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'Rocketman': crítica

Bonequinho aplaude de pé: 'a força não está somente nas canções e no sofrimento, mas principalmente nas respostas sutis dadas por Dexter Fletcher'
CULTURA - Filme "Rocketman" conta a vida de Elton John
Taron Egerton as Elton John in Rocketman from Paramount Pictures. Foto: Gavin Bond
CULTURA - Filme "Rocketman" conta a vida de Elton John Taron Egerton as Elton John in Rocketman from Paramount Pictures. Foto: Gavin Bond

Muitos guardam a convicção de que um filme inspirado em fatos precisa contar exatamente como as coisas aconteceram. Só que nem em documentário isso ocorre. E, no cinema de ficção, cineastas autorais costumam fazer recortes de histórias reais para propor debates sobre um tema, como fizeram John Ford e Orson Welles, entre outros - e é justamente a isso que o diretor Dexter Fletcher se propõe no musical “Rocketman”, a cinebiografia do cantor e compositor Elton John.

Fletcher não está interessado em simplesmente contar a história do cantor britânico, mas em usá-la como sustentação para questões como: pais ausentes e não amorosos  podem ser responsabilizados por uma vida autodestrutiva? Qual a relação de causa e consequência entre a conduta errática de um astro mundial e os excessos de drogas e sexo? Qual pode ser o efeito da falta de autoestima?

Veja a cena em que Elton John conhece John Reid

Essas perguntas são ilustradas por meio de um filme convencional, mas que se traduz brilhantemente em diversos momentos ao misturar o clássico musical de Hollywood a, por exemplo,  “Tommy” (1975), a ópera-rock do diretor Ken Russell. Fletcher segue uma estrutura inspirada na psicologia, em que Elton John (Taron Egerton) faz uma espécie de lavagem de roupa suja numa sessão de terapia de grupo. O diretor reedita como arcabouço o clássico modelo de “Um conto de Natal”, de Charles Dickens, em que um sujeito revisita sua vida e ao final da viagem alcança uma superação. E atualiza essa abordagem ao despir Elton John de peças de seu figurino exuberante a cada passagem emblemática.

O longa registra essa jornada com várias liberdades poéticas, reforçando que o que interessa a Fletcher é tentar transmitir o que se passava emocionalmente com o músico, e as suas escolhas. Para isso, o diretor muda até as letras das canções, para que se encaixem no que ele apresenta em imagens, assim como sublinha as opções de linguagem que faz, como ao alterar planos mais fechados (sempre ligados a anuência) e abertos (simbolizando rebeldia) para reforçar os sentimentos do biografado.

Apesar da habilidade técnica e do enfoque corajoso de Fletcher, muito do acerto do filme se deve mesmo à interpretação de Taron Egerton. E nesse ponto fica inevitável a comparação com o irregular “Bohemian Rhapsody”, sobre a banda Queen. Se Rami Malek fez um mimetismo perfeito de Freddie Mercury, Taron recriou Elton John para a telona. Em “Bohemian”, o espectador foi pego pela emoção das músicas e pelo drama de Mercury; em “Rocketman”; a força não está somente nas canções e no sofrimento, mas principalmente nas respostas sutis dadas por Fletcher: cada um é, em última instância, o responsável pelo jeito que escolhe viver.