FPF PTPF 01 0446
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Até 1930 não houve políticas de Educação de Adultos no Brasil, mas um conjunto de
práticas de alfabetização totalmente esvaziadas de conteúdos e metodologias próprias
para os adultos. No Brasil Colônia, grande parte da elite era analfabeta e, segundo
Haddad e Di Pierro (1999, p. 108-109),
[...] a comunicação, nas suas diferentes dimensões, era oral,
baseada na récita e na memorização. O Ensino jesuítico dedicava
a esse segmento social o ensino da Filosofia e da Retórica. Para
os escravos e indígenas, os jesuítas lançavam mão da
catequização, com o intuito de domar os corpos e o espírito para
o exercício da obediência e da submissão. Os jesuítas
transmitiam normas de comportamento e ensinavam os ofícios
necessários ao funcionamento da economia colonial, inicialmente
aos indígenas e, posteriormente, aos escravos negros.
No Brasil Império, após a expulsão dos jesuítas pelo governo português, o ensino
jesuítico dá lugar às aulas régias, ministradas por pessoas convidadas, sem formação para
o magistério e sem um currículo mínimo que “norteasse” as atividades didáticas. Com a
vinda da família real, a coroa portuguesa trouxe novas demandas e criou-se um conjunto
de iniciativas culturais e educativas, mas ainda sem uma organização curricular. De 1808
até a proclamação da Independência, nada acontece em favor da educação para o povo e
somente a elite da época tinha “permissão social” para se educar.
Antoine Louis Claude Desttut de Tracy, em 1802 (apud FRIGOTTO, 1987, p. 15),
expunha aquilo que historicamente vem se concretizando até os dias atuais:
Os homens de classe operária têm desde cedo a necessidade do
trabalho de seus filhos. Essas crianças precisam adquirir desde
cedo o conhecimento e, sobretudo o hábito e a tradição do
trabalho penoso a que se destinam. Não podem, portanto, perder
tempo nas escolas [...]. Os filhos da classe erudita, ao contrário,
podem dedicar-se a estudar durante muito tempo; têm muitas
coisas para aprender para alcançar o que se espera deles no
futuro.
1
O conceito de letramento aqui se refere ao conhecimento das letras
e de alguns conceitos matemáticos.
O que provoca uma tomada de posição do Estado é o movimento
de redemocratização do país, após a ditadura de 1937-1945,
aliado às iniciativas mundiais da recém criada UNESCO, ao final
da Segunda Guerra Mundial. Em 1947, com o aproveitamento
dos recursos do Fundo Nacional do Ensino Primário, a União
lança, em plano nacional, a primeira Campanha de educação de
adolescentes e Adultos (CEAA).
O Sistema Paulo Freire foi um divisor de águas na Educação de Adultos, pois marcou a
ruptura do paradigma compensatório e possibilitou uma compreensão da EJA que a
caracteriza, politicamente, como campo de direitos e, metodologicamente, como
modalidade com especificidade. Paulo Freire ressignificou conceitos, criou categorias e
consolidou uma nova visão da EJA. Para melhor compreender o caráter inovador do
Sistema Paulo Freire e o impacto que ele proporcionou, seguem, sinteticamente, as suas
principais características.
A visão de currículo expressa por esses dois estudiosos tem pautado, não só a EJA, mas
todo o sistema educacional até hoje, justificando a adoção de práticas escolares voltadas
para a educação vocacional e moral e submetendo a escola às exigências do capital, na
medida em que valoriza saberes voltados exclusivamente à formação de conhecimentos
técnicos voltados para a preparação de mão de obra para o mercado de trabalho.
