Os Cossacos
De Liev Tolstói
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Os Cossacos - Liev Tolstói
Liev Tolstoi
OS COSSACOS
1ª. Edição
img1.jpgISBN: 9788583863410
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Prefácio
Prezado leitor
Liev Tolstoi, famoso escritor russo, é reconhecido como um dos grandes nomes da literatura universal e dentre suas obras destacam-se romances de grande impacto: Guerra e Paz, Ana Karenina, Ressurreição e Os Cossacos, entre outros.
O povo cossaco é famoso pela sua coragem, bravura, força e autossuficiência. É no seio deste povo que o personagem Olénin, levado pelo exército, mergulha de corpo e alma e se redescobre.
Os Cossacos é uma obra de beleza rara, de uma riqueza literária inigualável, que nos cativa pelo retrato que faz de seu tempo, de um povo que apesar de viver no coração daquele país, possui uma alma própria, uma cultura, um modo de vida ímpar.
Uma excelente oportunidade para a descoberta ou aprofundamento na obra de Liev Tolstoi, um gigante da literatura.
Boa leitura
LeBooks Editora
Aquilo que foi e que será, e até mesmo aquilo que é, não somos capazes de saber, mas quanto àquilo que devemos fazer, não apenas somos capazes de saber, como também o sabemos sempre, e somente isso nos é necessário.
img2.pngLiev Tolstói
APRESENTAÇÃO:
O autor: Liev Tolstoi
img3.jpg1928 – 1910
Liev Tolstói foi um escritor russo, é autor do romance Guerra e Paz, um clássico da literatura russa. Com centenas de personagens, na versão original, é considerado um dos maiores romances da história. A obra retrata o jogo da política, as intrigas da corte e a brutalidade da guerra.
Liev Tolstói nasceu em Iassnaia-Poliana, Rússia, no dia 09 de setembro de 1828. Filho de importante família ligada aos Czares ficou órfão aos nove anos de idade, sendo criado por tias e educado por preceptores. Em 1841 muda-se para Kazan, onde estuda línguas orientais e Direito, mas insatisfeito com o ensino formal abandona os estudos antes da graduação.
Em 1847, por herança, torna-se senhor de vastas terras. Era chamado de Conde de Tolstói.
Entusiasmava-se pelo luxo, mas procurava oferecer as melhores condições para seus empregados, preocupado com as contradições dos dois mundos.
Em 1851 alista-se no exército e luta na Guerra da Crimeia, entre russos e turcos. Inicia sua carreira literária, escreve a autobiografia Infância
(1852), que é publicada na revista O Contemporâneo, de São Petersburgo. Em seguida escreve Adolescência
(1853).
Em 1855 volta para São Petersburgo, após a derrota das tropas Russas. Vai para a propriedade da família. Casa-se com Sônia Andreievna. Em 1856 escreve, Crônicas de Sebastopol
e em 1857 escreve "Juventude, completando a trilogia autobiográfica. A vida na corte o deixa decepcionado, administrar suas propriedades não o satisfaz e a vida militar o repugnava.
Liev Tolstói escreve seus dois maiores romances Guerra e Paz
(1869) e Anna Karenina (1877). Nessa época entra em crise espiritual, questiona a sociedade em que vive, rejeita a autoridade da Igreja Ortodoxa e é excomungado em 1901.
Tolstói repudia a nobreza, veste-se como camponês e anda descalço. Abandona sua casa e morre de pneumonia na estação ferroviária de Astapovo, na província de Riaz, Rússia, no dia 20 de novembro de 1910.
Sobre a Obra
Os cossacos são um povo nativo das estepes das regiões do sudeste da Europa (principalmente da Ucrânia e do sul da Rússia), que se estabeleceram mais tarde nas regiões do interior da Rússia asiática. Os cossacos são muito famosos pela sua coragem, bravura, força e capacidades militares, especialmente na cavalaria, mas também pela capacidade de autossuficiência. A sua importância e força militar era tão grande, que mais tarde, durante a sua integração na Rússia, foi criada uma unidade militar de cossacos. É no seio deste povo que o personagem Olénin, levado pelo exército, mergulha de corpo e alma e se redescobre.
