estamos no início do processo criminal, e o que a Justiça tem feito tem que ser respeitado. Tem muita coisa mal explicada, como de onde veio o dinheiro (R$ 6 milhões encontrados em dinheiro vivo pela polícia) — disse Witzel, por telefone.

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Os problemas que cercam a área começaram junto com a pandemia do coronavírus, quando foi deflagrada operações após o Ministério Público Federal apontar para um grande esquema na cúpula do governo do estado envolvendo compras da Secretaria estadual de Saúde. As suspeitas de desvio de dinheiro público vieram a público na primeira quinzena de abril, com a prisão do ex-subsecretário de Saúde Gabriell Neves .

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Desde então, vários personagens do suposto esquema de corrupção, investigados em operações distintas, foram presos ou sofreram buscas e apreensão em suas residências e escritórios. Entre eles, o governo do Rio, Wilson Witzel, e a primeira-dama, Helena Witzel. Até o momento, foram três operações: Mercadores do Caos, Placebo e Favorito.

Além disso, no início de junho, a Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) decidiu instaurar processo de impeachment contra Wilson Witzel . Dos 69 deputados votantes, todos foram favoráveis ao início do processo de afastamento. governador Wilson Witzel.

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Confira a linha do tempo da crise da Saúde do Rio:

  • 4/4/20: O governador Wilson Witzel exonera a médica Mariana Scardua , subsecretária de Gestão da Atenção Integral à Saúde da Secretaria de estado de Saúde, e o chefe de gabinete dela, Luiz Octávio Mendonça, por divergirem da conduta do então subsecretário de Saúde, Gabriell Neves, nas compras sem licitação.

  • 11/4/20: O então subsecretário estadual de Saúde, Gabriell Neves, é afastado do cargo pelo então secretário de Saúde Edmar Santos. Neves era responsável pelos contratos emergenciais, inclusive os que somaram quase R$ 1 bilhão para o combate da Covid-19. Mais de R$ 800 milhões seriam para a OS Iabas, que faria a gestão dos hospitais de campanha do estado. Havia suspeitas de irregularidades que seriam averiguadas por uma auditoria.

  • 7/5/2020: Gabriell é preso na Operação "Mercadores do Caos" , conduzida pela Polícia Civil do Rio e pelo Ministério Público. Ele é suspeito de integrar uma organização criminosa que visava a obter vantagens em contratos emergenciais, sem licitação, para a aquisição de respiradores pulmonares utilizados no tratamento de pacientes graves com Covid-19.  Em entrevistas, afirmou que o ex-secretário estadual de Saúde, Edmar Santos, tinha ciência de todos os contratos. Além dele, foram presos preventivamente Gustavo Borges da Silva, que assumiu a subsecretaria de Saúde após a exoneração de Neves, e Aurino Batista de Souza Filho. Aurino é dono da 2A2 Comércio Serviços e Representações LTDA, empresa de informática que ganhou contrato para fornecer respiradores para o estado. Outras pessoas, consideradas laranjas, também foram detidas.

  • 13/5/2020: O empresário Maurício Fontoura , controlador da empresa ARC Fontoura, é preso por susposta fraude na venda de respiradores para o governo do estado. A investigação descobriu que ele é o controlador das três empresas que apresentaram propostas ao estado. A ARC Fontoura vendeu 400 aparelhos, mas só entregou 52. Os ventiladores mecânicos, no entanto, não são recomendados para o tratamento da Covid-19. O custo total da compra foi de R$183,5 milhões. O governo já havia pago parte deste valor, mas vai tentar reaver o dinheiro na Justiça. O governo cancelou 44 dos 66 contratos firmados para o combate da pandemia.

  • 1 4/5/2020: O empresário Mário Peixoto, entre outras pessoas, é preso na "Operação Favorito" , como parte das investigações da Operação Lava-Jato no Rio de Janeiro. Ele é acusado de chefiar um esquema envolvendo mais de 100 pessoas físicas e jurídicas , de contratos firmados com o governo do Estado a partir de 2012, na gestão do ex-governador Sérgio Cabral. Para manter o plano em funcionamento, o esquema, segundo as investigações da PF envolveu o pagamento de propinas para conselheiros do Tribunal de Contas do Estado, deputados, como Paulo Melo , e agentes públicos. Contratos com várias dessas empresas foram renovados já na gestão do governador Wilson Witzel, que assumiu em 2019.