As diferentes vozes da EJA estiveram silenciadas e ausentes (nas políticas, nas
metodologias e acima de tudo no currículo para EJA). Percebe-se, no entanto, que este
vazio está sendo preenchido, por meio das lutas dos movimentos sociais que atuam nessa
modalidade e também, no que tange à compreensão e formulação de um currículo para
EJA, por propostas, resultantes de estudos e pesquisas, que o concebem atualmente
como:
a) elemento integrador das diferentes culturas presentes na sala de aula;
b) instrumento capaz de provocar a análise crítica da realidade e de desvelar
intencionalidades;
c) aglutinador das vozes silenciadas;
d) capaz de compreender e valorizar a complexidade;
e) experiência coletiva de criação e reinvenção do mundo;
f) deflagrador de prática sociais humanizadoras e solidárias;
g) processo complexo e contínuo de ação-reflexão-ação;
h) capaz de integrar as diferentes áreas do conhecimento e romper com a fragmentação
das disciplinas e incorporar a transversalidade, a interdisciplinaridade e a
intertransculturalidade em seus processos formativos.
Essa perspectiva de currículo ganha cada vez mais espaço nas práticas cotidianas e
também nos documentos oficiais, mas em ambas ainda necessita se fortalecer e romper
definitivamente com a visão tradicional de currículo que desconsidera as vivências
culturais dos educandos e educandas e reconhece uma única cultura, uma única história,
uma única verdade; uma visão de currículo de EJA que desconsidera os sujeitos que dela
fazem parte e valoriza somente o saber dos especialistas, enfim uma visão que ignora a
complexidade e reduz os saberes à aquisição de algumas técnicas.
Ao adentrar na segunda década do século XXI, percebe-se que a sociedade tem o desafio
de acelerar o processo de zerar o analfabetismo e finalizar este triste capítulo da história,
tornando desnecessária a existência da EJA.
Para isso, faz-se necessário continuar preenchendo, com qualidade e equidade, o vazio
das políticas públicas, das metodologias e do currículo, que marcou a Educação de
Jovens e Adultos no Brasil até os dias atuais.
As vozes silenciadas ao longo dos mais de quinhentos anos de nossa existência
permitiram que o currículo assumisse um papel secundário, burocrático e, por que não
dizer, homogeneizador, desconsiderando as individualidades e as particularidades
características desta modalidade.
A expressão grade curricular tem uma conotação engessante, pois o substantivo grade
associa o currículo a algo limitador, que inviabiliza a interação.
Nesse sentido, as grades curriculares excluem os sujeitos da escolha do que querem e
precisam aprender, mantendo-os “presos” e passivos, sem o exercício da autonomia e da
participação.
Para libertar das grades e avançar em direção a um currículo que incorpore os sujeitos da
EJA, cabe-nos algumas reflexões: Como tornar o currículo vivo, dinâmico, conectado ao
mundo e ao educando? Como garantir a organização, a acessibilidade, a qualidade e a
relevância do currículo voltado para atender jovens (e até adolescentes, já que não se
pode desconsiderar a sua existência nos cursos de EJA), adultos e idosos? Como tornar a
escola um centro de referência cultural da comunidade?
Esses questionamentos colocam a necessidade emergente de uma definição clara de
currículo para esta modalidade da educação, entendida aqui como direito fundamental.
Portanto, um currículo que considere as especificidades desses educandos jovens, adultos
e idosos que tiveram negados seus direitos de ler, escrever e se apropriar das diferentes
formas de utilização da linguagem matemática como das mais variadas formas de
linguagens convencionais quando ainda eram crianças, por uma sociedade injusta e
excludente, que cria o analfabeto e depois o marginaliza como se nada tivesse a ver com
o problema gerado pelo sistema político-econômico adotado pela pequena minoria que
ainda controla o poder no nosso País.
Em primeiro lugar, não se pode pensar em currículo como um simples rol de conteúdos
fechados em si mesmos que caiba em qualquer realidade e para qualquer público, não
importando as necessidades e os desejos do conjunto dos educandos e educandas que
deva atender. Segundo Silva (2003, p. 150),
A Educação de Jovens e Adultos deve ser assegurada como direito à educação escolar aos
jovens e adultos que, pelas razões mais diversas, não tiveram a oportunidade de
frequentar ou de concluir a Educação Básica; portanto, a oferta da EJA nas escolas
representa a garantia do direito aos cidadãos à Educação Básica, independentemente de
sua idade. A fim de garantir a qualidade desta educação, é necessário pensar no tipo de
currículo que se quer e deve trabalhar.