Os Cossacos é uma obra que consegue ser ao mesmo tempo simples e profunda, pois não é apenas literatura: é um retrato de uma cultura e de um povo.
Olénin, personagem que acompanhamos nessa história, é um típico russo pertencente de uma classe social privilegiada. vive como bem entende, sem responsabilidades, totalmente entregue aos vícios próprios de sua idade. ao entrar no exército, o jovem é levado a uma região remota, longe de tudo e todos. Ao se instalar nesse povoado, Olénin toma contato com as pessoas, percebe o vazio que era a sua existência anterior e logo é tomado de assalto por uma paixão por esse povo.
O auge de sua paixão por esse povo, pelo seu modo de vida, se dá quando ele se apaixona por uma mulher, quando pensa em largar toda a sua vida e se entregar a vida típico de um cossaco, e chega a pedi-la em casamento, mesmo ela estando, já, comprometida a um valente cossaco, Lukanchka.
Os Cossacos é uma obra de beleza rara, de uma riqueza literária inigualável, que nos cativa pelo retrato que faz de seu tempo, de um povo que apesar de viver no coração daquele país, possui uma alma própria, uma cultura, um modo de vida ímpar.
Sumário
CAPÍTULO I
CAPÍTULO II
CAPÍTULO III
CAPÍTULO IV
CAPÍTULO V
CAPÍTULO VI
CAPÍTULO VII
CAPÍTULO VIII
CAPÍTULO IX
CAPÍTULO X
CAPÍTULO XI
CAPÍTULO XII
CAPÍTULO XIII
CAPÍTULO XIV
CAPÍTULO XV
CAPÍTULO XVI
CAPÍTULO XVII
CAPÍTULO XVIII
CAPÍTULO XIX
CAPÍTULO XX
CAPÍTULO XXI
CAPÍTULO XXII
CAPITULO XXIII
CAPÍTULO XXIV
CAPÍTULO XXV
CAPÍTULO XXVI
CAPÍTULO XXVII
CAPÍTULO XXVIII
CAPÍTULO XXIX
CAPÍTULO XXX
CAPÍTULO XXXI
CAPÍTULO XXXI
CAPÍTULO XXXIII
CAPÍTULO XXXIV
CAPÍTULO XXXV
CAPÍTULO XXXVI
CAPÍTULO XXXVII
CAPÍTULO XXXVIII
CAPÍTULO XXXIX
CAPÍTULO XL
CAPÍTULO XLI
CAPÍTULO XLII
OS COSSACOS
CAPÍTULO I
Plena calma em Moscou.
Raramente, muito raramente, um ruído de rodas estende-se pela calçada gelada.
Já não se veem luzes nas janelas e os candeeiros públicos jazem apagados.
As igrejas exalam o som dos sinos, que, vibrando sobre a cidade adormecida, anunciam a aproximação da manhã.
As ruas desertas.
Às vezes, aqui ou acolá, um cocheiro noturno atravessa com o trenó por sobre o saibro misturado de neve, para do outro lado da rua, e adormece, depois, esperando uni viajante.
Uma mulher velha passa pela capela, onde alguns círios, colocados sem simetria, abrem a sua chama brilhante.
Após uma longa noite de inverno, os trabalhadores erguem-se já, prontos para a faina.
Em casa dos patrões, ainda dura a noite.
Uma das janelas do Restaurante Cavalheiro, através das vidraças fechadas, coa a luz, interdita pela lei, a essa hora tardia.
Perto da escadaria exterior, estacionam, em fila, carruagens, trenós e fiacres.
Uma troikai de posta espera também.
O porteiro, atabafado, parecia ocultar-se num ângulo da casa.
— Que diabo têm eles que dizer toda a noite? — exclama um criado meio adormecido, na antecâmara. — Sempre que eu estou de serviço é a mesma história!
Dum gabinete contíguo, bem iluminado, estalam as vozes de três rapazes sentados a uma mesa, sobre a qual se veem restos duma ceia e vinho.
Um, baixo, muito esmerado, magro e feio, olha com um modo complacente e fatigado o amigo que vai partir.