  • 15/5/2020: O governador do Rio, Wilson Witzel, é incluído em um inquérito no Superior Tribunal de Justiça (STJ) que investiga um suposto esquema de corrupção na compra, pelo estado, de respiradores destinados ao tratamento de pacientes infectados com o coronavírus. Luiz Roberto Martins Soares , também preso na Operação Favorito, faz supostas citações a Witzel sobre contrato com OS Unir da Saúde , que estava proibida de fazer contratos com o poder público.

  • 17/5/2020 : O governador Wilson Witzel exonera o secretário estadual de Saúde Edmar Santos por causa de "falhas na gestão de infraestrutura dos hospitais de campanha para atender as vítimas da Covid-19" de acordo com o governo. Santos é mantido na comissão de notáveis que auxiliam o estado no enfrentamento do coronavírus.

  • 19/5/2020: Especialista em HIV, Fernando Ferry assume a Secretaria estadual de Saúde, no lugar de Edmar Santos.

  • 22/5/2020: TCE responsabiliza ex-secretário de Saúde por superfaturamento na compra de respiradores e sugere que Edmar Santos devolva R$ 36 milhões aos cofres públicos por irregularidades na contratação das empresas.

  • 26/05/2020: A "Operaçao Placebo" faz busca e apreensão em vários endereços ligados ao governador Wilson Witzel e à primeira-dama Helena Witzel, incluindo o Palácio Laranjeiras, residência oficial. Levaram celulares e computadores de ambos. Um dos motivos para a deflagração da operação foram os documentos apreendidos na Operação Favorito. Entre os quais  um contrato entre o escritório de advocacia de Helena Witzel e a empresa DPAD Serviços Diagnósticos Ltda, que possui como sócio Alessandro de Araújo Duarte, apontado como operador do empresário Mário Peixoto. Witzel nega participação em desvios e acusou o presidente Jair Bolsonaro de usar a PF para perseguição política.

  • 27/05/2020: A Justiça suspende nomeação do secretário-extraordinário do Acompanhamento da Covid-19, Edmar Santos, ex-secretário de Saúde , feita pelo governador Wilson Witzel. No mesmo dia, o deputado estadual Luiz Paulo protocola pedido de impeachment de Witzel na Alerj por haver 'indícios muito robustos' de que o governador está envolvido, 'por ação ou inação', nos desvios investigados pela Polícia Federal.

  • 28/05/2020: TCE suspende pagamentos do governo à OS Iabas, questiona  custos de R$ 4,5 milhões mensais em tendas e acusa falta de 'capacidade técnica' da entidade. Hospitais de campanha não têm mais data de inauguração. Só o do Maracanã está em funcionamento desde o fim de abril.

  • 29/05/2020 : Iabas deixa a administração dos seis hospitais de campanha que estavam prometidos para final de abril e início de maio. Mas segue responsável por concluir obras e equipar unidades. Instituto continua responsável pela unidade do Maracanã.

  • 3/6/2020: Iabas é afastado da construção e da gestão dos hospitais de campanha no Rio. Fundação Estadual de Saúde assume as obras e a direção dos espaços. Carrinhos de anestesia comprados no lugar de respiradores foram a gota d'água para saída da entidade.

  • 4/6/2020: Secretário estadual de Saúde, Fernando Ferry, que assumiu o cargo no dia 19/5, critica decisão do governo em construir sete hospitais de campanha: 'superdimensionamento' .

  • 5/6/2020: Governo do Rio pede bloqueio de bens do Iabas na Justiça para ressarcir os cofres públicos. Até o momento, o estado já repassou  R$ 256,5 milhões dos R$ 836 milhões previstos em contrato.

  • 8/6/2020: Vem a público que Witzel recebeu R$ 284 mil por parecer de 14 páginas para processo do empresário Mário Peixoto, valor considerado acima do mercado. Dinheiro foi pago pelo escritório do advogado Lucas Tristão , ex-secretário de Desenvolvimento Econômico do estado, em 2018. A petição foi  ajuizada pela empresa Atrio Rio, que pertenceu até março à família do empresário Mário Peixoto , para tentar anular uma licitação da Secretaria Estadual de Educação do Rio em 2018.

