Pensado inicialmente como projeto de futuro, a inteligência artificial (IA) já faz parte do nosso cotidiano. Para além de pesquisa em plataformas como o ChatGPT, a tecnologia pode já ter “cruzado” com alguém pela rua, e a pessoa nem ter reparado. Afinal, no Rio, a IA é usada, por exemplo, para auxiliar em diagnósticos de exames, identificar vazamentos de água e até programar sinais de trânsito. E a previsão é que seu uso seja ampliado nos próximos meses.
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No metrô, as linhas 1, 2 e 4 estão há um mês com um sistema que usa IA para minimizar o tempo de resposta a incidentes. O software, associado às imagens geradas por câmeras, é programado para conhecer uma “cena padrão”: o trilho e o trem passando, explica Apolo Araújo, gerente de TI da MetrôRio. Caso algo diferente disso seja detectado, um alerta é emitido para o centro operacional da concessionária. Ao perceber um “gatilho”, que pode ser a queda de um passageiro nos trilhos ou o acesso de um animal, o sistema destaca imediatamente a imagem dessa ocorrência para os operadores.
— Já aconteceu de o cliente deixar celular, carteira ou cartão cair na via. Esse novo sistema facilita a resposta do centro de controle, que consegue identificar o problema e acionar a equipe para minimizar o impacto na operação — conta Araújo.
Na prática, qualquer coisa que use IA precisa de uma programação por trás. Ela pode ser treinada com dados do passado e também ser alimentada em tempo real com novas informações. Em São Paulo, por exemplo, a prefeitura monitora a qualidade do asfalto a partir de dispositivos acoplados a 108 veículos, incluindo táxis e carros de aplicativo, que circulam pela cidade.
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Sinal verde
Chefe da linha de IA do Programa de Sistemas e Computação da Coppe/UFRJ, o professor Carlos Eduardo Pedreira considera o momento que estamos vivendo como a “nova revolução industrial”. Segundo suas projeções, a tendência é que as pessoas tenham cada vez mais tempo disponível e possam desfrutar de mais momentos de lazer e entretenimento.
— São modelos que precisavam de máquinas enormes, que não existiam 20 anos atrás. Outro fator muito importante que abriu as portas para o que estamos vendo agora é que as pessoas passaram a ter um computador no seu bolso (celular): como a IA necessita de dados, as pessoas passaram a emiti-los e também a recebê-los o tempo todo — explica Pedreira.
Em maio, o BNDES anunciou o investimento de R$ 29 milhões no Centro de Operações Rio (COR), destinado à implementação da IA no cotidiano do órgão de monitoramento da cidade. Parte desse montante (R$ 5 milhões) é para implantar uma rede de sinais de trânsito inteligentes, o que permitirá que a programação seja ajustada em tempo real de acordo com a leitura do tráfego no momento.
Mas já é possível ver outro projeto do tipo em funcionamento: o sistema Green Light (sinal verde, em português), do Google, que usa a IA para criar recomendações para que as companhias de tráfego das cidades revisem suas estratégias, como o tempo dos semáforos.
O objetivo é diminuir as emissões de dióxido de carbono de veículos — a estimativa é que a parada de veículos seja reduzida em 30% nesses locais. “Quando começamos a trabalhar com uma cidade, o algoritmo Green Light investiga padrões de direção, usa insights do Google Maps e fornece recomendações de cruzamentos para otimizar, com base no impacto esperado da otimização”, informa o Google.
Em parceria com a CET-Rio, o Green Light opera em cinco cruzamentos no Rio: na Estrada do Monteiro com a Rua Esculápio, em Campo Grande; na Avenida Amaro Cavalcanti com Rua Adolfo Bergamini, no Engenho de Dentro; na esquina das ruas da Passagem e Arnaldo Quintela, em Botafogo; e em dois pontos da Avenida Atlântica: nos encontros com a Rua Constante Ramos e a Avenida Prado Júnior, em Copacabana.
Na sexta-feira, O GLOBO esteve neste último cruzamento e ouviu reclamações dos motoristas em relação ao funcionamento do sinal.
— Melhora? Não dá para perceber. O sinal tem é ficado ruim o tempo todo. Ele fica no “atenção” (amarelo piscante) ou apagado direto. Ontem (quinta-feira) parou duas vezes — relatou o taxista Wagner Araujo.
A CET-Rio reconhece que houve defeito elétrico no equipamento do local, mas que “foi prontamente reparado pelas equipes de manutenção”. A companhia pontua que “o defeito não tem qualquer relação com o convênio com o Google” e que “o cruzamento segue normalizado no momento”.
Já na área da saúde, a partir de amanhã uma nova funcionalidade da IA vai entrar em operação. No Hospital Municipal Albert Schweitzer, em Realengo, ela ajudará a analisar exames de raios X de tórax em pacientes acima de 16 anos.
Segundo Ginna Ilka de Carvalho, enfermeira e gerente de projetos da unidade, o programa faz só uma sugestão, já que caberá ao médico fechar o diagnóstico. Até ontem, os profissionais recebiam apenas a imagem do exame no computador. Agora, receberão essa versão “pura” e outra com marcações da IA, que sugerem diagnósticos, como fratura.
Para além das pessoas, nas ruas e calçadas, outro diagnóstico que pode ser feito pela IA é o de vazamento de água. O grupo Águas do Brasil — que engloba concessionárias como a Rio+ Saneamento, a Águas de Niterói e a Águas do Imperador — utiliza um aparelho chamado Fluid. Ele nada mais é que uma haste móvel, conectada à IA, que é aproximada do cano e faz uma gravação do ruído. Assim, a tecnologia identifica se aquele é o som de um fluxo normal de água ou se há algo suspeito. Os dados retornam para o sistema e indicam se há vazamentos.
O som das águas
Antes disso, o único aparelho usado era o geofone, que dependia 100% da escuta dos técnicos e não fazia gravações dos ruídos. Além disso, era preciso utilizá-lo à noite, por ser um horário com menos ruídos de carros na rua.
— No Fluid, a inteligência artificial ajuda a identificar. Já tem um monte de bases de dados identificando o ruído como suspeito ou não — observa Camila Coutinho, gerente de Inovação do grupo Águas do Brasil. — O bom da inteligência artificial é que você pode estar sempre ensinando: “Esse ruído não era de vazamento, era de outra coisa”, por exemplo.
E sempre há tempo de ampliar o uso da IA. No Rio, a prefeitura conta com o Escritório de Dados, seu centro de pesquisa, que pensa e testa novas aplicações. No último verão, por exemplo, foi implementado um sistema que identificava alagamentos a partir de câmeras do COR.
João Carabetta, chefe de dados do município, explica que, em dias de chuva, eram selecionadas cerca de 600 câmeras, de vias importantes, lugares próximos a rios ou com histórico de alagamentos, para o ChatGPT analisar. As respostas eram direcionadas a operadores do COR, que enviavam equipes ao local.
— O protótipo automatizava a coleta de imagens das câmeras, e o ChatGPT respondia para a gente se estava alagado ou não — diz Carabetta, que promete, para o próximo verão, testar se a IA consegue ainda identificar bueiros obstruídos por lixo, para que equipes de manutenção sejam acionadas para limpá-los antes das chuvas.
Atualmente, está em desenvolvimento com a Central Integrada de Vigilância um sistema capaz de ajudar a detectar atos de vandalismo na cidade.
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