Por isso, para Brandão (BRANDÃO; FEITOSA; AMARAL, 2009, p. 20), criar um
currículo de Educação de Jovens e Adultos é
[...] bem mais do que distribuir alguns saberes temáticos ao longo
de um tempo de estudos. É mais até do que procurar integrar
estes saberes-a-serem-ensinados com as experiências de vida
trazidas pelos participantes da comunidade aprendente de uma
turma de EJA. Criar um currículo é estabelecer momentos de
diálogo entre culturas através de pessoas. É integrar
espaços/tempos educativos, de tal modo que através de encontros
de vidas, de identidades, de afetos, de saberes individuais e de
significados culturais, pessoas em interação dialoguem e, assim,
mutuamente se ensinem e aprendam. Elaborar um currículo é
trazer para um campo da educação momentos e dimensões de
uma cultura. De um modo de vida próprio de uma comunidade
cultural, que deve ser re-traduzido e sintetizado em um currículo,
como uma proposta de saberes-sentidos que devem ser
dialogicamente ensinados-e-aprendidos.
Algumas questões são necessárias para definir o currículo adequado ao trabalho com
jovens, adultos e idosos. Entre elas está a garantia da formação integral destes sujeitos,
uma educação capaz de envolver e abordar os conhecimentos diversos, habilidades,
competências – técnicas e estratégicas –, bem como a solidificação de atitudes sociais
críticas, principalmente no que se refere ao exercício da cidadania. Na construção de um
currículo para a EJA, vale destacar que o foco deve estar no sujeito mais do que na
estrutura, isso porque é na ação do sujeito que se estabelece o conhecimento. Os sujeitos
da EJA são ativos, vivenciam diferentes realidades, na maioria das vezes, duras e
desafiantes, e estão o tempo todo produzindo saberes e culturas. Portanto, é necessária a
participação desses sujeitos na elaboração do seu próprio currículo como forma de
superar a dicotomia existente entre os saberes escolares e os saberes docentes e discentes.
Para Freire (1993, p. 93),
Perguntar-nos em torno das relações entre a identidade cultural,
que tem sempre um corte de classe social, dos sujeitos da
educação e a prática educativa é algo que se nos impõe. É que a
identidade dos sujeitos tem que ver com as questões
fundamentais de currículo, tanto o oculto quanto o explícito e,
obviamente, com questões de ensino e aprendizagem.
A história tem mostrado a ausência dos sujeitos da EJA na formulação do currículo. Mas
não se trata de uma ausência consentida ou consensual. Ela é imposta e mantida por quem
se interessa pela sua manutenção. Ao constatar a ausência dos sujeitos da EJA, tanto na
definição e implementação de políticas públicas quanto na formulação do currículo, cabe-
nos evidenciar quem são esses sujeitos.
O documento base nacional preparatório à VI Confintea define a EJA como,
Nesse sentido, cabe enxergar a diversidade com naturalidade, uma vez que ela se
constitui nas diferenças que distinguem os sujeitos uns dos outros, ao contrário da
desigualdade, que acentua essas diferenças numa perspectiva opressora. Não há como
falar em educação cidadã, se ela não permite a seus sujeitos históricos a construção de
seus próprios componentes curriculares, referenciados na busca pela superação das
desigualdades sociais que têm excluído a população jovem e adulta dos direitos sociais
fundamentais.
O tempo e o espaço estão presentes na cultura escolar e, no caso específico da Educação
de Jovens e Adultos, requerem uma compreensão alargada, afinal, para aqueles que
passaram boa parte de suas vidas num descompasso entre o tempo da formação escolar e
o tempo do trabalho, chega a hora decisiva de buscar conciliar essas duas necessidades
fundamentais.
O currículo se insere neste espaço como um organizador da vida escolar. É no currículo
que se inscrevem os sonhos, os desejos, as aspirações dos diferentes sujeitos que ali
convivem.
Por isso, as propostas curriculares devem ser elaboradas pelos sujeitos envolvidos no
processo educativo (educandos, educadores, gestores, equipes pedagógicas das
Secretarias de Educação, comunidade etc.). A elaboração de um currículo local possibilita
uma aproximação maior entre os sujeitos do ato educativo (educador e educando) e entre
eles e o objeto do conhecimento, rompendo com a hierarquia dos saberes escolares em
detrimento dos saberes que os educandos trazem em suas vivências.
