No relatório de conclusão do inquérito que apura os mandantes da morte de Marielle Franco e Anderson Gomes, os investigadores da Polícia Federal destacaram as ações feitas por Rivaldo Barbosa, então chefe da Polícia Civil, Giniton Lages, delegado responsável pelo caso, e seus subordinados para atrapalharem a investigações. Entre eles está a não consulta correta às imagens de segurança que poderiam ter gravado o carro e a criação de uma falsa testemunha que tentou direcionar como mandante do crime o ex-vereador Macero Sciliano.
O primeiro apontamento feito pela PF é logo após o crime acontecer, em 18 de março de 2018. O relatório classifica de "negligente" a forma em que foram feitas as colheitas das imagens do Cobalt prata, em que estavam Élcio de Queiroz e Ronie Lessa. A Polícia Federal critica que, ao contrário do feito em outras investigações, no caso de Marielle e Anderson, a Delegacia de Homicídios não sabia até a delação de Elcio, no ano passado, qual tinha sido o trajeto feito pelos executores até a Barra da Tijuca.
Outro ponto foi um erro técnico atribuído por Geniton Lages que teria impossibilitado sua equipe de perceber que o Cobalt aparecia no vídeo em uma direção que os policiais não foram recolher as imagens. Os investigadores rechaçam a justificativa elencando que para ser possível a justificativa do delegado, diversos acontecimentos técnicos não comuns teriam que ocorrer.
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Testemunha plantada
Em sua delação premiada, Ronnie Lessa conta que três semanas após o crime encontrou com Domingos Brazão e Chiquinho Brazão, apontados como mandantes dos assassinatos. Eles teriam tranquilizados os executores dizendo que Rivaldo (Barbosa) estaria "virando o canhão para outro lado".
Dias depois, em 27 de abril, a Polícia Civil recebeu uma denúncia em que o PM Rodrigo Ferreira, o Ferreirinha, apontou que o crime teria sido encomendado por Marcelo Sciliano com intermediação do ex-Pm Orlando Oliveira de Araujo, o Orlando Curicica — o que se provou falso.
Mensagens recuperadas pela Polícia Federal, mostram que Ferreirinha já tinha combinado depoimentos com a Delegacia de Homicídios, em troca de ajudas pessoais. Em uma conversa com Marco Antônio de Barros Pinto, conhecido como Marquinho, braço-direito de Giniton Lages, eles marcam um encontro para "alinha um monte de coisas futuras". Em um áudio, Marquinho orienta como Ferreirinha deve depor à Justiça na investigação sobre um homicido em que ele era testemunha:
"Você chegou muito em cima, a gente acabou não fazendo a atividade que eu queria (...) . Mas sem se vitimizar, sem se vitimizar, aquela coisa que a gente já conversou tá, então se concentra" enviou Marquinho.
Sumiço de celular
Em um dos seus depoimentos, Ferreirinha nomeou duas pessoas que teriam sido escolhidas para conseguir um carro clonado para ser usado no crime. Dias depois, o nome de Eduardo Siqueira apareceu no inquérito, já que ele teria vínculo com Marcelo Siciliano. A delegacia então ouviu em depoimento Vinicius dos Santos Pacheco, que respondia a uma ação por receptação de veículos roubados. Ele contou que Eduardo trabalhava com clonagem de carros para milicianos.
Eduardo foi preso pela DH em flagrante e disse ter manuseado um Cobalt prata e revendido a milicianos de Curicica, mas que não sabia se era o mesmo carro usado nos assassinatos de Marielle e Anderson. Ele também autorizou que a polícia periciasse seu celular.
O Ministério Público pediu à Justiça que o aparelho foi periciado e o pedido foi aceito pelo Tribunal de Justiça. No entanto, o aparelho nunca foi encontrado. A Polícia Civil disse na época que o celular foi encaminhado ao Instituto de Criminalística Carlos Éboli – ICCE, que diz nunca ter recebido o aparelho. O telefone também não foi encontrado no depósito da Delegacia de Homicídios.
À Polícia Federal no ano passado, Eduardo contou que realmente vendeu um carro, mas que era de um modelo diferente. Também disse ter sido coagido a reconhecer pessoas que não conhecia e que jamais tinha visto Orlando Curicica.
"Inclusive, caso as peças encaixadas pela DHC, no que tange à atribuição da clonagem do veículo a Eduardo, partissem de premissas hígidas, a análise do conteúdo do aparelho seria de fundamental importância para a identificação do autor mediato dos delitos", diz trecho do relatório da PF.
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