P1 - Stella
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CIRROSE HEPÁTICA
• Para haver cirrose, é necessário um profundo remodelamento da citoarquitetura do parênquima hepático,
além é claro, da presença de extensa fibrose tecidual.
O desarranjo estrutural que caracteriza a cirrose hepática pode ser decorrente de qualquer doença hepática crônica,
e quando bem estabelecido, infelizmente, é irreversível
Anatomia:
Os sinusoides conduzem o sangue das circulações porta e sistêmica (ramos da veia porta e artéria hepática presentes
nos espaços porta) para a veia centrolobular (pertencente ao sistema cava). Durante esta passagem, substâncias
provenientes do sangue são captadas pelos hepatócitos para serem metabolizadas.
Os sinusoides:
Fisiopatologia:
• Células estreladas normalmente são “quiescentes” (isto é, apresentam pouca atividade metabólica) e têm a
função primordial de armazenar vitamina A.
• Presença de certos estímulos (ex.: atividade necroinflamatória crônica no parênquima) → células de Kupffer
produzam citocinas pró-inflamatórias → transformação das células estreladas em células capazes de
sintetizar matriz extracelular (em particular colágeno tipo I e III) → deposição de fibras colágenas no espaço
de Disse → FENÔMENO DE CAPILARIZAÇÃO DOS SINUSOIDES (camada de colágeno, pouco permeável,
oblitera as fenestras e impede o contato entre os hepatócitos e as substâncias oriundas do sangue) →
comprometimento da capacidade de metabolização hepática e de secreção, no sangue, de macromoléculas
produzidas pelos hepatócitos + perda das microvilosidades dos hepatócitos
• A capilarização dos sinusoides também diminui seu calibre, o que aumenta a resistência vascular intra-
hepática (fator crucial na GÊNESE DA HIPERTENSÃO PORTA).
• FIBROSE EM PONTE (PORTA-CENTRO) → O sangue passa a circular por dentro dessas traves fibróticas sem
entrar em contato com as placas de hepatócitos, numa espécie de shunt intra-hepático, indo diretamente
dos espaços-porta para as veias centrolobulares.
• Doença hepática crônica → atividade necroinflamatória persistente → regeneração hepatocitária fique
restrita aos espaços formados entre diversas traves fibróticas interligadas → “NÓDULOS DE REGENERAÇÃO”
GASTROENTEROLOGIA – P1 STELLA ABUJAMRA | TURMA XLI
→ massa de hepatócitos desprovida de funcionalidade (tais nódulos não possuem relação com uma veia
centrolobular).
• O encontro desse “panorama histopatológico” (fibrose em ponte + nódulos) tem o poder de confirmar o
diagnóstico de cirrose hepática (logo, método “padrão-ouro” = biópsia).
Fígado cirrótico → aspecto macro ou micronodular na superfície do órgão. O tamanho do fígado depende do grau de
cirrose: nos casos mais avançados, a tendência é sua redução e atrofia como um todo! Por outro lado, um dado
semiológico patognomônico de cirrose é o encontro de redução do lobo hepático direito (< 7 cm) à hepatimetria de
percussão, associado a um lobo esquerdo aumentado, palpável abaixo do gradil costal, de superfície nodular e
consistência endurecida
Manifestações clínicas:
Diagnóstico:
2. Exames Laboratoriais
o Aminotransferases
• Na cirrose inativa (ou seja, sem atividade inflamatória), as aminotransferases podem estar completamente
normais.
• Logo, é importante compreender que as aminotransferases não possuem acurácia suficiente para estimar a
gravidade da doença hepática!
• Quando aumentadas, sugerem atividade inflamatória no parênquima.
• Hepatopatia sem cirrose → os níveis de ALT (TGP) costumam ser maiores que os de AST (TGO), dando uma
relação ALT/AST > 1.
• Hepatopatia com cirrose → inversão desse padrão, com o paciente apresentando ALT/AST < 1.
