Vou-me hoje do Peru depois de nove dias de bem comer — terminando com um frango de televisão de pele crocante realçado por uma salada fresquinha e molho picante da praça de alimentação do aeroporto. Difícil achar no mundo país com tanta comida gostosa: ir a restaurantes é o esporte nacional! Taxistas de Lima defendem sua cevicheria ou seu chifa (sino-peruano) favoritos com o mesmo entusiasmo e conhecimento de causa com que os do Rio falam do Flamengo.
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Come-se bem tanto nos restaurantes mais famosos e estrelados de Lima — Central, Mayta, Maido — como em toda sorte de lugares menos formais e caros. Caí de amores pelo Mérito, uma joia pequenina toda em madeira que me transportou para o Japão, cujos pratos mesclam harmoniosa e deliciosamente a Venezuela natal do chef-proprietário, selva e costa peruanas, Tailândia e Índia. Só de lembrar das vieiras cruas em molho acidulado, espécie de tiradito celestial com finas lâminas de jalapeño — e do pudinzinho mais cremoso da vida que encerrou meu almoço —, minha boca se enche d’água.
Por um punhado de moedas, refestelei-me com o ceviche de dona Andrea no mercadão do bairro Jesús Maria. Devorei, de café da manhã, uma empanada do 500 Grados (outra descoberta!) que se esfarelava como um empadão, recheada de nacos de ossobuco.
Entre uma comilança e outra, caminhava pelas ruas do charmoso bairro de Barranco. Duas vezes comprei artesanato de senhoras que haviam viajado mais de 16 horas até a capital, uma vinda da selva, outra de Cusco. Cansadas, desesperadas por uns trocados, comoveram-me com seus lamentos. Desde que a atual presidente substituiu o presidente golpista deposto, certas zonas mais pobres do país estão uma baderna. Gente suja financia ônibus e comida para protestantes que bloqueiam estradas e tocam foco em pneus (onde é que já vi esse filme, mesmo?). Foi preciso até fechar Machu Picchu e evacuar gringos assustados.
Espantar turistas equivale a tirar a fonte de sustento de milhões. O Peru e sua inigualável gastronomia merecem mais.