A história da filosofia para quem tem pressa: Dos pré-socráticos aos tempos modernos em 200 páginas!
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Sobre este e-book
Com o fim da primazia da fé, a filosofia começará a dialogar com o racionalismo e o empirismo. No campo racionalista estarão Descartes, Espinosa e Leibniz, enquanto no empírico, Thomas Hobbes e John Locke dominarão a cena.
No século XVIII, as atividades intelectuais, culturais e científicas alimentarão uma enorme gama de ideias, e o período ficará conhecido como a Era do Iluminismo. Liberdade e democracia serão discutidas, e as crenças religiosas e a autoridade, questionadas. Voltaire, Berkeley, Rousseau e Kant serão as figuras de destaque.
Em seguida, analisaremos o século XIX e as revoluções populares: de um lado, os patrões capitalistas e o liberalismo de livre mercado; do outro, o socialismo, o anarquismo e o comunismo. Por fim, no capítulo sobre os Contemporâneos, uma guerra no mundo da filosofia será declarada entre as escolas analítica, representada por Bertrand Russell e Wittgenstein, e a europeia continental, com Heidegger, Sartre, Foucault e Derrida.
A História da Filosofia para Quem Tem Pressa é um livro abrangente e fascinante, pois examina conceitos e pensamentos filosóficos ao longo do tempo, situando cada filósofo no seu contexto histórico e social.
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A história da filosofia para quem tem pressa - Lesley Levene
CAPÍTULO UM
Os Filósofos Pré-Socráticos
O nome já diz tudo: os pré-socráticos vieram antes de Sócrates, claro. Essa categoria reúne alguns pensadores do mundo antigo, que até podem ter conhecido as ideias do mestre. Entre o fim do século VII e o século V, cada um deles procurou, à sua maneira, explicar como o mundo se formou e explorar a natureza da realidade. Em outras palavras, eles tentavam responder a grande pergunta: Afinal, para que serve tudo isso?
Os primeiros eram da Jônia, situada mais ou menos no meio da costa ocidental da Ásia Menor. Hoje integrando a Turquia, a região foi colonizada pelos gregos, aproximadamente a partir do ano 1000 a.C., e, quando os nossos pré-socráticos entraram em cena, abrigava algumas florescentes cidades-estado. Estas prosperavam graças ao comércio e às relações culturais com o Egito e a Babilônia (o atual Iraque), a leste, ambas as nações célebres pela busca da sabedoria antiga, e também, a oeste, com as colônias gregas do Mar Negro e a Grécia continental. Além disso, a Jônia contava com uma herança literária que, por intermédio de Homero, ligava-a à opulência de Micenas.
Tais condições devem ter propiciado uma vigorosa vida intelectual, pois há fortes indícios de muito interesse pelo pensamento especulativo nos principais centros populacionais — Mileto, Éfeso, Cólofon e Samos —, e grandes pensadores dessas cidades, assim como suas ideias, gradualmente começaram a exercer uma influência que se espraiou pelo resto do mundo.
TALES
(c. 624 — c. 545)
Segundo Aristóteles, que devia saber do que estava falando, Tales de Mileto foi o primeiro autêntico filósofo, o que faz dele o fundador não apenas da filosofia grega, como da europeia. Infelizmente, Tales não deixou uma obra escrita, de modo que suas opiniões são conhecidas apenas por relatos posteriores. Devido a seus interesses práticos e intelectuais aparentemente muito amplos, ele ficou conhecido como engenheiro, matemático, astrônomo e estadista. Dizem que viajou para o Egito, onde se aprofundou em trigonometria — o país era, provavelmente, um importante centro matemático —, e previu com incrível precisão um eclipse solar em 585, com base em mapas celestes babilônicos.
O que nos possibilita falar de Tales e dos pré-socráticos posteriores como filósofos — e não, digamos, como brilhantes matemáticos ou astrônomos — é o fato de que eles acreditavam que o mundo possuía uma unidade subjacente, um elemento físico suscetível de ser identificado, estudado e compreendido racionalmente, para se entender como havia surgido. Apresentava-se, entretanto, um pequeno problema: não tinham a menor ideia de que substância milagrosa era essa.