Outro, alto, está estendido perto da mesa, coberta de garrafas vazias, brincando com a chave dó relógio.
O terceiro, de polouchoubockii completamente nova, passeia dum lado para o outro, detêm-se de quando em quando, quebrando amêndoas com os dedos grossos e fortes, de unhas bem tratadas, e sempre a. sorrir.
Rosto e olhos inflamados, fala com calor, gesticulando; mas, vê-se que lhe faltam os termos, que todas as palavras que pronuncia lhe parecem insuficientes para exprimir o que tem no coração.
Sorri sempre.
— Já agora, pode dizer-se tudo, — pronunciou o que estava de jornada — não é que eu queira justificar-me, mas desejava que compreendesses isto como eu o compreendo e não como o vulgo o encararia.
Achas que eu sou culpado para com ela? — dizia para o outro, que o olhava com bondade.
— Sim, culpado, — respondeu o rapaz baixo e feio, com um olhar que parecia exprimir ainda mais bondade e fadiga.
— Eu sei por que dizes isso — continuou o viajante — é porque, na tua opinião, ser amado é a mesma felicidade que amar, felicidade que, uma vez atingida, basta a toda a gente.
— Se chega! chega e sobra!... — Afirmou o rapaz baixo e feio, abrindo e fechando os olhos.
— Mas, por que não havemos nós de amar, também? — disse o que estava para sair; e, refletindo e olhando o amigo com comiseração: — por que não havemos de amar? a gente não conhece o amor. não, ser amado é uma desgraça, uma verdadeira desgraça, quando nos sentimos culpados de não retribuir esse amor, e não o podemos fazer. Ah! meu Deus! — exclamou, com um gesto de enfado, — se tudo isso fosse raciocinado..., mas, ao contrário, tudo isso se faz involuntariamente. É como se eu roubasse essa afeição. E tu pensas do mesmo modo. Não negues, pensas, sim! e podes crer que, de todas as inúmeras tolices e leviandades que eu tenho cometido na minha vida, esta é a única de que não me arrependo e de que não sei arrepender-me. Nem antes, nem depois, menti a ela ou a mim. Parecia-me que desta vez eu amava e depois reconheci que me havia enganado, que não se pode amar assim e que não podia ir mais longe. Ela, porém, foi mais além. Que culpa tenho eu de não ter podido amar? Que havia de fazer?
— Bem! acabou-se, — disse o amigo, fumando um charuto para espantar o sono — o que se conclui de tudo isso é que tu nunca amaste, nem sabes o que isso é.
O rapaz da polouchoubock queria continuar a conversação, mas era-lhe difícil encontrar expressão para os pensamentos.
— Não amei? É verdade. Mas desejo amar e não se pode ter esse desejo mais arraigado do que eu! Existirá um tal amor? Creio que não, será sempre um tanto imperfeito. Mas, que se lhe há de fazer? falhei na vida e, tens razão, está acabado, não há volta a dar-lhe. Sinto que uma nova vida vai começar.
— Vida que tu estragarás mais uma vez — disse o que estava estendido no sofá, a brincar com a chave do relógio.
Mas, o viajante não o ouvia.
— Sinto-me triste e ao mesmo tempo feliz por partir — continuou, — triste por quê, afinal? Não sei!
E entrou a falar só de si, sem notar que isso não interessava aos outros.
O homem não é tão egoísta como nos momentos de entusiasmo.
Então, parece-lhe que nada há no mundo mais. belo e mais interessante do que a sua pessoa.
— Senhor Dimitri Andreievitch! o postilhão não quer esperar! — disse um criado de peliça, com o pescoço abafado numa manta — os cavalos estão aqui desde a meia noite e já são quatro horas.
Dimitri Andreievitch olhou para o criado, o Vanucha.
Ao dar com a manta enrolada em volta do pescoço, com as botas forradas de pele e a cara sonolenta dele, julgou-se chamado por uma voz do outro inundo, desse mundo de trabalho, de privações, de atividade.
— Tem razão, adeus! — disse, procurando ainda um colchete por apertar.