• Doença hepática alcoólica → a relação ALT/AST costuma ser < 1 mesmo nas fases pré-cirróticas
• O encontro de elevados níveis de FAL e GGT sugere etiologias como cirrose biliar primária e colangite
esclerosante.
o Bilirrubinas
• A hiperbilirrubinemia é um fator de mau prognóstico na cirrose hepática, ocorrendo principalmente à custa
da fração direta.
o Hipoalbuminemia
• Denota insuficiência crônica de síntese hepatocelular.
• O deficit de síntese costuma se associar à desnutrição proteicocalórica, comum no paciente cirrótico, o que
piora ainda mais a hipoalbuminemia.
• Isto é particularmente frequente nos etilistas crônicos portadores de cirrose alcoólica
o Hipergamaglobulinemia (IgG)
• O cirrótico apresenta tendência aumentada à ocorrência do fenômeno de translocação intestinal bacteriana
(bacteremia espontânea a partir do trato gastrointestinal).
• O menor clearance hepático de bactérias presentes no sangue portal, bem como a “fuga” dessas bactérias
pelos shunts portossistêmicos, explicam tal fato.
• Assim, o braço humoral do sistema imunológico (linfócitos B) sofre um certo grau de hiperestimulação
constante na cirrose hepática, o que pode resultar em hipergamaglobulinemia policlonal quando da presença
de cirrose hepática avançada e hipertensão porta grave.
✓ Doença hepática alcoólica → aumento da fração IgA;
✓ Cirrose biliar primária → aumento da fração IgM;
✓ Hepatite autoimune → há elevação de IgG.
o Sódio sérico
• A hiponatremia é um marcador de péssimo prognóstico na cirrose avançada com ascite.
• Seu mecanismo é a incapacidade de excretar água livre, decorrente do excesso de Hormônio Antidiurético
(ADH).
• Este excesso, por sua vez, é estimulado pela redução do volume circulante efetivo (secreção “não osmótica”
de ADH).
o Pancitopenia
• Na cirrose avançada complicada por hipertensão portal há esplenomegalia e hiperesplenismo, com
consequente redução do número de plaquetas circulantes (sinal mais precoce), mas também da
hematimetria e da contagem de leucócitos (sinais mais tardios).
• A anemia do paciente cirrótico, na verdade, costuma ser multifatorial (ex.: desnutrição, sangramento
digestivo crônico, supressão medular pelo álcool ou por vírus), sendo muito comum, ainda, a ocorrência de
anemia de doença crônica, secundária à doença de base.
3. Exames de Imagem
GASTROENTEROLOGIA – P1 STELLA ABUJAMRA | TURMA XLI
• Nas fases iniciais da cirrose hepática, todos esses exames podem ser normais
• Por outro lado, nas fases mais avançadas, a USG, TC e a RM costumam detectar alterações sugestivas da
doença.
• As alterações mais encontradas na cirrose hepática bem estabelecida:
o Nodularidade da superfície hepática.
o Heterogeneidade do parênquima hepático.
o Alargamento da porta hepatis e da fissura interlobar.
o Redução volumétrica do lobo hepático direito e do segmento médio do lobo hepático esquerdo.
o Aumento volumétrico do lobo caudado e do segmento lateral do lobo hepático esquerdo.
o Identificação de nódulos regenerativos (neste caso, a RM constitui método superior aos demais)
• Nesse sentido, a USG (e com menor frequência, a TC) é utilizada no rastreamento semestral de CHC em
pacientes sabidamente cirróticos, juntamente com a dosagem sérica da alfafetoproteína.
4. Biópsia Hepática
• O padrão-ouro para o diagnóstico de cirrose hepática é a histopatologia, com base no achado de espessos e
completos septos fibrosos porta-centro e porta-porta, os quais delimitam nódulos, resultando em uma
completa desorganização da arquitetura lobular e vascular.