Seriam muitas as tentativas fracassadas, mas a própria busca significava um passo além da mitologia como explicação dos fatos. Em vez de buscar no comportamento notoriamente irracional dos deuses as respostas sobre o porquê de as coisas serem como eram, esses primeiros filósofos tentavam formular explicações sistemáticas do mundo visível em termos claramente descritivos e analíticos.
Para Tales, a água era a chave de tudo. Tendo observado que ela podia assumir diferentes formas (névoa, gelo, neve, umidade etc.), chegou à conclusão de que devia ser a base do universo — literalmente na verdade, pois considerava que a Terra, plana, flutuava na água e os terremotos eram causados por enormes ondas.
Platão incluiu Tales entre os Sete Sábios
no seu Protágoras, mas ele aparece (com mais frequência) como aquele professor meio distraído em várias anedotas — por exemplo, tropeçando e caindo num fosso por caminhar, muito ocupado, observando as estrelas.
ANAXIMANDRO
(610 — 546)
Nascido em Mileto, Anaximandro muito possivelmente foi discípulo de Tales. Como ele, tinha variados interesses científicos: traçou o primeiro mapa-múndi (muito distante da realidade, é verdade), estudou meteorologia (afirmando que os trovões resultavam da colisão das nuvens) e introduziu o gnômon (o ponteiro do relógio solar) no mundo grego. Igualmente estadista, foi designado dirigente da Apolônia, a nova colônia da sua cidade no Mar Negro. Anaximandro também sucedeu a Tales no terreno filosófico, anotando as próprias ideias — outro pioneirismo —, embora discordasse da premissa de que a água, ou qualquer outro elemento físico, pudesse ser o princípio primordial de tudo.
Anaximandro argumentava que, se fosse conferida preeminência à água, outros elementos, como o fogo, seriam excluídos: embora a água pudesse se transformar em vapor e gelo, não era capaz de conter os opostos seco e molhado. Ele preferia buscar uma substância originária mais universal, não limitada por características físicas. Então, criou o conceito de ápeiron — indefinido, infinito, ilimitado, indeterminado —, do qual surgem todas as coisas e ao qual todas elas retornam, sugerindo que o universo e todos os seus elementos e opostos surgiram de uma separação desse indefinido
.
Para sermos mais específicos, Anaximandro dizia que, quando o calor e o frio escaparam do ápeiron, o vapor frio, mais pesado, solidificou-se formando a Terra — um vasto cilindro flutuando no centro do universo —, ao passo que o calor se expandiu, transformando-se em gigantescos círculos de fogo ao redor dela. O ar existente entre a Terra e o fogo gera um vapor, e só por fendas abertas nesse vapor é que percebemos raios de luz provenientes dos círculos de fogo — aquilo que hoje nós designamos estrelas e planetas. No mundo, pares de opostos — seco/molhado, quente/frio etc. — resultantes da separação inicial procuram constantemente voltar ao ápeiron, conferindo ritmo e unidade ao universo.
Entre outras ideias interessantes, Anaximandro sustentava que o processo coerente de geração do mundo visível provavelmente estaria criando também outros mundos de que ele nada sabia, e que os humanos — originalmente dotados de espinhos na pele, assim como certos peixes — teriam surgido da lama que ficara para trás quando as águas se afastaram da terra. Em suma, a obsessão dos pré-socráticos com a água ainda estava muito presente.
ANAXÍMENES
(c. 585 — 528)
Há ainda um terceiro pensador de Mileto, embora infelizmente não nos tenham chegado dados biográficos a seu respeito. Anaxímenes parece ter retomado a ideia de Tales de que havia uma forma básica de matéria — no seu caso, aér (ar ou vapor) —, mas, segundo ele, essa substância única podia ser transformada em outras substâncias, de acordo com o grau de concentração. Rarefeita, tornava-se fogo; condensada, formava a água e a terra. Além de estabelecer as conexões óbvias com o mundo físico (o Sol como fogo no céu, os relâmpagos provindo das nuvens, o vapor caindo em forma de chuva), ligou o ar ao sopro da vida, à alma, assim levando adiante a ideia do ápeiron de Anaximandro. Para Anaxímenes, a Terra era plana e flutuava no ar como uma folha, assim como acontecia com os corpos celestes, discos de fogo formados a partir da elevação dos vapores rarefeitos.
