Revista de Vinhos

O NATAL DE NUNO DINIZ

Chegamos ao paraíso. Ou, pelo menos, a essa imagem edénica que o nosso imaginário constrói de um lugar prazeroso onde poderíamos muito bem ficar o resto dos nossos dias.

Estamos em Sezelhe, uma aldeia nos confins do Barroso, debruçada sobre a margem direita do Cávado, onde o rio serpenteia e arquiteta uma pequena albufeira para alimentar a barragem dos Pisões. Uma topografia acidentada onde a água abunda.

A mil metros de altitude, respira-se pureza, entre as nesgas do som do silêncio, apenas recortado pelos chocalhos das vacas nos pastos verdes e lameiros, quase translúcidos da chuva, lá ao longe.

Não será de estranhar que o chefe Nuno Diniz tenha deixado o bulício frívolo de Lisboa para aterrar aqui de armas e bagagens, longe de artifícios. Também não é difícil compreender este entusiasmo num homem que nasceu para a arte e que consegue fazer a magia de casar a alta cozinha com os pratos regionais de Portugal de forma impoluta.

Gastrónomo, cozinheiro, professor, compositor, escritor, bom conversador, homem dos sete ofícios que aqui pode plantar a sua própria horta, paredes-meias com a casa onde escolheu agora viver, as suas aromáticas, as suas flores, todas comestíveis. Uma tela gigante onde se inspira para espraiar cores e sabores nos seus pratos. Tal como nas mais de 300 músicas que já compôs, numa complexidade dissonante “do instrumental aos blues”. Nós ouvimos uma que valeu por mil.

Chegámos num dia de chuva copiosa, derramada sobre uma imensidão de verde, num patchwork de bétulas e vidoeiros, salgueiros negros ou cerejeira brava, matizados de ocres e amarelos.

No cume, uma casa em pedra, madeira e vidraças convida a entrar, um lugar acolhedor onde uma salamandra nos aquece à chegada, a par dos aromas de erva doce e mel de urze que se evola das broinhas que saem agora do forno e que Nuno Diniz acabara de fazer. As broas do Dia de Todos os Santos, “as broas da Mãe”, como lhe chama e com quem vive aqui no meio de nenhures.

Parece que entramos nas páginas de um livro de Emily Brontë e Nuno é um personagem que sai das suas folhas. Sonho ou realidade, só a franqueza autêntica deste homem nos acorda com a sua boa disposição, porque aqui se sente “absolutamente feliz”. Isso nota-se e não admira.

Desafiamos Nuno Diniz, um dos chefes de cozinha mais emblemáticos de Portugal, daqueles que cada vez mais rareiam, diga-se de passagem, e decidimos antecipar a época natalícia para reproduzir uma refeição magnânime feita por si.

Deambula pela horta e mostra

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