Ciência
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Por — São Paulo

Quando uma pessoa tem sintomas de perda de memória, confusão mental e falta de concentração, há uma probabilidade grande de que a origem do problema seja o mal de Alzheimer, responsável por 60% a 70% dos casos de demência no mundo. Nem sempre essa doença degenerativa é a causa da perda cognitiva, porém, e estudos mostram que nessas ocasiões há mais risco de o diagnóstico falhar.

Um estudo publicado em janeiro nos EUA, que investigou registros médicos de 177 mil veteranos militares com diagnóstico de demência e suspeita de Alzheimer, descobriu que 10% dos diagnósticos de demência típica ao longo de dez anos na verdade eram casos de declínio cognitivo por cirrose.

Quando o fígado não funciona bem, entre possíveis consequências está a encefalopatia hepática, que ocorre quando toxinas se acumulam no sangue e penetram no cérebro, explica o cientista Jasmohan Bajaj, da Universidade Commonwealth da Virgínia, que liderou o trabalho na revista JAMA Network Open, da Associação Médica Americana.

No Brasil, estudos apontam que uma parcela razoável da população com demência nem sequer recebe diagnóstico. Mas entre aqueles que recebem, não se sabe quantos tem a avaliação modificada depois para uma condição não-Alzheimer.

Médicos que atuam na área, porém, percebem que na linha de frente do atendimento as causas de demência com mecanismos biológicos até mais simples às vezes demoram ser identificadas.

— Existe já um termo popular no jargão médico que é a "alzheimerização" do diagnóstico de demência, como se tudo que levasse a esquecimento fosse Alzheimer — afirma o psiquiatra Orestes Forlenza, professor da Faculdade de Medicina da USP. — Já está até meio que incutido na crença popular, e quando uma pessoa começa a esquecer, alguém diz "ela deve estar com Alzheimer".

Entre as causas de demência que são uma parcela minoritária, mas relevante, estão outras doenças degenerativas e alguns problemas que, se tratados, podem até levar a uma reversão dos sintomas.

— A função hepática é um exemplo de algo que é preciso investigar em toda suspeita de demência, para descartar a cirrose como origem. A gente tem que descartar causas secundárias antes para suspeitar da principal causa primária, que é o Alzheimer — diz a médica Jerusa Smid, secretária-geral da Academia Brasileira de Neurologia.

A maior parte das causas secundárias tem origem em problemas circulatórios, como o AVC (acidente vascular cerebral), que lesiona o sistema nervoso. Depois destas, vêm as causas extra-cerebrais, onde entram a disfunção do fígado (por cirrose), dos rins ou da tireoide.

— Uma pessoa diabética com glicemia mal controlada, por exemplo, pode sofrer um declínio cognitivo — explica Smid, que destaca também as manifestações nervosas da sífilis (neurossífilis), uma doença sexualmente transmissível, como origem de demência. — Essas são causas que a gente potencialmente pode tratar e melhorar o paciente, diferentemente do Alzheimer, no qual o tratamento é muito mais para diminuir a velocidade do declínio do que propriamente levar a uma reversão.

Apesar da percepção de Forlenza e outros profissionais com a "alzheimerização" dos diagnósticos, não há muita pesquisa no Brasil que tenha estudado o mesmo problema relatado agora nos EUA. Há mais de duas décadas, um estudo liderado pelo neurologista Ricardo Nitrini, fez uma triagem entre 454 pacientes de demência no Hospital das Clínicas para observar a prevalência de outras causas do problema.

"Doença de Alzheimer foi o diagnóstico mais frequente (164 casos; 59,6%). Vinte e dois casos (8,0%) de demência potencialmente reversível foram encontrados, sendo os diagnósticos mais frequentes neurossífilis (nove casos) e hidrocefalia (seis casos)", escreveu o pesquisador.

Em muitos casos, a causa da demência é mista, na qual o Alzheimer existe e é agravado por uma demência vascular ou de outro tipo, o que torna o diagnóstico mais desafiador.

Atenção primária

Apontar corretamente as causas da demência é uma preocupação relevante para os especialistas, mas algo que se revela como carência ainda maior é a identificação dos próprios sintomas. A Sociedade Brasileira de Geriatria estima que haja mais de 2 milhões de idosos com demência no país, muitas sem diagnóstico. Psiquiatras e neurologistas dominam bem o protocolo de investigação para avaliar os sintomas, mas a atenção primária nem sempre está preparada (ou não tem acesso a tomografias ou ressonância magnética) para investigar detalhadamente um caso.

— No nível mais básico da atenção primária, onde as demandas são muitas e vêm misturadas, às vezes aquela queixa de memória perde relevância diante de um paciente com uma queixa precordial: alguma doença clínica mais declarada, possivelmente mais grave — diz Forlenza. — Essa situação acaba não desencadeando um processo de investigação para o diagnóstico de demência. Passa batido.

Um grupo de geriatras, psiquiatras e neurologistas realizou recentemente na USP um encontro de brainstorm para discutir como melhorar no sistema de saúde o alcance e a qualidade da avaliação para demência. Segundo Forlenza, é consensual que muito pode ser feito na organização do atendimento primário e nos critérios de encaminhamento para especialista no segundo e terceiro nível.

Segundo Smid, se o sistema ganhar agilidade, ele aumenta as chances de pacientes com quadro de demência não-Alzheimer conseguirem reversão parcial dos sintomas.

— Quando o diagnóstico é precoce, a gente tem uma chance boa de tratamento e reversão do quadro, por exemplo, na neurossífilis — diz a neurologista. — Agora, se a gente demora meses para fazer esse diagnóstico, o indivíduo já vai ter uma lesão que talvez a gente não consiga reverter.

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