PITÁGORAS
(c. 570 — c. 490)
Nascido na ilha grega de Samos, Pitágoras — sim, aquele do teorema: o quadrado da hipotenusa é igual… — teria visitado o Egito e a Babilônia antes de se estabelecer em Crotona, colônia grega no sul da Itália, por volta do ano 530. Lá fundou uma comunidade que viria a se tornar, ao mesmo tempo, uma escola matemática e uma confraria religiosa. Como não deixou obras escritas, boa parte do que sabemos sobre Pitágoras provém de relatos posteriores, muitos evidentemente acrescidos ao longo do tempo, assumindo a forma de mitos e lendas. Entre outras coisas, ele teria uma coxa dourada e a incrível capacidade de estar em dois lugares ao mesmo tempo, além de se valer de um espelho para projetar textos na superfície da Lua.
Num nível mais prático, Pitágoras observou que as notas musicais variavam em função do comprimento das cordas do instrumento, deduzindo que as proporções matemáticas fundamentavam a harmonia musical (e com isto introduzia também o conceito de intervalos musicais). A partir daí foi apenas um passo para afirmar que a matemática estava no cerne da realidade — nem a água nem o ar, mas os números. Eram eles que definiam (lembremos do indefinido
de Anaximandro) as formas e tamanhos dos objetos físicos, assim como determinavam o movimento das estrelas e demais corpos celestes, numa relação matemática harmoniosa conhecida como música das esferas.
A partir daí, o pitagorismo se desenvolveu não só como uma filosofia, mas também como um estilo de vida. Seus adeptos adotaram uma atitude contemplativa e frugal, vivendo em comunidades nas quais homens e mulheres eram tratados de forma igualitária e a propriedade, compartilhada. Buscavam uma forma própria de harmonia terrena por meio do ascetismo moral e da purificação ritualística do corpo (as favas eram estritamente proibidas, assim como a carne) e da alma.
Pitágoras afirmava que todas as coisas vivas estavam inter-relacionadas, e acreditava na transmigração da alma — em outras palavras, a alma era imortal e passava para um outro corpo depois da morte —, alegando que ele próprio fora outras pessoas em vidas pregressas.
Muitas de suas ideias seriam expressas mais tarde nos escritos de Platão, particularmente na ênfase em uma realidade pura — no caso de Pitágoras, a matemática e a imortalidade da alma — como fator subjacente à imperfeição das aparências.
XENÓFANES
(c. 570 — c. 475)
Foi provavelmente no ano 546, quando os exércitos vitoriosos de Ciro, o Grande, varreram a Ásia Menor, conquistando as cidades-estado gregas da Jônia para o Império Persa, que Xenófanes deixou sua cidade de Cólofon. Pelo resto da vida, ele percorreria os territórios mediterrâneos, fixando-se por um tempo na Sicília e também visitando Eleia, no sul da Itália, cidade na qual viria a se associar a um importante grupo de filósofos. Escreveu poemas, dos quais chegaram até nós alguns fragmentos, e são eles, assim como referências constantes em obras de outros autores, que nos dão uma ideia da dimensão dos seus interesses.
Xenófanes propôs uma das perguntas filosóficas mais difíceis e perenes: como podemos honestamente alegar conhecer a verdade a respeito de coisas que nós não vimos com os próprios olhos? Em outras palavras, ele apontava a enorme diferença entre opinião e conhecimento verdadeiro, e também afirmava que, embora a verdade exista, só podemos especular a seu respeito. Com base nisso é que voltou sua atenção para toda uma série de temas.
No terreno religioso, em vez de simplesmente rejeitar os atos aleatórios dos deuses como explicação dos acontecimentos, criticou energicamente a tradicional abordagem homérica, que consistia em imputar aos deuses as falhas humanas, como adultério, roubo, fraude (ao que parece, as coisas… não mudaram). Xenófanes argumentava não apenas que isto significava sancionar comportamentos imorais, mas também que esse antropomorfismo — atribuição de características humanas a seres não humanos — só levava a absurdos lógicos. Já era suficientemente confuso que os etíopes tivessem deuses de cabelos negros e os trácios, deuses ruivos, mas que dizer dos cavalos e do gado — como seria a aparência dos seus deuses? Ele ponderava que havia, isto sim, uma única deidade suprema, esférica como o mundo, eterna e imutável, totalmente diferente dos humanos na aparência e na natureza, e agindo pelos poderes da mente.
Voltado para a promoção de um comportamento moral entre os