• Quando os dados clínicos, laboratoriais e radiológicos são extremamente sugestivos de cirrose avançada
(ex.: ascite, esplenomegalia, hipoalbuminemia, INR alargado, fígado atrofiado, heterogêneo e nodular) a
biópsia geralmente é desnecessária (e até arriscada).
A biópsia hepática, além de confirmar o diagnóstico de cirrose, também pode fornecer pistas quanto a sua etiologia
(ex.: através de métodos imuno-histoquímicos).
Etiologia:
▪ Hepatite C crônica e a doença hepática alcoólica sejam responsáveis por cerca de 80% dos casos de cirrose
no Brasil!
Tratamento:
• A cirrose hepática é considerada uma condição irreversível.
• Assim, seu tratamento seria primariamente baseado no manejo de suas complicações – encefalopatia
hepática, hipertensão portal, ascite etc
Sendo assim, o tratamento da cirrose hepática pode ser didaticamente dividido em cinco pontos:
• Terapia antifibrótica
o Colchicina, o propiltiouracil, o interferon, a lecitina poli-insaturada e o S-adenosil-metionina (SAME);
o Colchicina é a mais utilizada
• Terapia nutricional
Os cirróticos tendem a ser hipercatabólicos e desnutridos, sendo que a desnutrição agrava a intensidade de disfunção
hepática
o É importante salientar que não existe indicação de restrição proteica. Da mesma forma, não há
necessidade de reduzir a ingestão de gorduras, mesmo nos pacientes colestáticos
o Refeições frequentes devem ser encorajadas (como por exemplo, um lanche noturno), o que ajuda a
manter um balanço nitrogenado adequado
o Evitar a ingestão de frutos do mar em virtude do risco potencial de sepse grave e morte através da
infecção com Vibrio vulnificus e Yersinia sp.
• Tratamento específico da causa
• Tratamento das complicações da cirrose
o A correção da deficiência de vitaminas (complexo B, A, D, E, K) é particularmente importante em
pacientes com
cirrose alcoólica e
nas cirroses com
significativo
componente
colestático
• Transplante hepático
• Tratamento de causas que
atacam o fígado
o É mandatório
avaliar o status
sorológico do
paciente em relação
aos vírus da
hepatite A e B, e
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caso o paciente seja suscetível (isto é, anti-HAV IgG negativo e/ou anti-HBs negativo) ele deve ser
vacinado.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
Cirrose Compensada
• A cirrose é assintomática
• Fadiga inespecífica, libido diminuída ou distúrbios do sono podem
ser as únicas queixas.
• Cerca de 40% dos pacientes com cirrose compensada possui varizes
esofágicas. Varizes gastroesofágicas não hemorrágicas são
assintomáticas e sua presença (sem sangramento) não denota
descompensação.
Cirrose Descompensada
• Neste estágio existem sinais de descompensação: ascite, varizes hemorrágicas, icterícia, encefalopatia
hepática ou qualquer combinação desses achados.
• A ascite, que é o sinal mais frequente de descompensação, está presente em 80% dos pacientes com cirrose
descompensada.
• A perda progressiva de hepatócitos funcionantes leva a uma série de alterações que se instalam de maneira
insidiosa:
o Fases iniciais = Distúrbios endócrinos e hemodinâmicos
o Fases tardias = Problemas como encefalopatia hepática, hipoalbuminemia e coagulopatia
COMPLICAÇÕES INICIAIS
Sinais de Hiperestrogenismo/Hipoandrogenismo
• A ponta dos dedos torna-se “abaulada” na base da unha, dando ao dedo um aspecto de “baqueta de
tambor”.
• O que ocorre é um aumento volumétrico do tecido subcutâneo vascularizado da extremidade digital, por
mecanismos ainda desconhecidos.
