Saúde
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Por Letícia Messias — Rio de Janeiro

Todos os dias, o empresário Fernando Paternostro, de 43 anos, acorda às 4 da manhã e treina por quatro horas. O objetivo é alcançar o físico necessário para participar do IronMan, a maior competição de triatlo do mundo, que desta vez ocorrerá em Florianópolis no próximo domingo. A prova inclui natação, ciclismo e corrida, o que exige muito do corpo, mas também da mente, já que, ao todo, o percurso pode durar 17 horas. Para isso, ele conta com uma aliada: a cannabis medicinal.

Com rotinas de preparação intensas, o atleta está sujeito a sofrer uma série de lesões. Em outra ocasião, Paternostro chegou a ter canelite e fascite plantar, o que fez com que apelasse para os anti-inflamatórios. Mas o problema virou uma bola de neve: de tantos remédios, surgiram as dores estomacais. Quando o exercício virou um problema de saúde, o empresário resolveu testar o uso do canabidiol (ou CBD, substância derivada da cannabis, conhecida amplamente como maconha).

— Acho que a principal mudança que vi, no curto prazo, foi a diminuição das inflamações. Comecei a usar a cannabis depois de passar por uma consulta médica e isso melhorou a minha dedicação ao esporte, porque parei de sentir dores — disse o empresário ao GLOBO. — Como já não estava ansioso, não descontava na alimentação. Passei a dormir melhor. Senti uma série de benefícios.

Ele não é o único. Após passar por um quadro depressivo tão grave que quase o fez tirar a própria vida, o atleta olímpico Daniel Chaves, 34, atribui sua estabilização psicológica à cannabis. Já o campeão brasileiro de remo no single skiff, prova que define o melhor do ramo no país, Tomás Levy, 20, usa a substância para lidar com a síndrome de Tourette. É o mesmo caso do lutador Antônio Carlos Júnior, o Cara de Sapato.

Tendência no esporte

Nascido em São Paulo, o primeiro contato que Paternostro teve com a cannabis só foi ocorrer em 2005, no período em que morou na Espanha. Quando percebeu o potencial que existia neste segmento, em 2018, viajou para os Estados Unidos e passou a explorar o mercado como investidor. Hoje, ele é o fundador da comunidade Atleta Cannabis e CEO do myGrazz, primeiro aplicativo de cannabis medicinal do Brasil.

— Nessas viagens, percebi que a utilização deste recurso no esporte seria tendência no mercado e que ainda não tinha no país. Achei que poderia ser uma oportunidade legal, tanto do ponto de vista do negócio, para trazer inovação, mas também pelo viés educativo, porque não se falava sobre o assunto por aqui — relembrou.

O momento não poderia ter sido mais oportuno. No mesmo ano, a Agência Mundial Antidoping (Wada) decidiu retirar o CBD da lista de substâncias proibidas no esporte. Ao GLOBO, o coordenador da comissão antidoping da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) Fernando Solera destacou que o uso do óleo de canabidiol não faz mal à saúde, embora tenha advertido que o THC, entorpecente, permanece proibido.

— Há muitos trabalhos que mostram que as dores musculares diminuem [com o uso da cannabis]. Tenho a impressão de que muitos atletas estão optando por esta substância, que é permitida. E não há nada de errado nisso, pelo contrário. Ela pode ser muito melhor que outros remédios, por exemplo, porque não causa dependência física ou química.

O entendimento é o mesmo do médico e pesquisador Paulo Fleury Teixeira, especialista em medicina canábica. Com toxicidade baixa e pouco risco para a saúde, principalmente se comparado aos agentes alternativos usados atualmente, o uso deste recurso é, para ele, positivo — e não apenas no caso dos atletas, mas também para a população geral.

— A cannabis é usada para um grande conjunto de doenças e sintomas, sendo os distúrbios mais comuns a ansiedade, depressão e insônia. Além disso, pessoas com alzheimer, parkinson, esquizofrenia ou autismo podem ser beneficiadas, já que os riscos são muito menores que os remédios comumente usados.

Outro aspecto positivo destacado pelo médico é que, no caso do canabidiol, não existe nenhuma contraindicação, como gestação ou idade. No entanto, embora seja um recurso de “máxima segurança”, segundo Teixeira, o uso ainda esbarra em questões que vão desde o preço elevado até o estigma. Em alguns tratamentos, por exemplo, o paciente deveria utilizar uma dose de 1,5 mil miligramas diárias — mas o valor de um frasco com esta quantidade é de no mínimo R$ 700.

— São os princípios ativos de uma planta, que as pessoas poderiam ter acesso quase sem custo. Mas, ao contrário, hoje os tratamentos autorizados são caríssimos. É um mercado oligopolizado. Não é nem para a classe média em geral. A grande maioria da população brasileira não tem condições de pagar — pontuou.

Para tentar facilitar o acesso foram criadas, com autorização judicial, organizações sem fins lucrativos que oferecem o produto gratuitamente — ou com valores mais acessíveis. É o que afirmou Cassiano Gomes, fundador da Abrace, instituição iniciada em 2017 e que fornece a substância mensalmente e sem custo a duas mil famílias no Brasil. Ao todo, segundo ele, existem 38 associações semelhantes no país.

— Com o apoio de uma assistente social, fazemos uma triagem de pessoas. Para ser atendido, é preciso que a renda seja de até um salário mínimo e que o paciente faça parte de programas sociais como o Bolsa Família, por exemplo — explicou Bruna Fernanda Dias, coordenadora da Associação Humanitária Canábica do Brasil (AHC), que hoje atende 250 pessoas no Rio de Janeiro.

De acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), atualmente existem duas formas de acesso à substância no Brasil: seja nas farmácias, pela aquisição de produtos já registrados no país, ou pela importação para uso pessoal. No primeiro caso, o órgão divide a categoria em outras duas partes: medicamentos ou produtos de cannabis, que não precisam de dados completos referentes a estudos.

— As pessoas querem ter acesso à cannabis medicinal dentro da lei. Hoje em dia, temos atletas de ponta que fazem o uso do CBD. E isso só tende a aumentar, porque quem pratica atividade física tem este comprometimento com a saúde, mesmo que não seja atleta profissional. Eu, por exemplo, não sou. Tenho a minha rotina, minhas filhas, e percebo que muita gente se identifica com isso — disse Paternostro.

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