Permite também uma maior apropriação dos conceitos e das metodologias utilizadas, bem
como o exercício permanente de análise das práticas cotidianas.
Neste currículo tudo é significativo, pois teve como base para sua construção as
experiências docentes e discentes e os desejos e aspirações de seus diferentes
elaboradores.
Antônio Flávio Barbosa Moreira (1996, p. 13), especialista em currículo da Universidade
Federal do Rio de Janeiro, afirma que
Um currículo nacional acaba por privilegiar o discurso dos
dominantes, tendendo a excluir das salas de aula, os discursos e
as vozes dos grupos sociais oprimidos, vistos como não
merecedores de serem ouvidos no espaço escolar.
Desde 1948, quando foi proclamada, pela Assembleia Geral das Nações Unidas, a
Declaração Universal dos Direitos do Homem, a educação conquistou um status de
direito fundamental, reconhecido mundialmente.
Garantir o direito à educação para todos seria, desde então, condição essencial para o
desenvolvimento de todas as nações que almejassem construir para si uma sociedade
mais pacífica e igualitária. Contudo, esse reconhecimento não tem se revertido em
práticas concretas. Em nosso País, negado desde a infância, o direito à educação tem sido
soterrado pela necessidade de sobrevivência, num mundo desigual e excludente que não
tem garantido nem mesmo direitos elementares como o da alimentação, moradia etc.
O caminho que deveria levar desde cedo à escola sofre, então, bruscas mudanças de rota
e passa a ter como principal objetivo a preservação da própria vida. Em decorrência
disso, milhões de crianças são obrigadas a abandonar os estudos antes de concluí-los ou
sequer têm a oportunidade de iniciá-los. Contudo, não é somente a necessidade de
trabalhar para sobreviver que contribui para que o direito à educação seja violado. Muitos
dentre aqueles que puderam iniciar o processo de escolarização foram expulsos da escola
por um currículo alienado de suas reais necessidades, distante de suas experiências de
vida, composto por disciplinas fragmentadas, pouco atrativas, desprovidas de sentidos, e
organizado com base em tempos e espaços alheios às suas culturas. Mas o mundo
imprime à existência desses excluídos da educação a necessidade de aprender
diariamente. Atualmente, essa necessidade tem sido acirrada pelo contexto da
globalização, em que as distâncias são estreitadas pelos meios de comunicação. No
mundo globalizado, altamente tecnológico, não basta mais dominar uma técnica de
produção para garantir a permanência no trabalho. Isto porque o trabalho tem assumido
formas cada vez mais imateriais.
Hoje, a informação galgou a condição de capital, e é preciso saber obtê-la, tratá- la e
operar por meio dela em situações produtivas, transformando-as em conhecimentos.
Nesse contexto, a educação ganha uma relevância cada vez maior, mas o caminho
“regular” para a progressão dos estudos passa a ser árduo e praticamente impossível de
ser trilhado por milhões de jovens brasileiros.
Premidos pela necessidade dessa progressão e diante das barreiras que o caminho lhes
apresenta, resta-lhes a possibilidade de “cortar caminho”, pegando um atalho que lhes
permitirá chegar ao mesmo lugar que aqueles que tiveram suas trajetórias facilitadas –
por questões econômicas – porém em menos tempo. A EJA tem se constituído nesse
atalho.
Embora esse atalho permita chegar mais rápido, é preciso manter a mesma qualidade dos
demais caminhos. Nesse sentido, a EJA não pode ser tratada como um processo
aligeirado de qualidade questionável. Para além do caráter reparatório das injustiças
cometidas outrora, a EJA deve buscar formas cada mais inovadoras de constituir-se como
educação “de ponta”, conforme previsto na Declaração de Hamburgo (UNESCO, 1997):
A educação de adultos torna-se mais que um direito: é a chave
para o século XXI; é tanto consequência do exercício da
cidadania como condição para uma plena participação na
sociedade. Além do mais, é um poderoso argumento em favor do
desenvolvimento ecológico sustentável, da democracia, da
justiça, da igualdade entre os sexos, do desenvolvimento
socioeconômico e científico,além de um requisito fundamental
para a construção de um mundo onde a violência cede lugar ao
diálogo e à cultura de paz baseada na justiça.