Distúrbios hemodinâmicos
Hipertensão portal → desviar o sangue mesentérico para a circulação cava, sem passar pelo fígado, perde-se o “filtro
hepático” contra as bactérias Gram-negativas provenientes da translocação intestinal → endotoxina das bactérias
Gram-negativas (LPS) + IL-6 + TNF-alfa → síntese endotelial de NO → vasodilatação esplâncnica → desloca uma
parte da volemia para este território vascular, reduzindo, por conseguinte, o volume sanguíneo que perfunde os outros
órgãos e tecidos (chamado “volume arterial efetivo”) → ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona +
sistema nervoso simpático + liberação de ADH → estimulam os rins a reterem sal e água → aumenta a volemia total
→ volume sanguíneo adicional está quase todo “sequestrado” nos vasos esplâncnicos dilatados → não consegue
corrigir o déficit de “volume arterial efetivo” → processo então se perpetua → retenção hidrossalina continua e
progride → excesso de líquido presente no território mesentérico começa a transudar diretamente para a cavidade
peritoneal em consequência ao aumento de permeabilidade que acompanha a vasodilatação, fenômeno
potencializado pela hipoalbuminemia → paciente começa a formar ascite
COMPLICAÇÕES TARDIAS
Encefalopatia hepática
É importante ressaltar que o fígado normal depura quase toda a amônia presente no sistema porta. Os hepatócitos
transformam esse composto de alta toxicidade no aminoácido glutamina ou numa substância bem menos tóxica
para o organismo – a ureia.
• Em primeiro lugar, a natureza “metabólica” da disfunção cerebral é revelada pela sua reversibilidade (pelo
menos parcial) e pela ausência de alterações neuropatológicas orgânicas que, por si só, poderiam explicar a
síndrome.
• Surge degeneração de células nervosas e de fibras axonais do cérebro, cerebelo e medula espinhal, com
áreas de cavitação microscópicas, conferindo uma aparência esponjosa. Para esse tipo de alteração patológica
emprega-se o termo “degeneração hepatocerebral adquirida”.
Sinais e Sintomas:
• EH mínima
• EH aguda esporádica, espontânea ou desencadeada por “fatores precipitantes”.
• EH crônica, continuamente sintomática.
• EH associada à insuficiência hepática fulminante
A encefalopatia hepática “manifesta” compreende várias anormalidades neurológicas e psiquiátricas, tais como
distúrbios de comportamento (agressividade, agitação), sonolência/ letargia, inversão do ciclo sono-vigília (insônia
noturna com sonolência diurna), fala arrastada com bradipsiquismo, “hálito hepático” (ou fetor hepaticus), asterixis
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(= flapping), incoordenação muscular e hipertonia, escrita irregular, reflexos tendinosos exacerbados ou alentecidos,
sinal de Babinski, crises convulsivas e postura de descerebração.
➢ Flapping → Deve-se solicitar ao paciente que estenda o braço para frente e faça a dorsoflexão da mão (mão
aberta e com os dedos bem separados). A pessoa normal mantém a posição estável, enquanto no paciente
com encefalopatia a mão cai repetidamente, em movimentos ritmados, devido a relaxamentos rápidos
(perda do tônus) seguidos de retomada da contração muscular. Se não for desencadeado espontaneamente,
o médico pode hiperestender o punho
do paciente, causando o chamado →
não é patognomônico da encefalopatia
hepática!
• A EH manifesta é classicamente
dividida em graus:
Hemorragia digestiva (plaquetopenia + coagulopatia + O sangue liberado no tubo digestivo é digerido pelas
presença das varizes esofagogástricas) bactérias colônicas → do metabolismo da hemoglobina
(proteína), forma-se mais amônia → prontamente
absorvida pelos enterócitos, desencadeando a EH.
Diagnóstico:
• Controle dos fatores precipitantes e na redução da produção e absorção de amônia pelo cólon.
• Sabemos que a amônia é produzida pelo metabolismo das bactérias colônicas, ao degradar os compostos
nitrogenados (ureia e proteínas) presentes no lúmen intestinal.
