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Rio Show

Crítica: 'Lazarus'

Musical dirigido por Felipe Hirsch, com texto de David Bowie e Enda Walsh, se impõe como montagem que desafia o espectador
Cena do musical "Lazarus", de David Bowie, dirigido por Felipe Hirsch Foto: Miguel Sá / Divulgação
Cena do musical "Lazarus", de David Bowie, dirigido por Felipe Hirsch Foto: Miguel Sá / Divulgação

Fascinante livro de Walter Tevis publicado em 1963, “O homem que caiu na Terra” é centrado em Thomas Newton, alienígena que desembarca na Terra munido do objetivo de salvá-la e, principalmente, o seu planeta, Anthea, ameaçado de extinção. O livro rendeu uma adaptação para o cinema, em 1976, dirigida por Nicolas Roeg e protagonizada por David Bowie , versão que não foi concebida com o intuito de prestar fidelidade convencional à obra de origem, mas não chega a abandonar completamente o fio do enredo. Em parceria com o dramaturgo Enda Walsh , Bowie criou o musical “Lazarus” , que, agora, ganha encenação assinada por Felipe Hirsch .

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O brilho da escrita de Tevis reside, entre outros fatores, no detalhamento do impacto físico sofrido por Newton na Terra e na valorização do contraste entre os símbolos de um universo marcado pela exatidão (a concretude dos gráficos, fórmulas, equações, próprios das profissões dos personagens) e as imagens da natureza no interior dos Estados Unidos. Essas características aparecem pouco no espetáculo, que privilegia a construção estética (bastante soturna) em detrimento do texto propriamente dito.

“Lazarus” se impõe como uma montagem que desafia o espectador. O visual é sombrio, as letras das músicas de Bowie são projetadas em inglês e não existe a preocupação em contar a história com clareza. O elenco surge algo aprisionado dentro de uma estrutura formalista, ainda que evidenciando integração com a linguagem cênica, valendo destacar as interpretações de Bruna Guerin e, em especial, Rafael Losso . Há mais recompensas, além das atuações, para aqueles que enfrentarem a aridez da proposta.

Na imponente e instigante cenografia de Daniela Thomas e Felipe Tassara , complementada pelas projeções, os atores se movimentam sobre uma superfície instável, transmitindo a sensação de corpos em desequilíbrio, como se estivessem à beira de um precipício. Apesar de serem bem diferentes, a direção de arte de “Lazarus” e a cenografia de “Não sobre o amor”, encenação que também resultou da conexão entre Hirsch e Thomas, parecem se comunicar. Desestabilizam os corpos ao retirá-los de suas posições tradicionais — no segundo caso, materializando, por meio da localização singular dos elementos no palco, o mundo às avessas dos personagens.

O gênero musical costuma ser associado à fruição despretensiosa. “Lazarus” demole essa articulação através da disposição ao risco.

Teatro Multiplan: VillageMall. Av. das Américas 3.900, Barra — 3030-9970. Qui a sáb, às 21h. Dom, às 19h30. R$ 100 (plateia superior), R$ 200 (frisa e plateia superior nobre), R$ 300 (plateia) e R$ 400 (plateia VIP). 120 minutos. Não recomendado para menores de 16 anos. Até 15 de março.