I CONFINTEA
Contexto/Tema - Contexto do pós-guerra – busca pela paz
Período/Local - 1949 – Elsinore, Dinamarca.
Participação - 106 delegados, 21 organizações internacionais e 27 países.
Resultados/Recomendações:
- que os conteúdos da Educação de Adultos estivesse de acordo com as suas
especificidades e funcionalidades;
- que fosse uma educação aberta, sem pré-requisitos;
- que os problemas das instituições e organizações com relação à oferta precisariam ser
debatidos;
- que se averiguassem os métodos e técnicas e o auxílio permanente;
- que a Educação de Adultos seria desenvolvida com base no espírito de tolerância,
devendo ser trabalhada de modo a aproximar ospovos, não só os governos;
- que se levasse em conta as condições de vidas das populações de modo a criar
situações de paz e entendimento.
II CONFINTEA
Contexto/Tema - Mundo em mudança, de acelerado crescimento econômico e de intensa
discussão sobre o papel dos Estados frente à Educação de Adultos.
Período/Local - 1960 – Montreal, Canadá.
Participação - 47 Estados-membros da Unesco, 2 Estados como observadores, 2 Estados
associados e 46 ONGs.
Resultados/Recomendações - Consolidação da Declaração da Conferência Mundial de
Educação de Adultos que contemplava um debate sobre o contexto do aumento
populacional, de novas tecnologias, da industrialização, dos desafios das novas gerações
e a aprendizagem como tarefa mundial, onde os países mais abastados devessem cooperar
com os menos desenvolvidos.
III CONFINTEA
Contexto/Tema - Educação de Adultos e Alfabetização. Tema: Mídia e Cultura.
Período/local - 1972 – Tóquio, Japão.
Participação - 82 Estados-membros, 3 Estados na categoria de observador (incluso Cuba),
3 organizações pertencentes às Nações Unidas, 37 organizações internacionais.
Resultados/Recomendações - O relatório final concluiu que a Educação de Adultos é um
fator crucial no processo de democratização e desenvolvimentos econômico, social e
cultural das nações, sendo parte integral do sistema educacional na perspectiva da
aprendizagem ao longo da vida.
IV CONFINTEA
Contexto/Tema - “Aprender é a chave do mundo.”
Período/local - 1985 – Paris, França.
Participação - 841 participantes de 112 Estados-membros, Agências das Nações Unidas e
ONGs.
Resultados/Recomendações - Importância do reconhecimento do direito de aprender
como o maior desafio para a humanidade. Entendendo por direito o aprender a ler e
escrever, o questionar e analisar, imaginar e criar, ler o próprio mundo e escrever a
história, ter acesso aos recursos educacionais e desenvolver habilidades individuais e
coletivas. A conferência incidiu sobre as lacunas das ações governamentais quanto ao
cumprimento do direito de milhares de cidadãos terem suas passagens pelos bancos
escolares com propostas adequadas e com qualidade.
V CONFINTEA
Contexto/Tema - Aprendizagem de adultos como ferramenta, direito, prazer e
responsabilidade. Antes da Conferência foi realizado uma ampla consulta às cinco
grandes regiões mundiais consideradas pela Unesco e também às ONGs, de onde foram
consolidados relatórios para a Conferência Internacional.
Período/local - 1997 – Hamburgo, Alemanha.
Participação - Mais de 170 Estados-membros, 500 ONGs e cerca de 1.300 participantes.
Resultados/Recomendações - Mobilização atravessou fronteiras temáticas e de ação:
através da liderança do Icae e alianças com governos progressivos, houve uma intensa
mobilização de ONGs e do movimento de mulheres, mesmo que sem direito a voto.
CONFINTEA + VI
Contexto/Tema - Estados-membros da Unesco foram convocados a reexaminarem os
compromissos com a EJA firmados na Conferência de 1997. A reunião para o Balanço
Intermediário foi influenciada pelo clima de Fórum Social Mundial e foi uma chamada de
responsabilização dos Estados-membros com a finalidade de implementar a Agenda de
Hamburgo e de concretizar a Confintea VI, em 2009.
