Rio
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Por Jéssica Marques e Carmélio Dias — Rio de Janeiro

Centenas de motoristas de caminhões e carretas fizeram, na manhã desta segunda-feira, uma manifestação contra roubo de cargas no Estado do Rio. A mobilização reuniu empresários e motoristas autônomos. A concentração teve início antes das 6h no Mercado São Sebastião, na Penha, Zona Norte do Rio. O grupo se deslocou em fila pela Avenida Brasil e voltou à Penha por volta de meio-dia, onde se desmobilizou. O protesto contou com dois carros de som, com as faixas "Roubo de cargas: já morreram três motoristas, quantos mais ainda precisam morrer?" e "Roubo de cargas agride a sociedade, gera mais desemprego e produtos mais caros à população". Segundo o Centro de Operações Rio, o protesto causou retenções durante a manhã na Avenida Brasil.

— A gente vive no campo minado. Quando eles vêm para assaltar carga, vêm com tudo. Não é um assaltantezinho com um 38, é armamento pesado. Não tem nem como reagir, entendeu? — diz o caminhoneiro Luís Carlos da Silva, de 44 anos.

O caminhoneiro Luis Carlos da Silva: 'a gente vive num campo minado' — Foto: Fabio Rossi
O caminhoneiro Luis Carlos da Silva: 'a gente vive num campo minado' — Foto: Fabio Rossi

Com 20 anos de estrada, ele conta que já foi assaltado três vezes e passou a tomar cuidados especiais. Além da avenida Brasil, ele aponta a rodovia Washington Luís e o Arco Metropolitano como pontos críticos. Os mecanismos de rastreamento e bloqueio dos veículos também são fonte de preocupação.

— Botar rastreador, tudo bem, mas travar o caminhão é inadequado porque põe em risco a nossa vida. Tem muitas empresas aí que os motoristas desistem de trabalhar por ter esses mecanismos de segurança. Além disso, a gente pega sempre a pista seletiva, evita lugares que passam beirando em favela, porque se cortar por algum raio que tem uma comunidade, pode ter certeza que você vai ser parado e vai ser levado para dentro e seu caminhão descarregado — diz.

No mês passado, o caminhoneiro Luis Carlos Gomes Lavinho, de 46 anos, com 25 anos de experiência nas estradas, passou por momentos de tensão quando a carreta que dirigia foi abordada na altura de Austin, em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense.

Luiz Carlos Gomes já teve o caminhão alvejado após abordagem de motoqueiro no Arco Metropolitano — Foto: Fabio Rossi
Luiz Carlos Gomes já teve o caminhão alvejado após abordagem de motoqueiro no Arco Metropolitano — Foto: Fabio Rossi

—Um carro prata me fechou, eu olhei pro lado tinha um cara no teto solar com a pistola apontada pra mim e o outro na porta também armado. Mandaram encostar a carreta, me ameaçaram o tempo todo de morte, mas eu falei que tava com o caminhão vazio. Eles começaram a dizer que iam me matar se eu tivesse mentindo, rodaram uns três quilômetros comigo e depois me liberaram, chegaram à conclusão de que tinham abordado o caminhão errado e foram embora — lembra.

Essa não foi a primeira vez que Luis Carlos Lavinho foi alvo das quadrilhas de roubo de cargas. No início do ano passado o caminhão onde estava chegou a ser alvo de tiros quando passava pelo Arco Metropolitano.

— Desse vez eu estava num caminhão com escovas de dente. Um cara de moto mandou eu encostar a carreta, aí ele veio para o meu lado e eu joguei o caminhão em cima, mas não consegui derrubar ele, que estava numa moto muito potente e sem carona. Aí eu acessei a alça para pegar a Dutra e ele começou a dar vários tiros no caminhão, chegou a pegar no retrovisor, mas graças a Deus não aconteceu nada de pior — contou o caminhoneiro.

Alessandra Guedes, de 45 anos, foi a primeira a parar a carreta no pátio próximo à Avenida Brasil. Motorista há mais de dez anos e acostumada a fazer viagens no Nordeste e Sudeste do país, ela conta que já presenciou assaltos e arrastões na cidade:

— O Rio certamente é a região mais violenta. As obras na Avenida Brasil congestionam o trânsito e facilitam a ação de bandidos das comunidades ao entorno. Estou acostumada a andar na madrugada e geralmente fico dois dias na estrada. Na empresa em que trabalho, que fica na Vila Kennedy (na Zona Oeste da capital), eles ensinaram a gente a ter uma direção evasiva, que é manter distância, ficar a 360 graus e olhar no retrovisor a cada dois segundos para ver se não está sendo seguido.

A motorista, que é carioca de Padre Miguel (também na Zona Oeste), comenta que se arriscou na profissão pela paixão em pegar a estrada. Mãe de um jovem de 20 anos, ela disse que a classe anda desvalorizada e exposta ao perigo.