➔ Restrição Proteica: a restrição proteica na dieta não está indicada de rotina no tratamento da EH aguda.
Pacientes com EH estágio III ou IV devem ficar em dieta zero pelo menos nas primeiras 24-48h, e tão logo
comecem a se recuperar, a dieta deve ser reintroduzida.
➔ Corrigir a Constipação: a constipação aumenta a proliferação bacteriana no cólon. Para combatê-la, o laxante
mais utilizado é a lactulose oral
➔ Antibióticos: certos antibióticos orais podem ser administrados com o intuito de reduzir a flora bacteriana
colônica produtora de amônia. O mais tradicional é a neomicina. Outras opções são o metronidazol ou a
rifaximina (possui menores efeitos colaterais). Os antibióticos costumam ser reservados para os pacientes
intolerantes ou refratários à lactulose → o antibiótico NÃO deve substituir a lactulose: tais pacientes utilizam
lactulose + antibiótico para o controle da EH.
➔ Outros Tratamentos
✓ (L-Ornitina-L-Aspartato - LOLA): aumenta a depuração hepática e, em menor grau, muscular da amônia
✓ Probióticos: como o extrato de bactérias sacarolíticas não produtoras de urease, pode modificar a flora
colônica do paciente para uma flora menos produtora de amônia.
✓ Suplementação de zinco.
• Com exceção do fator VIII, que é produzido pelas células endoteliais hepáticas, todos os demais fatores
da coagulação são sintetizados pelos hepatócitos, como o fibrinogênio (fator I), a protrombina (fator II)
e os fatores V, VII, IX, X e XI.
Hipoalbuminemia
• A albumina é a proteína presente no plasma em maior concentração, sendo a principal responsável pela
pressão oncótica ou coloidosmótica do plasma. Esta é a pressão que “prende” o líquido no compartimento
intravascular.
• Na hipoalbuminemia, existe uma tendência à saída de líquido para o interstício, predispondo o paciente
ao edema.
• Cirrose hepática → maior potencial edemigênico → hipoalbuminemia + aumento da pressão hidrostática
capilar
• Nas hepatopatias agudas, a hipoalbuminemia não é um evento comum (pois a meia-vida da albumina é
relativamente longa – vinte dias em média – em comparação com a dos fatores de coagulação) →
presença de uma albumina plasmática < 3,0 g/dl sugere muito que, na realidade, o paciente tem um
quadro crônico ou então crônico “agudizado”.
• Albumina também é um importante marcador do estado nutricional do paciente → Os hepatopatas com
maior deficit nutricional são aqueles com menor albumina plasmática.
Coagulopatia
No paciente hepatopata → TP alargado (com atividade de protrombina baixa e INR alto) também pode ter outra
explicação, diferente da insuficiência hepatocelular: COLESTASE! → A colestase intra ou extra-hepática reduz a
secreção biliar e, portanto, há menos sais biliares chegando ao intestino para auxiliar na absorção das vitaminas
lipossolúveis (A, D, E, K) → A má absorção da vitamina K pode causar uma
coagulopatia pela redução na síntese dos fatores II, VII, IX e X, mais uma vez
predominando a depleção do fator VII → na colestase, o paciente está ictérico
(predomínio importante da bilirrubina direta), com colúria e hipocolia fecal; a
fosfatase alcalina e a gama-GT estão elevadas.
• Na cirrose hepática, o INR não possui correlação direta com o risco de sangramento → Isso é explicado
pela diminuição concomitante da fibrinólise endógena (mediada pelo plasminogênio, que também é
produzido no fígado). Assim, mesmo com INR alargado, podem ocorrer fenômenos tromboembólicos,
principalmente em pacientes hospitalizados por infecções agudas
ESTADIAMENTO DE CHILD-PUGH
além de ser muito utilizado para a decisão de algumas medidas terapêuticas, tal como o transplante
hepático
Manifestações hematológicas
Patogênese
• Os achados laboratoriais característicos são de uma anemia normocítica ou macrocítica, geralmente com o
índice de reticulócitos corrigido elevado.