Apesar das instâncias dos amigos, para que mandasse dar de beber ao postilhão e se demorasse mais um bocado, pôs o chapéu na cabeça e parou no meio do quarto.
Abraçaram-se primeira e segunda vez, separaram-se, tornaram a abraçar-se uma terceira vez.
O que tinha a polouchoubock vestida se aproximou da mesa, tomou uma taça de vinho e pegou na mão do amigo baixo e feio, corando.
— Não, não saio daqui sem to dizer... devo e quero ser franco contigo, porque te estimo... tu amá-la? sempre o supus... hein?
— É verdade! — respondeu o amigo com um sorriso ainda mais amável.
— E naturalmente...
— Peço desculpa, mas mandaram-me apagar as velas, — disse o criado sonolento que, tendo ouvido as últimas palavras da conversação, perguntava aos seus botões por que é que aqueles senhores estavam sempre a falar na mesma coisa. — A quem devo entregar a nota? A v. excelência? — ajuntou, falando para o mais alto de todos, sabendo de antemão a quem havia de dirigir-se.
— Sim, a mim mesmo, respondeu esse, — quanto é?
— Vinte e seis rublos.
O freguês refletiu um momento e meteu a nota no bolso sem pronunciar palavra.
A conversa seguia o seu curso, entre os dois interlocutores.
— Adeus, tu és um belo rapaz! — disse o jovem feio e baixo, de olhar suave.
Tinham ambos, lágrimas nos olhos.
Encaminharam-se para a escadaria exterior.
— Ah! é verdade, faze favor, paga a conta do restaurante e depois vemos isso, sim? — disse o viajante, corando e dirigindo-se ao amigo mais alto.
— Sim, sim, — respondeu o outro, calçando as luvas. — Como eu te invejo! — acrescentou espontaneamente, quando chegaram à escada.
O viajante sentou-se no trenó, embrulhou-se na sua peliça e ordenou:
— Vamos lá!
E encostou-se para trás no trenó, dando lugar àquele que declarara invejá-lo.
A voz tremia-lhe.
O que o acompanhava pronunciou:
— Adeus, Mitia, Deus te dê... — e, como os seus desejos eram ver o viajante pelas costas, não pôde concluir o voto.
Calaram-se.
Uma voz repetiu: — Adeus!
Alguém gritou:
— A caminho! — e o trenó abalou.
— Elizar, a minha carruagem! — disse um dos que ficavam.
Os cocheiros e um cocheiro particular agitaram-se, gritaram, sacudiram as rédeas; a carruagem gelada rangeu sobre a neve.
— É um belo moço, este Olénine! — exclamou um dos companheiros. — Mas, que demônio de ideia a dele de ir para o Cáucaso como Junker!iii não queria isso nem por cinquenta copeks. Olha lá, jantas amanhã no Clube?
— Janto.
E separaram-se.
O viajante, envolvido na peliça, sentia calor.
Sentou-se no fundo do trenó e abriu o agasalho.
À troika ia-se arrastando por uma rua sombria, depois por outra, passando por outra, passando por casas que ele nunca vira.
Olénine tinha a impressão de que só os que partiam atravessavam aquela rua.
Em torno, tudo era escuro... silencioso, triste. E a sua alma ia cheia de recordações, de amor, de saudades e de lágrimas dulcíssimas que o sufocavam...
CAPÍTULO II
— Amo! amo muito! bravos! bons!
repetia ele, com vontade de chorar.
Mas, por que queria ele chorar?
Quem é que era bravo?
A quem ele amava muito?
Nem ele próprio sabia.
Às vezes, olhava fixamente uma casa qualquer e admirava-se de que ela fosse construída tão estranhamente.
Outras vezes, surpreendia-se pôr o postilhão e Vanucha, que lhe eram pessoas absolutamente desconhecidas, se acharem tão perto dele; e repetia, outra vez:
— Bravos, amo
.
Uma ocasião, chegou mesmo a pronunciar:
— Bravo, admirável!
— e ele próprio ficou assombrado de ter proferido estas palavras, perguntando a si mesmo se não estaria embriagado.
Antes da partida, não só os amigos, os parentes, os indiferentes, mas até os homens antipáticos, todos, como por encanto, se