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Rio Show

João Donato: 'Há funks bonitinhos, mas a maioria é xarope e bagunça'

Atração de festival on-line neste fim de semana, músico e compositor grava inéditas com mais jovens, mas rejeita 'música comercial'
O músico e compositor João Donato Foto: Bruno Kaiuca / Agência O Globo
O músico e compositor João Donato Foto: Bruno Kaiuca / Agência O Globo

Os passos de João Donato têm sido regidos, ele mesmo ressalta, por um ritmo estável e previsível. Recluso em casa, o músico de 86 anos costuma se dividir entre o piano, a TV e a paisagem do mar emoldurada pela janela do apartamento para onde ele se mudou há poucos dias, no Leme:

— E não tenho muito mais o que fazer além disso, né? — lamenta o compositor.

A verdade, porém, é que sempre há uma nota a mais no meio do caminho de Donato. Ele apresenta um show on-line no próximo domingo, às 19h, ao lado do filho Donatinho, parte da programação da primeira edição do ZporZ Fest Verão.

O evento, gratuito, começou ontem, com o show do cantor, compositor e guitarrista paraense Felipe Cordeiro exibido ao vivo no YouTube . As apresentações, sempre às 19h, seguem nesta sexta-feira no mesmo canal, com o ator e rapper Jairo Pereira, um dos vocalistas da banda Aláfia. Amanhã, Pedro Alterio e Pedro Viáfora entoam criações a quatro mãos e relembram o repertório do extinto grupo 5 a Seco, em que ambos iniciaram a carreira.

Pai e filho em sintonia

A apresentação de Donato e Donatinho, que encerra o evento, resgatará canções do disco “Sintetizamor” , de 2017, e dará nova cara a famosas pérolas “donatianas”, como “A rã”, “Nasci para bailar” e “A paz”. Apenas os dois estarão em cena: Donato, como de praxe, ao piano; Donatinho, nos sintetizadores eletrônicos, embalando o repertório com uma roupagem pop.

— Vai ser como se estivéssemos passeando na beira da praia. A conexão que existe entre pai e filho nos ajuda — conta Donato.

O músico e compositor João Donato Foto: Bruno Kaiuca / Agência O Globo
O músico e compositor João Donato Foto: Bruno Kaiuca / Agência O Globo

O músico acriano, que tem seu cancioneiro marcado por fusões de jazz e sonoridades latinas em um suingue inconfundível, diz seguir na “busca por alegria”, algo que ele classifica como a base de tudo o que executa.

— Uns amigos colombianos dizem que minha música produz serotonina, hormônio que traz sensação de bem-estar. Não sou rico e nem pretendo ficar rico com o que faço. A finalidade do meu trabalho é alegrar os corações, acalmar a raiva dos animais e fazer com que as pessoas pensem melhor — diz ele, que tem recebido homenagens mais frequentes e , no último ano, inspirou o tema de um novo bloco de carnaval carioca, o Emoriô. — Vejo que tem uma turma mais nova ouvindo o que faço. Minha música tem atravessado os tempos com facilidade porque ela exalta uma lógica natural das coisas. Não são canções fabricadas, sabe?

Há novidades à vista. Nos últimos meses, um álbum com pegada jazzística vem sendo gestado com o filho. Ao lado de cantoras e compositoras da cena contemporânea, como Céu, Tulipa Ruiz, Mariana Aydar e Anelis Assumpção, ele também produz arranjos para um disco de inéditas que terá o selo da Natura Musical.

Sim, João Donato está sintonizado com as vozes da juventude. Mas não todas.

— Não gosto de funk e sertanejo. São estilos passageiros, e que tem a ver com certo visual vulgar em que todos ficam virados de costas rebolando... Claro que há alguns funks bonitinhos, mas a maioria é xarope e bagunça, algo fácil de fazer — ele critica. — O problema é que as pessoas são treinadas para gostar desse tipo de coisa. E acontece mesmo de a gente acabar assobiando certas canções à toa, de tanto que essa música horrorosa inunda os rádios e os ouvidos. O povo se acostumou a um tipo de música como se aquilo fosse certo. Mas música comercial é a prostituição da arte: faz-se só para ganhar dinheiro, como alguém que vende biscoitos Maria.