• O esfregaço do sangue periférico pode mostrar uma série de alterações sugestivas:
✓ Macrócitos finos – hemácias com diâmetro aumentado, porém com volume corpuscular normal
✓ Hemácias em alvo – idênticas àquelas encontradas nas hemoglobinopatias e na esplenectomia – o
mecanismo de sua formação é o aumento da superfície da hemácia, devido ao acúmulo de lipídios na
membrana, em relação ao volume corpuscular;
✓ Acantócitos – a presença de múltiplas células como esta indica
hemólise grave
Hiperesplenismo
SÍNDROME HEPATORRENAL
• É uma forma de insuficiência renal funcional (isto é, não acompanhada de alterações histopatológicas
renais), que ocorre geralmente em indivíduos com hepatopatia crônica avançada, insuficiência hepática
grave e hipertensão portal.
• Vasodilatação esplâncnica → diminuição do volume circulante efetivo, com ativação dos sistemas renina-
angiotensina-aldosterona e noradrenérgico (simpático), cuja ação, por sua vez, ocorrerá
predominantemente nos rins, levando à vasoconstrição renal.
• Assim, a SHR reflete um desequilíbrio entre os fatores vasodilatadores e vasoconstritores, resultando no
aumento significativo da resistência vascular renal, diminuição da TFG e uma ávida retenção de sódio e
água (o sódio urinário desses pacientes geralmente é < 10 mEq/dia).
• A apresentação clinicolaboratorial depende do tipo de SHR (tipo 1 e tipo 2):
✓ Tipo 1 = caracterizado pela rápida progressão da insuficiência renal (< 2 semanas), havendo
aumento da creatinina sérica para além do dobro do valor inicial (>2,5 mg/dl), ou uma queda no
clearance de creatinina para < 50% do valor inicial (<20 ml/min) → O quadro clínico é compatível
com uma insuficiência renal aguda oligúrica. Prognóstico sem tratamento é extremamente ruim.
✓ Tipo 2 = a creatinina sérica é > 1,5 mg/dl e/ou o clearance de creatinina é < 40 ml/min, mas a
evolução é mais insidiosa e o prognóstico a curto prazo, mesmo sem tratamento, é melhor →
Na SHR tipo 2 os pacientes se apresentam com “ascite refratária” ao tratamento clínico.
• A SHR pode se desenvolver de forma espontânea ou ser precipitada por um evento agudo.
Fatores precipitantes:
• Sangramento gastrointestinal
• Infecção (especialmente PBE)
• Diurese intensa com rápida perda de peso
• Paracentese de grande volume sem reposição de albumina
Tratamento:
SÍNDROME HEPATOPULMONAR
O termo Síndrome Hepatopulmonar (SHP) se refere a uma tríade clínica composta por:
• A disfunção respiratória depende basicamente da presença das DVIP, que funcionam como shunt
arteriovenoso pulmonar → O sangue dessaturado “bypassa” alguns alvéolos ao prosseguir pelos vasos
GASTROENTEROLOGIA – P1 STELLA ABUJAMRA | TURMA XLI
dilatados, misturando-se ao restante do sangue que sai dos pulmões → A mistura do sangue dessaturado
(vindo das DVIP) com o sangue do restante do parênquima determina hipoxemia.
Fisopatogenia:
Manifestações clínicas:
• Dispneia, cianose de lábios e extremidades, baqueteamento digital, aranhas vasculares e platipneia (dispneia
que piora com a posição sentada ou em pé).