PERÍODO/LOCAL 2003 – Bangcoc, Tailândia.
Participação - Nesta reunião, a participação das ONGs foi bastante organizada e, ao
contrário de outros anos, os Estados-membros não enviaram delegações de alto perfil.
Resultados/Recomendações - Deste encontro também foi ressaltado a necessidade de
criação de instrumentos de advocacia para Educação de Adultos, em nível local e global,
em espaços dentro e fora da Unesco.
VI CONFINTEA
Contexto/Tema - Pela primeira vez, a Confintea foi realizada em um país da América do
Sul. Ênfase no papel central da educação e aprendizagem de adultos nos programas
internacionais em educação e desenvolvimento, especialmente aqueles relativos ao
desenvolvimento sustentável.
Período/Local - 2009 – Belém, Brasil.
Participação - 1.500 participantes na Conferência, incluindo representantes de mais de
156 Estados-membros da Unesco, além de outros parceiros das Nações Unidas, de
organizações internacionais de cooperação bilateral e multilateral, da sociedade civil e do
setor privado, assim como estudantes adultos de várias partes do mundo.
Resultados/Recomendações - Marco de ação de Belém – Traz orientações que incluem
recomendações para as políticas de EJA e oferecem diretrizes que permitem ampliar o
referencial para a busca de uma Educação de Jovens e Adultos mais inclusiva,
participativa e equitativa.
Pode-se perceber, com essa síntese das Conferências Internacionais, a indissociabilidade
entre os processos de alfabetização e continuidade, por um lado, e as especificidades de
cada uma dessas etapas da Educação Básica, por outro. As Confinteas têm, em geral, esse
caráter mais político, apresentando recomendações para os países membros, mas elas
acabam por incidir também no currículo da EJA, pois ele carrega em si a dimensão
política.
As recomendações da I Confintea apresentaram uma forte preocupação com o currículo
na medida em que reforçaram a necessidade de atender as especificidades e
funcionalidades da EJA. Orientaram também a necessidade de averiguação dos métodos e
técnicas e de apoio e acompanhamento aos programas de EJA. A preocupação com as
condições de vida das populações e com a convivência harmoniosa entre os povos e
nações apontou para a necessidade de construção de um currículo com dimensões
planetárias, com base na justiça social, igualdade e equidade.
Na II Confintea destaco como principal contribuição ao currículo a questão das novas
tecnologias, que, como podemos constatar sessenta anos depois, foram responsáveis pela
consolidação de um novo paradigma educacional.
A III Confintea trouxe como contribuição ao currículo a valorização da Educação de
Adultos como indutora dos processos de democratização e desenvolvimento econômico,
social e cultural das nações. Essa visão da EJA impacta significativamente o currículo, na
medida em que reconhece, nessa modalidade, a capacidade de transformar a sociedade a
partir da transformação dos sujeitos que a compõem.
As Confinteas IV e V e a Confintea + VI tiveram suas ênfases no campo dos direitos,
denunciando as lacunas de ações governamentais no cumprimento ao direito inalienável
de educar-se ao longo da vida e conclamando movimentos sociais e ONGs para participar
da luta pela universalização da Educação de Jovens e Adultos até que o analfabetismo
seja totalmente eliminado.
Nesse sentido, pode-se afirmar que a dimensão curricular permeou as discussões das seis
Confinteas, fazendo dessa instância global de participação um importante espaço de
análise da EJA que temos rumo à construção da EJA que queremos. Mas o valor desses
encontros não está somente nos produtos que eles proporcionam.
Vale destacar o valor formativo do processo preparatório à VI Confintea envolvendo
Estado e sociedade civil, com seus diversos segmentos (educadores/professores de EJA,
educandos de EJA, gestores municipais e estaduais, universidades, movimentos sociais e
sindical, universidades etc.)
Referências
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MOREIRA, Antonio Flávio Barbosa. Os Parâmetros Curriculares Nacionais em questão.
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