  • 09/06/2020 : Justiça determina que 97 respiradores retidos no Galeão sejam entregues à Secretaria Estadual de Saúde. Os ventiladores foram importados pela MHS Produtos e Serviços, controlada por Glauco Octaviano Guerra, por meio das sociedades SKN do Brasil Importação e Exportação Ltda., SKN Indústria e Comércio do Brasil Ltda. e Santa Fe Trading Importador e Exportação Ltda. Segundo as investigações do Ministério Público Estadual, eles foram adquiridos com parte do valor de quase R$ 19 milhões pagos antecipadamente à empresa pelo Estado do Rio e desviadas dos cofres públicos estaduais.

  • 10/6/2020: Alerj decide instaurar processo de impeachment contra Wilson Witzel . Dos 69 deputados votantes, todos foram favoráveis ao início do processo de afastamento.

  • 18/6/2020: Superintendente de Orçamento da Saúde é preso em mais uma etapa da Operação Mercadores do Caos contra desvio de dinheiro público destinado à compra de respiradores para pacientes com Covid-19. Carlos Frederico Verçosa Duboc foi contratado na gestão de Edmar Santos na pasta e continuou na equipe do atual secretário, Fernando Ferry.

  • 18/6/2020 : Hospital de Campanha de São Gonçalo é inaugurado com um mês e meio de atraso. Somente dois dos sete prometidos até o dia 30 de abriu ficaram prontos — o primeiro foi o do Maracanã. Na abertura, o secretário de saúde afirmou que espera uma "segunda onda de Covid-19" após reabertura do comércio no Rio.

  • 19/6/2020 : Ferry se reúne com sua equipe técnica, que fez um estudo afirmando que os hospitais de campanha não devem abrir e que não são necessários. No documento, eles afirmam que "não é recomendado a abertura dos cinco hospitais de apoio estantes como leito para Covid-19 e a readequação dos hospitais já inaugurados a demanda atual da população".

  • 22/6/2020 : Fernando Ferry entrega o cargo de secretário de saúde . Em um vídeo enviado à "TV Globo", o médico explicou que "tentou resolver os graves problemas da saúde". Ele deixará o cargo com mais 30 assessores que chegaram junto com ele há pouco mais de um mês, quando assumiu a secretaria no lugar de Edmar Santos , exonerado por Witzel em meio às investigações de irregularidades na Saúde.

  • 22/6/2020 : O coronel médico do Corpo de Bombeiros Alex da Silva Bousquet , de 43 anos, é anunciado como o novo secretário. É o terceiro que está no cargo do governo Witzel em apenas seis meses deste ano.

  • 24/6/2020: Edmar Santos falta à audiência na Assembleia Legislativa Estadual do Rio (Alerj), que apura os gastos sobre as compras emergenciais feitas no combate ao coronavírus. Santos era aguardado para uma oitiva virtual convocada pela Comissão de Fiscalização e de Saúde.

  • 06/07/2020 : Após faltar ao primeiro depoimento marcado na Alerj, Edmar Santos compareceu à oitiva , mas se recusou a responder às perguntas dos deputados. O ex-secretário alegou que utilizaria seu direito ao silêncio por orientação dos advogados, já que está sendo investigado por esses fatos em inquérito do Superior Tribunal de Justiça (STJ). No mesmo dia, a Justiça determinou a quebra de sigilo fiscal e bloqueio de bens de ex-secretário de Saúde.

  • 10/07/2020: Edmar Santos é preso na sua casa, em Botafogo, na Zona Sul do Rio, em mais um desdobramento  da Operação Mercadores do Caos , deflagrada pelo Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), por meio do Grupo de Atuação Especializada no Combate à Corrupção (Gaecc), com apoio da Coordenadoria de Segurança e Inteligência (CSI/MPRJ) e da Delegacia Fazendária da Polícia Civil. A Justiça determinou, na ocasião, arresto de bens e valores dele até o valor de R$ 36,9 mihões, equivalente a recursos desviados em contratos fraudados para aquisição de equipamentos durante a pandemia. Ao efetuar a prisão, os promotores apreenderam um total de mais de R$ 6 milhões em dinheiro nos endereços relacionados a ele.

  • 14/07/2020 : Ex-secretário Edmar Santos acertou com a Procuradoria-Geral da República (PGR) um acordo de delação em que entrega informações sobre corrupção na saúde do Estado envolvendo o governador Wilson Witzel. Segundo os envolvidos na negociação, a expectativa é que a homologação aconteça no retorno do recesso do judiciário, em agosto, pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).