• A platipneia é um achado clássico → É acompanhada da ortodeoxia: hipoxemia desencadeada ou agravada
pela posição ortostática (ereta) que alivia na posição supina (paciente com platipneia que melhora em
decúbito dorsal) → Pode ser explicada pela localização preferencial das DVIP nas bases pulmonares.
• Ortodeoxia é definida como um decréscimo ≥ 10% na PaO2 quando se passa da posição supina para a
posição sentada ou em pé.
Tratamento:
• A maioria dos pacientes apresenta boa resposta, com melhora acentuada da hipoxemia, após a
administração de oxigênio.
• Até o momento, o transplante hepático constitui a única modalidade de tratamento eficaz na SHP,
embora a presença desta no pré-transplante aumente sobremaneira a morbimortalidade peroperatória.
HIPERTENSÃO PORTOPULMONAR
• Uma síndrome semelhante à hipertensão pulmonar primária, só que associada à hipertensão porta.
• Pelo acúmulo de substâncias endotélio-tóxicas não depuradas pelo fígado, as artérias pulmonares
periféricas sofrem remodelamento, com vasoconstrição, hiperplasia da média, espessamento da íntima
e formação de trombos in situ.
Quadro Clínico:
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• O quadro clínico é marcado por dispneia progressiva aos esforços e sinais de sobrecarga de VD no exame
clínico, além de hiperfonese do componente P2 da segunda bulha.
• Pode haver síncope e dor torácica.
• Radiografia de tórax: abaulamento do segundo arco da silhueta cardíaca esquerda (correspondente ao tronco
da artéria pulmonar) e um aumento da área cardíaca à custa de VD.
Diagnóstico:
• O diagnóstico começa pelo ecocardiograma, para mostrar a sobrecarga do VD e estimar a pressão sistólica da
artéria pulmonar (PAPsist);
• Depois passa para a cintilografia pulmonar V/Q (para afastar tromboembolismo pulmonar recorrente) e é
confirmado pelo cateterismo cardíaco direito, com mensuração direta da pressão sistólica da artéria pulmonar
(PAPsist), que deve estar superior a 25 mmHg.
Tratamento:
• Anticoagulação crônica com warfarin: objetivando manter o INR em torno de 1,5, isto é, faz-se uma
anticoagulação de “baixa intensidade”, devido ao risco aumentado de hemorragia em hepatopatas
crônicos → O warfarin visa reverter e prevenir a formação dos trombos in situ ou dos microêmbolos.
• Vasodilatador arterial pulmonar: epoprostenol (prostaciclina), ministrado em infusão contínua por uma
bomba implantada no subcutâneo.
• Transplante hepático: em casos selecionados (é preciso que a PAPsist atinja níveis inferiores a 35 mmHg
para que o procedimento possa ser realizado)
• Risco é sabidamente muito mais alto naqueles com ascite associada à cirrose hepática.
• A proteína total do líquido ascítico encontra-se caracteristicamente baixa na PBE, inferior a 1 g/dl.
• Conceitualmente, a PBE é a infecção da ascite que surge na ausência de uma fonte contígua de
contaminação, tal como abscessos intra-abdominais ou perfuração de víscera oca.
Fisopatogenia:
A Escherichia coli é o principal patógeno da PBE na cirrose hepática enquanto o pneumococo é o agente mais comum
da PBE na ascite nefrótica
Quadro Clínico:
Diagnóstico:
Bacterascite → cultura positiva monobacteriana na ausência do critério leucocitário. A bacterascite é uma fase
muito precoce na patogênese da PBE (representando a “chegada” da bactéria ao líquido ascítico) e, em 60% dos
casos, resolve espontaneamente, sem evoluir para a peritonite espontânea.
Tratamento
• Deve-se ressaltar que a chave para o sucesso terapêutico é o diagnóstico precoce → todo paciente cirrótico
admitido com ascite no hospital deve ser submetido a uma paracentese diagnóstica, independentemente da
presença de sintomas sugestivos de PBE como febre e dor abdominal.
