Brasil

O racismo torna escritores invisíveis

‘Na invisibilização do escritor e do personagem negro está a discriminação’
Ana Paula Lisboa, colunista do Segundo Caderno Foto: Arquivo
Ana Paula Lisboa, colunista do Segundo Caderno Foto: Arquivo

A pesquisa da professora Regina Dalcastagnè e o livro “Um território contestado: literatura brasileira contemporânea e as novas vozes sociais” deram números ao que qualquer escritor negro já sabia: a literatura brasileira é racista.

Segundo ela, ao ler 692 romances, publicados por 383 autores nos períodos de 1965 a 1979, de 1990 a 2004 e de 2005 a 2014, percebe-se que o perfil do escritor brasileiro é o homem branco, de classe média, heterossexual, morador de Rio de Janeiro, São Paulo ou Rio Grande do Sul.

Preto no branco : 9 visões sobre onde está o racismo estrutural

E mais, seus protagonistas, o espaço e o tempo criados por esses autores se parecem muito com eles.

É na tentativa de invisibilização do escritor e do personagem negro que está o racismo. A literatura permanece na disputa de quem vai contar a história do país, quem são os personagens e história relevantes.

A produção negra de contos, crônicas e poesias não ganha espaço nas grandes editoras, na desculpa da preferência pelo romance.

Demonstra outra vez as barreiras frente a autores que produzem muitas vezes nos buracos de tempo de outros trabalhos e da própria vida, que não podem parar um ou dois anos produzindo uma narrativa longa, sem serem remunerados por isso.

Não faltam histórias como a de Carolina Maria de Jesus, que escrevia de madrugada, depois que os filhos haviam dormido, cansada de catar papel.

Luana Génot : Se a causa do racismo toca você, transforme sentimento em ação

Mesmo publicações dos romancistas Eliana Alves Cruz, Jessé Andarilho, Jarid Arraes, ou o (atrasado) boom Conceição Evaristo, confirmam exceções da regra que permanece.

Há uma validação necessária, não como autorização à escrita negra, mas como reparação histórica e fortalecimento de escritores e leitores negros. Não ter uma escritora como Conceição Evaristo na ABL não é uma perda para Conceição, e sim para a ABL.