Ar seco e fumaça de queimadas levam cariocas a unidades de saúde: 'Da minha janela, vejo uma neblina densa e escura'

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— Estou me sentindo mal. Faz uma semana que, da janela da minha casa, vejo uma neblina densa e escura sobre as árvores. Não parecem nuvens, é algo mais denso. Quando abro a janela, entra aquele ar quente e começo a espirrar. Talvez o ar poluído esteja me deixando doente. Isso é preocupante. Onde eu moro tem bastante vegetação, mas de nada adianta se o ar está poluído — disse a idosa.

Moradora do Grajaú, também na Zona Norte, Maria Diniz, de 62 anos, relatou ter os mesmos sintomas que Maria Márcia. Ela contou que há seis dias começou a ter uma tosse seca, que evoluiu para uma crise respiratória. Ao ir ao Heitor Beltrão se deparou com uma fila de pessoas na mesma situação:

— Acho que esses sintomas devem ter relação com o ar ruim. De manhã a gente vê que o céu não está amanhecendo limpo.

O GLOBO apurou que até as 10h20 da manhã desta segunda-feira, o Centro municipal de Saúde Heitor Beltrão havia realizado 25 testes de pessoas que achavam estar com Covid. Seis deles deram positivo e 19, negativo. Segundo o secretário de Saúde do Rio, Daniel Soranz, neste período de baixa umidade do ar, a rede municipal teve um aumento de 31,2% de casos de asma e 29,8% de casos de bronquite aguda entre janeiro e agosto deste ano, em comparação com o mesmo período de 2023.

De acordo com o Alerta Rio, nos próximos dias a umidade relativa do ar poderá apresentar valores ainda mais baixos do que os atuais, variando entre 21% e 30% no período da tarde. Esse percentual está longe de ser o ideal considerado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que é de 50% a 60%.

— O problema da (falta de ) umidade explica esse conjunto de sintomas mais alérgicos. Nesse período do ano a gente percebe um aumento de doenças respiratórias. Quando a gente tem umidade do ar mais baixa é mais fácil pegar uma virose porque as partículas ficam mais tempos no ar e facilitam infecções e crises alérgicas — explicou Soranz.

Dados da Secretaria municipal de Saúde mostram que, dos pacientes que tiveram sintomas respiratórios este ano, 46,4% foram por infecção por Rinovírus; 33,9% por Covid; 10,7% por Influenza; 5,4% por VSR; 2,7% por Adenovírus; e 0,9% por Influenza tipo B. Dos casos analisados, 43% dos pacientes não tinham patógenos — ou seja, as crises e sintomas foram causadas por questões alérgicas.

— Recomendamos que as pessoas fiquem em ambientes arejados, deixem o sol entrar e estejam sempre com algum recipiente com água ou uma toalha molhada. Usar um umidificar de ar e plantas no ambiente ajudam a manter a umidade equilibrada. É importante também ficar atendo aos ácaros e coisas que possam provocar mais alergias — disse o secretário.

Ele listou algumas medidas que devem ser tomadas por quem sentir algum tipo de alteração:

— Se a pessoa só teve sintoma respiratório leve não precisa fazer nenhuma medicação. O ideal é a mudança de hábito para ela conseguir estar no ambiente com umidade melhor. Se ela tem outros sintomas com mais gravidade, como febre ou falta de ar intensa, ela precisa procurar um médico. A grande maioria dos sintomas são muito leves e se resolvem com melhoria da umidade do ar. O ideal é beber sempre de dois a três litros de água por dia.

O aposentado Joaquim da Encarnação Azevedo, de 70 anos, que mora na Tijuca, disse que desde domingo vem tendo dificuldade para respirar. A tosse seca tem atrapalhado a rotina de caminhar e fazer exercícios:

— Me sinto cansado. Acho que essa baixa umidade está causando problemas para nós, idosos.

Gilmar Sonzin, pneumologista e ex- presidente da Sociedade estadual de Pneumologia do Rio de Janeiro (Sopterj) explicou que o ar seco e a carga de poluição aumentada estão ocasionando uma agressão nas vias respiratórias, causando sintomas que são semelhantes a crises virais:

— As pessoas estão respirando um ar pesado, seco e carregado. Esse ar poluído atua nas vias aéreas e no pulmão de alguém que já tenha, por exemplo, uma doença respiratória crônica. De repente, a pessoa está voltando a ter crise porque o ar poluído faz exacerbação.

De acordo com ele, há muitos casos de viroses respiratórias comuns e inespecíficas, com sintomas são parecidos: tosse seca, dor de garganta, dor de cabeça, fadiga e falta de ar.

— A agressão ao trato respiratório está sendo causada pela poluição do ar, pela baixa umidade e pela circulação atípica de vírus sazonais que estão se proliferando mesmo com a temperatura elevada — afirmou Sonzin.