• Antibioticoterapia: seja iniciada anteriormente ao resultado dos estudos microbiológicos do líquido ascítico
→ cefalosporina de terceira geração venosa: cefotaxime IV por 5 dias
• Se houve melhora sintomática dramática, a terapia está encerrada; se não, uma nova paracentese deve ser
realizada.
Profilaxia
Uma vez que a sobrevida média após o primeiro episódio de PBE é de cerca de nove meses, esta infecção deve
motivar a colocação do paciente em lista de espera para o transplante hepático.
CARCIONOMA HEPATOCELULAR
• Tumor maligno primário mais comum do fígado e a terceira causa de morte por neoplasia no mundo.
• Possui como causa principal a cirrose, particularmente quando secundária à hepatite crônica pelos vírus B ou
C.
Fatores de Risco
• Mais de 80% dos pacientes com CHC têm cirrose hepática. O risco de desenvolvimento de CHC varia de acordo
com a etiologia da cirrose
• É importante ressaltar que a idade de aquisição do VHB possui importante papel na oncogênese do CHC:
recém-nascidos e crianças mais jovens expostas ao VHB têm uma chance muito maior de desenvolver infecção
crônica do que aqueles infectados na idade adulta.
• Na hepatite B crônica, o DNA do vírus é incorporado ao genoma do hepatócito, propiciando mutações
oncogênicas → Na cirrose, há degeneração e regeneração hepatocitária (maior turnover celular), o que
aumenta a chance de mutações no DNA da célula, já comprometido pelo vírus B.
• O VHC, ao contrário do VHB, não é capaz de integrar-se ao DNA do hospedeiro. Assim, o mecanismo da
hepatocarcinogênese é provavelmente diferente entre os dois vírus.
• A infecção crônica pelo VHC parece ser tão hepatocarcinogênica quanto a infecção crônica pelo VHB.
• Entretanto, na hepatite C crônica o CHC só se desenvolve após o surgimento de cirrose hepática.
Álcool
Apresentação Clínica
TRANSPLANTE HEPÁTICO
• O paciente candidato ao transplante deve ter uma doença hepática avançada, progressiva e irreversível.
• Deve ter uma qualidade de vida bastante comprometida pela hepatopatia, com expectativa de vida inferior a
um ano.
Critérios de Seleção:
• O critério de seleção não é dado simplesmente pela ordem de chegada, mas sim pela gravidade da doença:
quanto menor a expectativa de sobrevida, mais rapidamente o indivíduo é alocado para receber o
transplante.
➔ Insuficiência hepática fulminante e em casos selecionados de hepatocarcinoma, o transplante tem que ser
realizado de imediato
• A indicação de transplante hepático deve ser decidida por uma junta multidisciplinar, em conjunto com o
paciente e sua família.
• Os riscos do procedimento e a necessidade de imunossupressão para o resto da vida são dados que devem
ser ponderados
➢ Bilirrubina
➢ INR
➢ Creatinina
• Os pacientes com diagnóstico de
hepatocarcinoma recebem inicialmente
20 pontos no MELD, com elevação progressiva com o passar do tempo.
• Valor numérico similar ao MELD, mas aplicado para crianças com menos de 12 anos
✓ Leva em conta o resultado laboratorial dos exames:
➢ Bilirrubina
➢ Albumina
➢ INR
PELD = 10 x [0,480 x Loge (bilirrubina) + 1,857 x Loge (INR) - 0,687 x Loge (albumina) + 0,436 se o paciente
tiver até 24 meses de vida + 0,667 se o paciente tiver déficit de crescimento < 2]
Indicações e Contraindicações
• Quanto à etiologia da hepatopatia, teoricamente qualquer causa de cirrose hepática pode ser incluída na lista
das indicações de transplante.
• De uma forma geral, os resultados são melhores na cirrose alcoólica, na colangite biliar primária e na cirrose
secundária à colangite esclerosante.