— Temos que ter jogo de cintura para lidar com a violência da cidade, principalmente a gente que é mulher. A gente fica propensa ao roubo de cargas e a assaltos. Eles entram na lateral, pegam a arma e mandam encostar. Temos grupos de amigos que ficam informando essas ocorrências, mas não há policiamento suficiente nas vias.

Equipes da CET-Rio e da Polícia Militar acompanharam os manifestantes durante o trajeto em direção à Rodovia Presidente Dutra. Os motoristas deixaram o ponto de concentração por volta das 7h48 no sentido Pavuna, onde se encontraram com outros para trafegar no sentido Into, no Caju. A CET-Rio e a Polícia Militar seguiram os veículos, num deslocamento organizado e sem tumulto.

Mudança no enquadramento no roubo ou furto de cargas

Uma reportagem do GLOBO publicada no último domingo revelou que o aumento de 44,1% nos roubos de carga em março, comparado ao mesmo mês do ano passado (de 340 para 490), fez com que a Polícia Civil retomasse uma portaria de janeiro do ano passado que não estava sendo seguida. Desde abril, a cúpula da corporação tem enviado alertas em grupos fechados de WhatsApp a seus integrantes estabelecendo critérios para o enquadramento do roubo ou furto de carga. Para o registro e investigação, as mercadorias têm que ser transportadas por caminhões e vans. Quando a carga for roubada de veículos com menos de 1,5 tonelada, como motos e carros comuns que fazem entregas, a classificação poderá ser como roubo de rua ou veículo. Essa mudança traz como consequência a redução do índice.

Outros critérios

De acordo com a portaria, os veículos de passeio com menos de 1,5 tonelada só podem ser classificados na modalidade roubo de carga se tiverem quatro requisitos: a placa vermelha, a nota fiscal, a inscrição no Registro Nacional de Transportadores Rodoviários de Carga e o seguro obrigatório de responsabilidade civil do transportador.

Ao final, a informação é enviada para o Instituto de Segurança Pública (ISP), responsável pela análise e divulgação dos dados, uma vez que os critérios para definir os delitos nos registros de ocorrência.

Morte durante abordagem

Um dos indicativos que apontam a escalada de violência que os motoristas de caminhões de carga enfrentam é o risco de morte. Os manifestantes apontam pelo menos três perdas ocorridas entre colegas de profissão. Em outubro do ano passado, Jean Lucas Benjamin de Oliveira Alves, de 31 anos, morreu ao ser baleado quando fazia uma viagem na Avenida Brasil, altura de Bonsucesso, na Zona Norte da cidade. Ao ser atingido, ele perdeu o controle do veículo, colidiu em uma mureta e foi arremessado.

Jean Lucas dirigia o terceiro de um comboio de três caminhões, que, diferente de outras ocasiões, não contava com escolta. Os caminhoneiros andam em grupos para evitar abordagens. Ele acabou se separando dos demais e em seguida foi atingido na cabeça. O veículo tinha ao menos 15 marcas de tiros.

Disque-denúncia

O Disque Denúncia e o Sindicato das Empresas do Transporte Rodoviário de Cargas e Logística do Rio (SINDICARGA) firmaram parceria para tentar localizar os locais usados pelas quadrilhas especializadas em roubo de carga para armazenar e organizar o comércio ilegal das mercadorias roubadas.

Disque Denúncia: entidades pedem informações sobre armazenamento e comercialização de produtos roubados dos caminhões — Foto: Divulgação
Disque Denúncia: entidades pedem informações sobre armazenamento e comercialização de produtos roubados dos caminhões — Foto: Divulgação

— O prejuízo causado com o roubo e o comércio ilegal das cargas, reflete no dia a dia da sociedade. Quem compra carga roubada, compactua com o crime — observa Renato Almeida, coordenador-geral do Disque Denúncia. Para ele, a participação da população é fundamental para ajudar no trabalho da polícia para coibir essa modalidade de crime.

Levantamento feito pela Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan) estima em R$ 388 milhões o prejuízo causado pelo roubo de cargas no estado só no ano passado. A média de casos este ano — embora menor que a de 2022 comparando dados do mesmo período — continua muito alta: são 12 casos registrados, em média, por dia.

— Essa situação traz consequências desastrosas, pois culmina com a evasão das empresas para outros Estados, desabastecimento de produtos aos cidadãos e esvaziamento dos portos do Rio de Janeiro, com navios cargueiros sendo direcionados para outros portos brasileiros — disse Silvio Carvalho, presidente do SINDICARGA

Informações sobre locais usados por bandidos para armazenar ou comercializar produtos de cargas roubadas podem ser passadas, com garantia de anonimato, pelos telefones (21) 2253-1177 ou 0300 253-1177 (Interior). Ambos possuem também WhatsApp anônimo, que remove ou modifica informações que possam identificar a pessoa que manda a mensagem. Outro canal é o aplicativo “Disque Denúncia RJ”.

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